Crítica

‘Quem é a fé’, e não ‘O que é a Fé’

Nas Escrituras fidelidade (Fé) produz confiança (fé), mas a confiança (crença) de alguém não produz fidelidade. A fé-confiança é sempre fruto da Fé-fidelidade, nunca o contrário.  Quando cremos na PALAVRA de Deus que não passa, mas que permanece para sempre (Fé-fidelidade), a fé-confiança que possuímos é fruto da Fé-fidelidade de Deus.


‘Quem é a fé’, e não ‘O que é a Fé’

“Edificados sobre o fundamento dos apóstolos e dos profetas, de que Jesus Cristo é a principal pedra da esquina” (Efésios 2:20);

O que é a fé

O Pr. Airton Evangelista da Costa assim respondeu a pergunta ‘O que é a fé’?:

“A fé não se explica através da lógica humana. Fé é crença, convicção, certeza, confiança, entrega. É a certeza de que algo vai acontecer, não importando se as condições sejam contrárias. A definição bíblica para a fé é a seguinte: ‘É a CERTEZA das coisas que se esperam, e a prova das coisas QUE NÃO SE VÊEM’ ( Hb 11:1 ). Fé é a crença de que o Senhor está no comando de todas as coisas, em quem depositamos total e irrestrita confiança”  Airton Evangelista da Costa, O Que é a Fé?, Artigo disponível no link: < http://www.estudosgospel.com.br/a-biblia-responde/soteriologia/o-que-e-a-fe.html> visitado em 0105/13.

Há equívocos na definição acima, tanto na argumentação do Pr. Airton quanto na tradução bíblica utilizada por ele.

Na Bíblia a fé não é definida como certeza, antes a fé é descrita como ‘firme fundamento’ “ORA, a fé é o FIRME FUNDAMENTO das coisas que se esperam, e a PROVA das coisas que se não veem” ( Hb 11:1 ). O ‘firme fundamento’ é objetivo e a ‘certeza’, por sua vez, é questão subjetiva, de foro íntimo e varia de pessoa para pessoa.

A certeza ou opinião varia de pessoa para pessoa, mas o fundamento de Deus não! O fundamento de Deus fica firme ( 2Tm 2:19 ), as opiniões e certezas não.

Qual é o fundamento de Deus? Cristo, Ele é a fé anunciada de antemão pelos apóstolos e profetas e se manifestou aos homens na plenitude dos tempos “Edificados sobre o fundamento dos apóstolos e dos profetas, de que Jesus Cristo é a principal pedra da esquina” ( Ef 2:20 ); “Porque ninguém pode pôr outro fundamento além do que já está posto, o qual é Jesus Cristo” ( 1Co 3:11 ).

Jesus Cristo é o fundamento de Deus, a rocha inabalável, firme. Enquanto a Bíblia aponta para o fundamento que é firme, o Pr. Airton aponta para uma crença, uma certeza. Ele deixa de olhar para o que é firme para olhar o que é transitório:

“É a certeza de que algo vai acontecer, não importando se as condições sejam contrárias” (Idem).

O firme fundamento

Quando o escritor aos Hebreus diz que a fé é o firme fundamento, ele está falando de Cristo, a pedra firme que os edificadores rejeitaram “Ele é a pedra que foi rejeitada por vós, os edificadores, a qual foi posta por cabeça de esquina” ( At 4:11 ); “Edificados sobre o fundamento dos apóstolos e dos profetas, de que Jesus Cristo é a principal pedra da esquina” ( Ef 2:20 ).

Na Bíblia, Cristo é a personificação da fé, ou seja, Ele é a fé que havia de se manifestar e foi manifesta na plenitude dos tempos “Mas, antes que a fé viesse, estávamos guardados debaixo da lei, e encerrados para aquela fé que se havia de manifestar” ( Gl 3:23 ). A FÉ que havia de se manifestar é Cristo, por meio da qual o justo vive “Eis que a sua alma está orgulhosa, não é reta nele; mas o justo pela sua fé viverá” ( Hc 2:4 ). Se o homem vive da palavra que sai da boa de Deus (Verbo), consequentemente a fé não é uma certeza, uma opinião ou um sentimento, isto porque certezas, opiniões e sentimentos são volúveis enquanto a palavra de Deus permanece para sempre e faz tudo o que lhe é aprazível “Assim será a minha palavra, que sair da minha boca; ela não voltará para mim vazia, antes fará o que me apraz, e prosperará naquilo para que a enviei” ( Is 55:11 ; 1Pe 1:25 ).

Da palavra de Deus temos o testemunho de que jamais mudará, mas com relação aos homens há a exortação para que creiam na palavra de Deus até o fim ( Mt 24:13 ).

Jesus disse: “No mundo tereis aflições, mas tende bom ânimo, eu venci o mundo” ( Jo 16:33 ), ao fazer referencia a Cristo, o evangelista João diz: “Porque todo o que é nascido de Deus vence o mundo; e esta é a vitória que vence o mundo, a nossa fé” ( 1Jo 5:4 ). Não é a certeza do homem que vence o mundo, antes quem venceu o mundo foi Cristo, e Ele é a nossa fé.

Cristo é a fé que habita no coração daqueles que creem ( 2Tm 1:5 ), pois Ele prometeu fazer morada nos crentes ( Jo 14:23 ).

A fé que não se explica através da lógica humana é a fé que consta nos dicionários. Por exemplo:

“Fé (do Latim fides, fidelidade e do Grego πίστη pistia1 ) é a firme opinião de que algo é verdade, sem qualquer tipo de prova ou critério objetivo de verificação, pela absoluta confiança que depositamos nesta ideia ou fonte de transmissão” Wikipédia.

Se alguém possui a opinião de que algo é verdade, os lexicógrafos definem que tal opinião ou crença é fé. Por exemplo: se alguém tiver a firme opinião de que um pedaço de madeira é pedra, a opinião, a crença de tal pessoa é tida por fé.

A verdade como fundamento

Mas, observando na Bíblia, verifica-se que, quando Deus ordenou ao povo de Israel que subisse e tomasse a terra prometida por herança, se houvessem obedecido, a crença (pisteuein) deles na palavra de Deus (verdadeira e firme= pistis) seria designada fé (pisteuein), porém, como o povo desobedeceu, isto demonstra que não tinham o que é proveniente do que é verdadeiro e firme (pistis): fé (confiança=pisteuein). Observe que em seguida os filhos de Israel se animaram em adentrar a terra e o que fizeram a seguir também não era fé, pois não estavam apoiados na palavra de Deus ( Nm 14:39 -45 ).

A opinião do povo estava formada: ‘Não podemos subir contra aquele povo porque é mais forte que nós’ ( Nm 13:31 ). Logo em seguida surgiu nova opinião: ‘Eis-nos aqui, e subiremos ao lugar que o SENHOR tem falado; porquanto havemos pecado’ ( Nm 14:40 ), mas em ambos os casos a opinião que possuíam não era fé.

Não é a covardia ou a coragem que determina se o homem tem fé ou não. O que promove a fé é a verdade da palavra de Deus, de modo que, quando o homem anda segundo o que lhe é ordenado, anda por fé. Aceitar ou não um desafio não é prova de fé, antes resignar-se a obedecer a palavra de Deus é fé “E, chegando-se a ele o tentador, disse: Se tu és o Filho de Deus, manda que estas pedras se tornem em pães. Ele, porém, respondendo, disse: Está escrito: Nem só de pão viverá o homem, mas de toda a palavra que sai da boca de Deus” ( Mt 4:3 -4).

Há uma grande confusão com relação ao termo ‘fé’ e o termo ‘crer’, visto que na língua grega o mesmo radical da palavra é utilizado como substantivo e verbo. Quando os tradutores foram traduzir o substantivo e o verbo ‘fé’ para a língua portuguesa, como o termo fé não é flexionável para ser utilizado como verbo, o termo foi substituído pelo verbo crer.

Em resumo, o substantivo latino fides (fé), correspondente ao termo grego pistis (fé=substantivo), não tem verbo e, assim, os tradutores viram-se obrigados a recorrer a um verbo latino de outro radical para exprimir o verbo grego pisteuein. Passaram a utilizar o verbo credere, que em português é crer.

No hebraico arcaico, o termo fé é ‘emunah’, palavra feminina com dois significados: fidelidade e adesão, e no hebraico moderno o termo passou a ser utilizado com vários significados, incluindo o verbo ‘crer’, que na língua hebraica é ‘boteach’ (creio) e ‘livtoach’ (acreditar).

Na língua grega o termo fé (Pistis [substantivo], Pisteuō, [verbo], Pistos [adjetivo]) deriva dos termos verdadeiro, fidedigno, fiel, de modo que a fé decorre do que é verdade, fiel, fidedigno. Não há fé no que é falso, na crendice, no conto de fada. Somente o que é verdadeiro produz fé, de modo que um tabelião só dá fé do que é verdadeiro.

Ora, a fé está vinculada à verdade, e a fidelidade ao que é fidedigno, de modo que a confiança deriva da verdade, do que é real, nunca o contrário. Jamais a confiança produz uma verdade ou altera a realidade.

A ‘lei da gravidade’ contém os elementos essenciais para que se possa compreender o sentido da fé. Se uma pessoa acredita (opinião firme) que se saltar de um penhasco uma força de atração o trará para o solo, temos a fé: confiança na verdade. Mas, se uma pessoa acredita que ao saltar do penhasco alçará voo, temos uma crença. Ainda que esta confiança ou opinião seja absoluta, não mudará a verdade de que uma força o atrairá para o solo.

A fé não decorre de uma firme opinião de que algo é verdade, antes a fé decorre da verdade. Sem a verdade não há fé. À parte do que é verdadeiro, firme, seguro, fidedigno, fiel, não há que se falar em fé.

Acreditar na fada do dente, ter a firme opinião de que a fada Sininho existe não é fé, é ilusão. Tal crendice, tal opinião, por mais intensa que seja, não torna a fantasia real. Agora, a verdade, por sua vez, é o que produz fé, confiança, mesmo quando não podemos ver.

As definições contidas nos dicionários apresentam diversos significados com relação ao termo fé porque a língua é dinâmica. Observe algumas frases construídas com o termo fé:

  • “Fazer fé”: acreditar em alguém ou em algum ato; ter esperança;
  • “Dar fé”: afirmar como verdade;
  • “Boa fé”: forma de agir honestamente, sem quebrar um compromisso;
  • “Má fé”: agir de forma intencional para prejudicar terceiros;
  • “Botar fé”: acreditar sem questionar;
  • “Fé cega”: o ato de acreditar sem questionar;
  • “A fé remove montanhas”: o impossível pode ser alcançado quando você acredita em Deus.

A ideia bíblica: ‘Creio porque é verdadeiro’ acabou sendo substituída pela asserção ‘creio porque é absurdo, improvável’, etc. pelo uso incorreto do termo fé (fides).  Tremendo equivoco!

Nas Escrituras fidelidade (Fé) produz confiança (fé), mas a confiança (crença) de alguém não produz fidelidade. A fé-confiança é sempre fruto da Fé-fidelidade, nunca o contrário.  Quando cremos na PALAVRA de Deus que não passa, mas que permanece para sempre (Fé-fidelidade), a fé-confiança que possuímos é fruto da Fé-fidelidade de Deus.

Qualquer que planta limão e se põe a espera de uma colheita de laranja é louco, desvairado, pois o fato de esperar, acreditar, firmar opinião, etc., jamais mudará o fato de que sementes de limão produzem limão, isto porque Deus disse: “Produza a terra erva verde, erva que dê semente, árvore frutífera que dê fruto segundo a sua espécie, cuja semente está nela sobre a terra; e assim foi” ( Gn 1:11 ).

Acreditar jamais mudará o que foi estabelecido por Deus: as árvores darão frutos segundo a sua espécie, ou seja, segundo a sua semente.

Agora, quando alguém acredita, tem certeza, a firme opinião de que ao plantar limão, colherá limão, a fé-confiança (pisteuein ) é fruto da Fé-fidelidade (pistis) que estabeleceu que a ‘árvore frutífera dê fruto segundo a sua espécie’.

A verdade de que uma semente produz frutos segundo a sua espécie é o que denominamos fé (verdade, fiel, fidedigno), pois apesar de não se ver as árvores e os seus frutos quando se está lançando a semente ao solo, a semente é prova suficiente daquilo que não se vê. O que espero tem por base um firme fundamento.

Quando Jesus anunciou ser o Filho de Deus, muitos não creram porque não criam nas Escrituras “Mas, se não credes nos seus escritos, como crereis nas minhas palavras?” ( Jo 5:47 ). Além do testemunho das Escrituras, as obras que Jesus realizava testificavam acerca d’Ele “Respondeu-lhes Jesus: Já vo-lo tenho dito, e não o credes. As obras que eu faço, em nome de meu Pai, essas testificam de mim” ( Jo 10:25 ).

Por que era necessário o testemunho das Escrituras e o testemunho das obras de Cristo? Porque a fé deriva do fundamento, da verdade, do que é firme, e não de uma crença, convicção, certeza, confiança, entrega.

Por que o crente crê em Deus? Por causa de milagres?  Não! O crente crê em Deus por causa de Cristo, visto que Deus o ressuscitou dentre os mortos. Deus o ressuscitou para que a confiança e esperança do crente estejam em Deus “E por ele credes em Deus, que o ressuscitou dentre os mortos, e lhe deu glória, para que a vossa fé e esperança estivessem em Deus” ( 1Pe 1:21 ).

O evento da ressurreição é tão importante para o crente que, os seus discípulos foram estabelecidos por testemunhas da ressurreição “E matastes o Príncipe da vida, ao qual Deus ressuscitou dentre os mortos, do que nós somos testemunhas ( At 3:15 ).

A concepção de que a fé não é afeta a lógica humana decorre de uma má leitura feita desde os patristicos, sendo atribuída a Tertuliano a frase ‘credo quia absurdum’ (creio porque é absurdo) em decorrência da frase: “E o Filho de Deus morreu, o que é crível justamente por ser inepto; e ressuscitou do sepulcro, o que é certo porque é impossível”, pois entendiam que a verdadeira fé tem de se opor a razão.

Se a fé não se explicasse através da lógica humana, ou se a fé fosse contrária à razão, seria sem sentido a orientação do apóstolo Pedro: “Antes, santificai ao SENHOR Deus em vossos corações; e estai sempre preparados para responder com mansidão e temor a qualquer que vos pedir a razão da esperança que há em vós” ( 1Pe 3:15 ). Ou ainda a exortação do apóstolo Paulo em Romanos 12.1 para apresentar a Deus sacrifício vivo, santo e agradável que é o culto racional.

Seria sem sentido Cristo ter aparecido aos seus discípulos com muitas e infalíveis provas “Aos quais também, depois de ter padecido, se apresentou vivo, com muitas e infalíveis provas, sendo visto por eles por espaço de quarenta dias, e falando das coisas concernentes ao reino de Deus” ( At 1:3 ).

A fé não é a ‘crença de que Deus está no comando de todas as coisas’, antes a fé é proveniente de Deus que é fiel, verdadeiro e poderoso para cumprir a sua palavra, portanto, digno de total e irrestrita confiança Palavra fiel é esta: que, se morrermos com ele, também com ele viveremos; Se sofrermos, também com ele reinaremos; se o negarmos, também ele nos negará; Se formos infiéis, ele permanece fiel; não pode negar-se a si mesmo” ( 2Tm 2:11 -13).

Quando o homem crê que pode salvar-se através das suas boas ações, sacrifícios, orações, votos, etc., não é fé, antes fé é quando o homem crê que Cristo é o enviado de Deus que tira o pecado do mundo.

Cristo é a fé manifesta, o firme fundamento estabelecido por Deus. Por intermédio de Cristo é que cremos em Deus que ressuscita os mortos. Sem Cristo é impossível agradar a Deus, pois Ele é o autor e o consumador da fé ( Hb 11:6 ; Hb 12:2 ; 1Pe 2:5 ).

Claudio Crispim

É articulista do Portal Estudo Bíblico (https://estudobiblico.org), com mais de 360 artigos publicados e distribuídos gratuitamente na web. Nasceu em Mato Grosso do Sul, Nova Andradina, Brasil, em 1973. Aos 2 anos de idade sua família mudou-se para São Paulo, onde vive até hoje. O pai, ‘in memória’, exerceu o oficio de motorista coletivo e, a mãe, é comerciante, sendo ambos evangélicos. Cursou o Bacharelado em Ciências Policiais de Segurança e Ordem Pública na Academia de Policia Militar do Barro Branco, se formando em 2003, e, atualmente, exerce é Capitão da Policia Militar do Estado de São Paulo. Casado com a Sra. Jussara, e pai de dois filhos: Larissa e Vinícius.

2 thoughts on “‘Quem é a fé’, e não ‘O que é a Fé’

  • Maravilhoso estudo
    Aprendi muito sobre fé
    Nunca tive uma explicação tão Clara!
    Minha fé ( Jesus)
    Minhas crenças vou levar meu casaco,talvez esfrie pelo tempo fechado*

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  • Bênção de Deus
    Nunca aprendi tanto sobre fé

    Resposta

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