Reverência é adoração?

O cristão precisa compreender que os elementos externos do culto — cânticos, orações, celebrações — não geram, por si só, adoração verdadeira. O culto pode ser belo, animado e pleno de reverência, e ainda assim ser rejeitado, se não estiver fundado na obediência à Palavra.


Reverência é adoração?

“Então chegou ela, e adorou-o, dizendo: Senhor, socorre-me!” (Mateus 15:25).

A verdadeira adoração

A verdadeira adoração só pode emanar do coração daqueles que se rendem a Deus pela fé em Jesus Cristo. É nesse ato de submissão ao mandamento divino — “E o seu mandamento é este: que creiamos no nome de seu Filho Jesus Cristo…” (1 João 3:23) — ao reconhecer que Jesus é o Filho do Deus bendito, que a adoração se torna real e aceitável diante do Senhor.

Muitos expressam reverência com cânticos, orações, mãos erguidas, poesias, prostrações ou até mesmo pequenos gestos, como tirar o chapéu ao pronunciar o nome de Deus. Esses atos podem até demonstrar respeito, mas não têm valor diante de Deus se não fluírem de um coração regenerado pela fé.

O Senhor não se agrada de gestos exteriores que não brotam de um relacionamento vivo com Ele por meio de Cristo. Como está escrito: “E aquele que guarda os seus mandamentos, nele está, e ele, nele.” (1 João 3:24). Deus busca adoradores que O adorem em espírito e em verdade — e isso só se torna possível quando o homem crê nas palavras de Jesus tornando-se um com Ele e o Pai, pois, conforme Ele declarou:

“As palavras que eu vos tenho dito são espírito e são vida.” (João 6:63; 17:21-22).

Adorar a Deus não é apenas sobre formas externas, mas sobre ter um coração novo e um espírito renovado — algo que só Ele pode conceder, como prometido:

“Então aspergirei água pura sobre vós… e vos darei um coração novo, e porei dentro de vós um espírito novo.” (Ezequiel 36:25-27).

Ser um adorador, portanto, começa com uma simples, porém profunda obediência: crer. Essa é a obra que Deus requer — “Que creiais naquele que ele enviou.” (João 6:29). Ao crer, o homem se torna servo de Deus. E é a esses servos — os cansados e oprimidos que tomam o Seu jugo — que Jesus promete descanso para a alma (Mateus 11:28-29).

“Vinde a mim, todos os que estais cansados e oprimidos, e eu vos aliviarei. Tomai sobre vós o meu jugo, e aprendei de mim, que sou manso e humilde de coração; e encontrareis descanso para as vossas almas. Porque o meu jugo é suave e o meu fardo é leve.” (Mateus 11:28-28-30).

 

Humilhar-se é adorar

Humilhar-se a si mesmo — ou seja, fazer-se servo — é a essência da verdadeira adoração. É por isso que o apóstolo Pedro nos exorta:

“Humilhai-vos, pois, debaixo da potente mão de Deus, para que a seu tempo vos exalte.” (1 Pedro 5:6)

Cristo é o exemplo supremo de adoração. Ele se humilhou voluntariamente, obedecendo ao Pai em tudo, inclusive até a morte. A verdadeira humilhação, portanto, não se resume a palavras ou gestos, mas se manifesta em obediência. Por isso Jesus é chamado o Servo do Senhor:

“E, achado na forma de homem, humilhou-se a si mesmo, sendo obediente até à morte, e morte de cruz.” (Filipenses 2:8)

Enquanto o homem não se humilha em obediência à Palavra de Deus, permanece servindo a si mesmo. E ao servir a si mesmo, faz do próprio ventre o seu senhor — buscando apenas os próprios desejos, ou seja, guiado por sua avareza. É por isso que a Escritura declara:

“O seu deus é o ventre, e a sua glória é para confusão deles, que só pensam nas coisas terrenas.” (Filipenses 3:19)

“Nenhum servo pode servir dois senhores; porque, ou há de odiar um e amar o outro, ou se há de chegar a um e desprezar o outro. Não podeis servir a Deus e as riquezas.” (Lucas 16:13).

“E eles vêm a ti, como o povo costumava vir, e se assentam diante de ti, como meu povo, e ouvem as tuas palavras, mas não as põem por obra; pois lisonjeiam com a sua boca, mas o seu coração segue a sua avareza.” (Ezequiel 33:31).

Quem não se rende a Deus, inevitavelmente está a serviço de si mesmo — e esse caminho o afasta da verdadeira adoração e o conduz à escravidão dos próprios desejos.

Muitos podem ter zelo por Deus e até praticar gestos de reverência, mas sem obediência à justiça que vem por meio de Cristo, tudo isso se torna vão. O apóstolo Paulo disse isso claramente ao falar sobre Israel:

“Porque lhes dou testemunho de que têm zelo de Deus, mas não com entendimento. Porquanto, não conhecendo a justiça de Deus, e procurando estabelecer a sua própria justiça, não se sujeitaram à justiça de Deus.” (Romanos 10:2-3)

Adorar é obedecer. Adorar é se render. Adorar é se humilhar voluntariamente diante de Deus, reconhecendo que Cristo é o justo de Deus, o Senhor e Salvador. Toda adoração verdadeira começa onde termina altivez e a avareza: no coração quebrantado que se submete à vontade do Pai.

 

Temor reverencial

A palavra grega usada no Novo Testamento para “adorar” é προσκυνέω (proskuneó), que traz a ideia de curvar-se, beijar, prostrar-se — gestos que expressam homenagem e submissão. O Dicionário Strong sugere que o termo pode derivar de uma imagem de um cão que lambe a mão do dono: um gesto de dependência, reverência e afeto.

Mas Deus não se satisfaz apenas com gestos exteriores. Ele requer um coração obediente, que O honre e O tema como Pai e Senhor. Isso é o que Ele disse aos sacerdotes por meio do profeta Malaquias:

“O filho honra o pai, e o servo o seu senhor; se eu sou pai, onde está a minha honra? E, se eu sou senhor, onde está o meu temor? diz o SENHOR dos Exércitos a vós, ó sacerdotes, que desprezais o meu nome. E vós dizeis: Em que nós temos desprezado o teu nome?” (Malaquias 1:6).

Na parábola dos dois filhos (Mateus 21:28-32), Jesus revela que não é a aparência da obediência que honra o Pai, mas a prática dela. Um disse “não”, mas depois obedeceu; o outro disse “sim”, mas não foi. E é o primeiro quem faz a vontade do Pai. Assim também é com todos que, arrependendo-se por causa de Cristo, passam a obedecer a Deus de fato, mesmo que antes tenham vivido distantes d’Ele.

Jesus conclui a parábola dizendo que os publicanos e as meretrizes — pessoas antes rejeitadas e consideradas indignas — entram no Reino de Deus antes dos religiosos, justamente porque creram em Cristo, ou seja, obedeceram à justiça de Deus. A obediência é a evidência da fé em Cristo, e a fé que não se traduz em submissão à Palavra não é fé verdadeira.

Essa obediência está profundamente ligada ao que a Escritura chama de temor do Senhor. Mas afinal, o que significa esse temor? Muitos definem como um “medo reverente” diante da majestade de Deus, outros como “respeito santo” ou até como “temor da ira divina” e das consequências do pecado. No entanto, à luz da Escritura, o temor do Senhor está diretamente vinculado à Sua Palavra.

Por meio do paralelismo hebraico — um recurso poético que associa ideias entre linhas — entendemos que “temor”, “mandamentos” e “doutrina” são expressões intercambiáveis em função do contexto. Veja o que diz o salmista:

“O temor do SENHOR é o princípio da sabedoria; bom entendimento têm todos os que cumprem os seus mandamentos; o seu louvor permanece para sempre.” (Salmos 111:10).

Nesse Salmo temos um paralelismo sintético, de modo que “temor”, “mandamentos” e “louvor” se tornam termos intercambiáveis, visto que sabedoria está para bom entendimento assim como temor está para mandamentos.

Outro exemplo:

“O temor do SENHOR é limpo e permanece eternamente; os juízos do SENHOR são verdadeiros e justos juntamente.” (Salmos 19:9)

O que é limpo e permanece para sempre? Os juízos — isto é, as palavras — do Senhor, que no Salmo 111, verso 10 é louvor que igualmente permanece para sempre.

E ainda:

“Vinde, meninos, ouvi-me; eu vos ensinarei o temor do SENHOR.” (Salmos 34:11)

Aquilo que pode ser ensinado é a Palavra. Logo, ensinar o temor é ensinar os preceitos do Senhor.

Por isso, servir ao Senhor com temor é servir segundo a Sua Palavra:

“Servi ao SENHOR com temor, e alegrai-vos com tremor.” (Salmos 2:11)

E da mesma forma, só é possível adorá-Lo (inclinar) verdadeiramente por meio da obediência à Sua Palavra:

“Porém eu entrarei em tua casa pela grandeza da tua benignidade; e em teu temor me inclinarei para o teu santo templo.” (Salmos 5:7)

O servo que teme ao Senhor é aquele que ouve e crê, ou seja, obedece. Ele se inclina não apenas com o corpo, mas com o coração, a alma e o entendimento, que em essência é amar (Deuteronômio 6:5). Sua adoração decorre de tremer da palavra de Deus, ou seja, viver em submissão à vontade de Deus revelada nas Escrituras. Tremer é obedecer, e temor é o mandamento.

Por isso a ordem do apóstolo Paulo:

“De sorte que, meus amados, assim como sempre obedecestes, não só na minha presença, mas muito mais agora na minha ausência, assim também operai a vossa salvação com temor e tremor;” (Filipenses 2:12).

“Ouvi a palavra do SENHOR, os que tremeis da sua palavra.” (Isaías 66:5).

 

O servo e o temor do Senhor

O significado de “temor” nas Escrituras não é uniforme — ele depende do contexto. Em muitos trechos do Antigo Testamento, o temor do Senhor está diretamente relacionado à instrução divina, isto é, à obediência à Sua Palavra. Um exemplo claro disso está na fala de Moisés ao povo:

“E disse Moisés ao povo: Não temais; Deus veio para vos provar, e para que o seu temor esteja diante de vós, a fim de que não pequeis.” (Êxodo 20:20)

Note que, nesse versículo, o verbo “temer” está associado ao medo da manifestação divina, enquanto o substantivo “temor” refere-se à instrução de Deus dada para evitar o pecado. O medo da punição evidenciava que os filhos de Israel ainda não haviam sido aperfeiçoados no amor — pois quem ama, obedece. E quem obedece, vive em paz com seu Senhor.

Jesus confirmou essa verdade com simplicidade e profundidade:

“Aquele que tem os meus mandamentos e os guarda, esse é o que me ama.” (João 14:21)

Amar, portanto, não é sentimento religioso ou reverência estética: é submissão a Cristo como Senhor. É obedecer com o coração entregue. É por isso que Jesus declarou:

“Ninguém pode servir a dois senhores…” (Mateus 6:24)

Servir é amar — e amar é obedecer. E esse amor não tem relação com emoção, mas com uma escolha firme e deliberada de se submeter à vontade de Deus. O verdadeiro servo ama a vontade do Senhor e encontra nela segurança, não terror.

Por isso o apóstolo João nos ensina:

“No amor não há temor; antes, o perfeito amor lança fora o temor, porque o temor tem consigo a pena; e o que teme não é perfeito em amor.” (1 João 4:18)

O termo grego usado por João — φόβος (phobos) — não se refere ao mandamento, mas ao medo da punição. Esse tipo de medo habita o coração de quem ainda não se submeteu em obediência (amor). Ele teme não porque reverencia, mas porque não confia. E esse medo é a evidência de que ainda não houve entrega ao senhorio de Cristo.

Mas o Salmo nos chama a outro tipo de temor:

“Servi ao Senhor com temor, e alegrai-vos com tremor.” (Salmo 2:11).

Isso significa que servir se dá por meio da palavra (temor), e a alegria advém da obediência (tremor) à palavra.

Onde há amor verdadeiro, há entrega plena. E onde há entrega, há também sofrimento e benignidade. Não há lugar para soberba, leviandade ou inveja. O servo obediente manifesta, por meio de sua obediência, as características do amor descritas por Paulo:

“O amor não se porta com indecência, não busca os seus interesses, não se irrita, não suspeita mal. Não folga com a injustiça, mas folga com a verdade.” (1 Coríntios 13:5-6)

Esse amor não se alimenta de temor (medo), mas da verdade vivida em obediência. Onde há paz com Deus, o medo não tem lugar (Romanos 8:1).

 

Não é necessário reverência?

Muitos, ao falarem sobre reverência como elemento essencial da adoração, citam com admiração a diligência dos escribas ao copiarem as Escrituras. Diz a tradição que, ao se depararem com o nome de Deus, eles trocavam a pena, e, após escreverem o nome santo, quebravam a pena para que não fosse mais utilizada. Para muitos, esse tipo de atitude simboliza reverência profunda — e seria um exemplo a ser seguido.

Contudo, o que à primeira vista parece zelo reverente pode, diante de Deus, ser apenas vaidade religiosa. O profeta Jeremias, movido pelo Espírito, denunciou justamente esses escribas:

“Como, pois, dizeis: Nós somos sábios, e a lei do SENHOR está conosco? Eis que em vão tem trabalhado a falsa pena dos escribas.” (Jeremias 8:8)

Todo o esforço, dedicação e minúcia com o texto sagrado era vão, porque o coração dos copistas não estava rendido a Deus. Assim também foi com os fariseus — zelosos quanto ao templo, ao altar, aos túmulos dos profetas — mas reprovados por Deus. Sua religiosidade exterior não refletia submissão interior.

É possível dedicar tempo, talento, esforço e emoção às coisas de Deus — e, ainda assim, estar a serviço de si mesmo. Quando o culto parte de uma disposição autônoma do coração humano, e não de obediência à vontade de Deus, ele se transforma em um gesto vazio. Trata-se de devoção aparente, mas não de verdadeira adoração.

A repreensão do Senhor aos filhos de Israel é clara:

“Quando vindes para comparecer perante mim, quem requereu isto de vossas mãos, que viésseis a pisar os meus átrios?” (Isaias 1:12).

Eles compareciam ao templo, jejuavam, cantavam, faziam sacrifícios — mas não porque Deus os havia conduzido a isso em espírito e em verdade. Faziam porque decidiram fazer, segundo sua própria justiça. Jejuavam, sim, mas o jejum era escolha deles, não um mandamento de Deus:

“Dizendo: Por que jejuamos nós, e tu não atentas para isso? Por que afligimos as nossas almas, e tu não o sabes? Eis que no dia em que jejuais achais o vosso próprio contentamento, e requereis todo o vosso trabalho. Eis que para contendas e debates jejuais, e para ferirdes com punho iníquo; não jejueis como hoje, para fazer ouvir a vossa voz no alto.” (Isaias 58:3-4).

A lição é profunda e atual: Deus não requer aparência de reverência, mas obediência. Não basta parecer sagrado, é preciso ouvir e cumprir a Palavra do Senhor. A verdadeira reverência se expressa não em gestos simbólicos, mas em vida rendida à vontade de Deus.

Reverência sem obediência é apenas liturgia vazia. O Senhor não se impressiona com a forma — Ele pesa o coração. Só há adoração verdadeira onde há submissão verdadeira.

Muitos citam o texto de Eclesiastes 5:1 — “Guarda o teu pé quando entrares na casa do Senhor” — como uma exortação à reverência formal durante o culto. No entanto, o ensino bíblico vai além da etiqueta sagrada: trata-se de uma advertência à obediência. O versículo orienta o povo a não se aproximar de Deus com impulsos voluntaristas, votos precipitados ou sacrifícios oferecidos sem discernimento. A advertência é clara:

“… porque chegar-se para ouvir é melhor do que oferecer sacrifícios de tolos, pois não sabem que fazem mal.” (Eclesiastes 5:1).

“Guardar o pé” na casa do Senhor não é apenas um convite a comportar-se com reverência externa, mas uma exortação a dispor o coração para ouvir. Reverência, à luz das Escrituras, é estar aberto ao ensino divino e pronto a obedecer. Por isso, o texto nos alerta: ouvir é melhor que sacrificar. O verdadeiro culto começa com submissão, não com ofertas voluntaristas.

Essa verdade ecoa em todo o Antigo Testamento. O salmista expressa esse desejo sincero de se voltar inteiramente ao ensino de Deus:

“Uma coisa pedi ao SENHOR, e a buscarei: que possa morar na casa do SENHOR todos os dias da minha vida, para contemplar a formosura do SENHOR e aprender no seu templo.” (Salmo 27:4).

Contemplar a formosura do Senhor está inseparavelmente ligado a aprender no Seu templo. A adoração verdadeira nasce do coração que ouve e obedece — não do que deseja impressionar com oferendas.

Deus nunca se agradou de sacrifícios oferecidos como substituto da obediência. O próprio Senhor declarou, por meio dos profetas, que nunca foi o sacrifício em si o que Ele buscou:

“De que me serve a mim a multidão dos vossos sacrifícios? — diz o SENHOR. Já estou farto dos holocaustos de carneiros e da gordura de animais cevados.” (Isaías 1:11);

“Pois misericórdia quero, e não sacrifício; e o conhecimento de Deus, mais do que os holocaustos.” (Oséias 6:6);

“Porque nunca falei a vossos pais, no dia em que os tirei da terra do Egito, nem lhes ordenei coisa alguma acerca de holocaustos ou sacrifícios.” (Jeremias 7:22).

Sacrifícios sem submissão não passam de ruído. São “sacrifícios de tolos” — ritos vazios que não tocam o coração de Deus. Ele busca quem ouve o seu temor e obedece como servo. Esse é o culto que Lhe agrada.

Portanto, guardar o pé é mais do que entrar respeitosamente no templo: é entrar com o coração pronto para ouvir, aprender e obedecer. Reverência verdadeira é rendição ao ensino da Palavra. Porque obedecer, de fato, é melhor do que sacrificar.

Sob o pretexto de oferecer a Deus o “melhor”, muitos acabam adotando métodos e ritos que não foram ordenados pelo Senhor. Foi o que aconteceu com Saul. Ao preservar o melhor do despojo dos amalequitas — ovelhas, vacas e até o próprio rei Agague — ele parecia estar fazendo algo “nobre”: oferecer sacrifícios ao Senhor com o que havia de melhor. No entanto, suas ações revelavam idolatria disfarçada de humildade:

“Mas o povo tomou do despojo ovelhas e vacas, o melhor do interdito, para oferecer ao SENHOR teu Deus em Gilgal.” (1 Samuel 15:21).

O problema não era o que Saul oferecia, mas o fato de ele ter desobedecido à ordem divina. A tentativa de “santificar” sua própria vontade por meio do culto expôs o seu coração — não mais submisso a Deus, mas a si mesmo. Ele passou a usar o nome de Deus como justificativa para cumprir seus próprios planos. Foi então que veio a repreensão profética de Samuel:

“Tem porventura o SENHOR tanto prazer em holocaustos e sacrifícios, como em que se obedeça à palavra do SENHOR? Eis que o obedecer é melhor do que o sacrificar…” (1 Samuel 15:22).

“Quem mata um boi é como o que tira a vida a um homem; quem sacrifica um cordeiro é como o que degola um cão; quem oferece uma oblação é como o que oferece sangue de porco; quem queima incenso em memorial é como o que bendiz a um ídolo; também estes escolhem os seus próprios caminhos, e a sua alma se deleita nas suas abominações.” (Isaías 66:3).

A lição é direta: Deus não se agrada do que oferecemos a partir da nossa própria vontade, ainda que chamemos isso de “adoração”. Ele se agrada de corações que se submetem à Sua Palavra. O zelo religioso que não nasce da obediência é, na verdade, rebelião mascarada — e, como diz o texto, isso é comparável à feitiçaria e idolatria (v. 23).

Essa era a triste condição de Israel: dedicavam-se ao que consideravam sagrado, mas escolhiam os seus próprios caminhos. Tinham zelo pelas formas externas do culto, mas rejeitavam a vontade de Deus.

Hoje, o risco continua. Podemos gastar tempo, energia e recursos em nome da adoração, mas se isso não estiver fundamentado na obediência à Palavra, estamos pisando nos átrios do Senhor sem que Ele o tenha requerido (Isaías 1:12). A verdadeira reverência não está em fazer o nosso melhor para Deus, mas em fazer a vontade d’Ele com um coração obediente.

Quando Davi decidiu buscar a Arca da Aliança na casa de Obede-Edom, tudo parecia estar em perfeita ordem: havia júbilo, entusiasmo, louvores e uma variedade de instrumentos musicais. Era, aos olhos humanos, um culto vibrante e completo. A Escritura diz:

“E Davi e todo o Israel alegraram-se perante Deus com todas as suas forças; com cânticos, e com harpas, e com saltérios, e com tamborins, e com címbalos, e com trombetas.” (1 Crônicas 13:8)

Entretanto, apesar de toda essa devoção aparente, Deus não se agradou do que foi feito. Por quê? Porque não seguiram a ordenança do Senhor. Davi reconheceu isso mais tarde:

“Porquanto vós não a levastes na primeira vez, o SENHOR nosso Deus fez rotura em nós, porque não o buscamos segundo a ordenança.” (1 Crônicas 15:13)

Essa experiência ensinou a Davi — e deve ensinar a nós — que há duas formas de buscar a Deus:

  1. Segundo as próprias convicções,
  2. Segundo o que Deus ordenou.

E somente a segunda é aceita diante d’Ele.

O cristão precisa compreender que os elementos externos do culto — cânticos, orações, celebrações — não geram, por si só, adoração verdadeira. O culto pode ser belo, animado e reverente, e ainda assim ser rejeitado, se não estiver fundado na obediência à Palavra.

Na Nova Aliança, a vontade de Deus é clara: crer em Jesus Cristo como o Filho de Deus. Esse é o princípio da verdadeira adoração:

“A obra de Deus é esta: que creiais naquele que ele enviou.” (João 6:29)

A adoração não nasce da música, da liturgia ou do ambiente — ela brota da obediência de um coração rendido a Cristo. É aquele que O invoca com fé, santificando-O como Senhor no coração, que se torna adorador verdadeiro:

“Antes, santificai a Cristo, como Senhor, em vossos corações…” (1 Pedro 3:15).

Por causa de doutrinas que possuem aparência de evangelho, mas negam sua eficácia, muitos cristãos têm sido levados a uma forma de temor que não é o evangelho de Cristo, mas que em essência decorre de tradição humana. São ensinos que parecem evangelho, mas estão alicerçados em precitos como: “Não toques, não proves, não manuseies?” (Colossenses 2:21), que decorre de performance religiosa — e não na obra consumada de Cristo.

O apóstolo Pedro alerta os cristãos, citando o profeta Isaias, a rejeitarem o temor (mandamento) que os judeus temiam (obedeciam), pois adoravam a Deus em vão.

“Não chameis conjuração, a tudo quanto este povo chama conjuração; e não temais o que ele teme, nem tampouco vos assombreis.” (Isaias 8:12);

“Mas em vão me adoram, ensinando doutrinas que são preceitos de homens.” (Mateus 15:9).

“Porque o Senhor disse: Pois que este povo se aproxima de mim, e com a sua boca, e com os seus lábios me honra, mas o seu coração se afasta para longe de mim e o seu temor para comigo consiste só em mandamentos de homens, em que foi instruído;” (Isaías 29:13).

A adoração que Deus aceita é aquela que flui da fé em Cristo. É quando a palavra do evangelho é posta por obra que o coração se curva ao senhorio de Cristo, que o culto é agradável a Deus.

“Meus filhinhos, não amemos de palavra, nem de língua, mas por obra e em verdade.” (1 João 3:18).

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