A disparidade comportamental existente no seio da comunidade cristã primitiva decorrente das múltiplas questões de ordem sociocultural pertinentes à época levou o apóstolo dos gentios a apontar um norte destacando os princípios gerais a serem seguidos por todos cristãos, quer sejam judeus, gentios, servos, livres, bárbaros, gregos, etc.
Tristeza para arrependimento – 2 Coríntios 7
Conteúdo do artigo
“Porque a tristeza, segundo Deus, opera arrependimento para a salvação, da qual ninguém se arrepende, mas, a tristeza do mundo opera a morte.” (2 Coríntios 7:10).
Introdução
‘Abatidos’, ‘oprimidos’, ‘quebrantados’, ‘perturbados’, ‘cansados’, ‘tristes’, ‘aflitos’, ‘necessitados’, ‘pobres’, e outros, são termos utilizados para fazer referência aos homens que reconhecem a impossibilidade de se salvarem. A impossibilidade decorre da condição de sujeição ao pecado herdada da ofensa de Adão, e que, portanto, necessita da misericórdia de Deus revelada em Cristo Jesus.
“Perto está o SENHOR dos que têm o coração quebrantado, e salva os contritos de espírito” (Salmos 34:18).
Os termos elencados foram utilizados pelos profetas para fazer referência as pessoas que, após ouvirem a mensagem de Deus, mudam o entendimento e se sujeitam a Deus em obediência. Às vezes os termos são utilizados como figura, ou para compor uma parábolas, ou para construir enigmas, ou para fazer correlações em provérbios, etc., visto que, em função do contexto, esses termos são ressignificados.
Para analisarmos o capítulo 7, da 2ª epístola do apóstolo Paulo aos Corintos, é imprescindível considerar o significado de determinadas palavras em função do contexto, bem como se faz necessário considerar algumas peculiaridades relacionadas a escrita de uma carta.
Em uma carta, tanto os remetentes, quanto os destinatários, normalmente possuem um conhecimento que é comum a ambos, sendo que, o conhecimento prévio que compartilham, acaba por determinar o estilo de escrita e a linguagem empregada.
Uma carta surge da necessidade de comunicação entre pessoas que se conhecem ou, que, no mínimo, possuem afinidade acerca de um tema comum a ambos, portanto, a linguagem empregada por quem escreve a carta terá uma peculiaridade específica em função dos destinatários.
A linguagem empregada por quem escreve se reveste de nuances que vai além dos signos linguísticos pertinentes à gramática. Uma carta possui uma carga de impressões e/ou emoções pessoais e, geralmente, a lembrança de questões específica realça a troca de informações entre destinatário e remetentes, e muitas vezes, essas nuances foge a compreensão de um terceiro.
A composição de uma carta é completamente diferente da composição de um livro, quer seja de literatura ou didático. Um livro se propõe expor um conhecimento visando alcançar um público alvo abrangente sem afinidade, diferentemente do proposto por uma carta, que tem um público alvo específico, com interesse comum e que influencia a linguagem utilizada.
O conhecimento prévio que o apóstolo Paulo e seus destinatários possuíam acerca da matéria abordada, que é o evangelho de Cristo, possuem nuances que, um terceiro (tradutor, interprete ou leitor), se não ficar atento, acabará não fazendo uma boa leitura do texto. Embora nas suas argumentações o apóstolo Paulo tenha utilizado vários recursos pertinentes à retórica, certas nuances só será notada pelo leitor se tiver um conhecimento prévio de questões específicas do Antigo Testamento, bem como, das demais epístolas paulinas.
Purificação e santificação
1 ORA, amados, pois que temos tais promessas, purifiquemo-nos de toda a imundícia da carne e do espírito, aperfeiçoando a santificação no temor de Deus.
Após fazer alusão às promessas de Deus exaradas no Antigo Testamento (2 Samuel 7:14): “E eu serei para vós Pai e vós sereis para mim filhos e filhas, diz o Senhor Todo-Poderoso” (2 Coríntios 6:18), o apóstolo Paulo reiterou aos cristãos de Corintos a necessidade de se purificarem de toda a imundícia, da carne e do espírito, e o próprio apóstolo não se excluiu dessa necessidade ao utilizar o pronome na terceira pessoa do plural.
Da declaração do apóstolo surgem as perguntas: Quais são as imundícies da “carne” e do “espírito”? É possível ao homem purificar a si mesmo?
Para evidenciar a salvação em Cristo (promessa), citando a promessa de Deus exarada pelos profetas, o apóstolo Paulo alertou os cristãos para não se prenderem a “um jugo desigual com os infiéis” (2 Coríntios 6:14). Que jugo seria esse? O jugo do judaísmo!
Se os cristãos já tomaram sobre si o jugo de Cristo para alcançarem a promessa, durante a jornada neste mundo, jamais deveriam se associar aos seguidores do judaísmo ou flertar com a doutrina deles.
O apóstolo Paulo fez uso de vários adjetivos utilizados pelos profetas quando se referiam ao povo de Israel: infiéis, injustos, trevas, Belial, idólatras, etc., de modo a contrastar com a condição do cristãos como “templo de Deus”, vez que os filhos de Israel estavam ligados pelo desvio dos pais ao “templo dos ídolos”.
“Não vos prendais a um jugo desigual com os infiéis; porque, que sociedade tem a justiça com a injustiça? E que comunhão tem a luz com as trevas? E que concórdia há entre Cristo e Belial? Ou que parte tem o fiel com o infiel? E que consenso tem o templo de Deus com os ídolos” (2 Coríntios 6:14-16);
“De sorte que as línguas são um sinal, não para os fiéis, mas para os infiéis; e a profecia não é sinal para os infiéis, mas para os fiéis.” (1 Coríntios 14:22);
“Contudo tentaram e provocaram o Deus Altíssimo, e não guardaram os seus testemunhos. Mas retiraram-se para trás, e portaram-se infielmente como seus pais; viraram-se como um arco enganoso. Pois o provocaram à ira com os seus altos, e moveram o seu zelo com as suas imagens de escultura.” (Salmos 78:56-58);
“Ainda que a minha casa não seja tal para com Deus, contudo estabeleceu comigo uma aliança eterna, que em tudo será bem ordenado e guardado, pois toda a minha salvação e todo o meu prazer está nele, apesar de que ainda não o faz brotar. Porém os filhos de Belial todos serão como os espinhos que se lançam fora, porque não podem ser tocados com a mão.” (2 Samuel 23:5,6).
Qualquer que está de posse da promessa em Cristo, tem que se purificar de toda impureza (profanação) decorrente da carne e do espírito! O que seria profanação da ‘carne’?
Os ensinamentos dos religiosos judeus que consistiam tão somente em mandamentos de homens. O termo “carne” no contexto é utilizado para fazer referência aos elementos essenciais à doutrina judaizante: lei, circuncisão, descendência de Abraão, etc. Os cristão não deviam deixar somente a circuncisão, antes deveria deixar tudo o que era pertinente à carne, assim como fez o apóstolo Paulo:
“Pois que muitos se gloriam segundo a carne, eu também me gloriarei. (…) São hebreus? também eu. São israelitas? também eu. São descendência de Abraão? também eu.” (2 Coríntios 11:18 e 22);
“Porque a circuncisão somos nós, que servimos a Deus em espírito, e nos gloriamos em Jesus Cristo, e não confiamos na carne. Ainda que também podia confiar na carne; se algum outro cuida que pode confiar na carne, ainda mais eu: Circuncidado ao oitavo dia, da linhagem de Israel, da tribo de Benjamim, hebreu de hebreus; segundo a lei, fui fariseu; Segundo o zelo, perseguidor da igreja, segundo a justiça que há na lei, irrepreensível.” (Filipenses 3:3-6).
Nos profetas estava estabelecido que aquele que fizesse da “carne o seu braço” seria maldito, vez que, confiar em si mesmo é apartar-se de Deus.
“Assim diz o Senhor: Maldito o homem que confia no homem, e faz da carne o seu braço, e aparta o seu coração do Senhor!” (Jeremias 17:5).
Quem continua confiando ou se gloriando em elementos segundo a carne (doutrina judaica) é impuro (profano). Daí a necessidade de se purificar de toda imundície da carne!
O que seria imundícia (profanação) do ‘espírito’? O termo ‘espírito’ no contexto não remente ao elemento imaterial do homem proveniente de Deus, e sim, ao entendimento.
Purificar-se da imundície do espírito é se renovar no ‘espírito da vossa mente’ (compreensão).
“Que, quanto ao trato passado, vos despojeis do velho homem, que se corrompe pelas concupiscências do engano; E vos renoveis no espírito da vossa mente;” (Efésios 4:22-23).
O apóstolo interpela os cristãos com relação a duas coisas: a) abandonar a doutrina judaica (Colossenses 2:22), e; b) renovar o entendimento (Romanos 12:2).
Vale destacar que os cristãos já eram puros, pois Cristo disse:
“Vós já estais limpos, pela palavra que vos tenho falado.” (João 15:3).
Um exemplo se verifica no apóstolo Pedro, que apesar de estar limpo pela palavra de Cristo, ainda precisava se purificar da imundície do espírito. Ao dissimular e deixar de comer e se afastar dos cristãos convertidos dentre os gentios quando chegou os cristãos convertidos dentre os judeus, o apóstolo Pedro ainda precisava se renovar no espírito da sua mente, ou seja, se transformar pela renovação do entendimento (Gálatas 2:12-14). Ou, quando recebeu a visão de um vaso como lençol atado pelas quatro pontas descendo dos céus cheio de animais imundos que os judeus não comiam (Atos 10:10-13).
É possível aperfeiçoar a santificação?
Jesus evidenciou que a santificação ocorre por intermédio da palavra de Deus: “Santifica-os na tua verdade; a tua palavra é a verdade” (João 17:17), de modo que, pela crença em Cristo, o homem é separado para uso exclusivo de Deus.
“Para lhes abrires os olhos, e das trevas os converteres à luz, e do poder de Satanás a Deus; a fim de que recebam a remissão de pecados, e herança entre os que são santificados pela fé em mim.“ (Atos 26:18).
Todos os cristãos, pela fé em Cristo, são remidos do pecado, ou seja, morrem para o pecado ao se tornarem participantes da morte de Cristo. Além de ser resgatado do pecado, Cristo confere herança aos que são justificado do pecado (Romanos 6:7), pelo fato de crerem que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus. Ao crer, o crente morre com Cristo para ser justificado do pecado, e ao ressurgir uma nova criatura, é justificado (declarado justo), pois foi gerado de novo em verdadeira justiça e santidade (Efésios 4:24).
Da mesma forma que o novo nascimento e a justificação é obra exclusiva de Deus, assim também é a santificação, como se lê:
“Então aspergirei água pura sobre vós, e ficareis purificados; de todas as vossas imundícias e de todos os vossos ídolos vos purificarei. E dar-vos-ei um coração novo, e porei dentro de vós um espírito novo; e tirarei da vossa carne o coração de pedra, e vos darei um coração de carne. E porei dentro de vós o meu Espírito, e farei que andeis nos meus estatutos, e guardeis os meus juízos, e os observeis” (Ezequiel 36:25-27).
É Deus quem promete e se encarrega de criar, justificar e santificar o homem, pois somente Ele pode dar um novo coração e um novo espírito (Salmo 51:10). Quando se tem uma ordem para o homem se santificar, certo é que o homem deve refugiar-se em Deus, que o santifica:
“Lançai de vós todas as vossas transgressões com que transgredistes, e fazei-vos um coração novo e um espírito novo; pois, por que razão morreríeis, ó casa de Israel?” (Ezequiel 18:31 e 11:19).
Deus dá a ordem: “Perfeito serás, como o SENHOR teu Deus.” (Deuteronômio 18:13), ou: “Circuncidai, pois, o prepúcio do vosso coração, e não mais endureçais a vossa cerviz.” (Deuteronômio 10:16), coisas impossíveis ao homem, certo é que o homem tem que esperar em Deus, pois para Deus tudo é possível!
“E o SENHOR teu Deus circuncidará o teu coração, e o coração de tua descendência, para amares ao SENHOR teu Deus com todo o coração, e com toda a tua alma, para que vivas.” (Deuteronômio 30:6).
Da mesma forma que foi Deus quem resgatou os filhos de Israel do Egito para sua propriedade peculiar dentre todos os povos, e por isso eles eram ‘santos’, qualquer que crê em Cristo é santificado.
“Porque eu sou o SENHOR, que vos fiz subir da terra do Egito, para que eu seja vosso Deus, e para que sejais santos; porque eu sou santo.” (Levítico 11:45).
O que é perfeito não comporta aperfeiçoamento, principalmente a santificação, que é a condição da nova criatura criada por Deus. O que o apóstolo Paulo pretendia, ao dizer para os cristãos ‘aperfeiçoarem’ a santificação no temor de Deus?
O termo grego ἐπιτελέω traduzido por ‘aperfeiçoar’ é melhor traduzido por ‘completar’. O termo remete a ideia de sujeição, alguém que completa ou realiza algo.
A ordem completai (realizai, aperfeiçoai) a santificação no temor de Deus é o mesmo que enfatizar que, agora, os cristão eram servos de Deus e que o fruto deles é para a santificação. Ao se purificar de ‘toda a imundícia da carne e do espírito’, o cristão está completando a santificação no temor de Deus. O que seria o ‘temor do Senhor’? A sua palavra, ou em última instância, Cristo!
“Porque, quando éreis servos do pecado, estáveis livres da justiça. E que fruto tínheis então das coisas de que agora vos envergonhais? Porque o fim delas é a morte. Mas agora, libertados do pecado, e feitos servos de Deus, tendes o vosso fruto para santificação, e por fim a vida eterna.” (Romanos 6:20-22).
Para os que estão em Cristo Jesus, todas as coisas são puras, diferentemente para os judaizantes, que por terem o entendimento e a consciência contaminados, nada era puro.
“Todas as coisas são puras para os puros, mas nada é puro para os contaminados e infiéis; antes o seu entendimento e consciência estão contaminados.” (Tito 1:15).
Vale destacar que, após o evento do novo nascimento, há um único elemento no indivíduo que não é renovado na nova criatura que demanda sua volição para mudar: a mente. Daí, advém as determinações: transformai-vos pela renovação do vosso entendimento.
Crer em Cristo concede salvação da condenação pertinente à transgressão de Adão, pois o poder para salvação decorre do evangelho de Cristo. No entanto, após o novo nascimento, muitas questões conceituais e comportamentais perduram com o cristão, e se faz necessário uma renovação na mente dos que foram gerados de novo.
“E vos renoveis no espírito da vossa mente.” (Efésios 4:23; Romanos 12:2).
É neste contexto que cabe ao homem regenerado purificar-se a si mesmo. Esta mesma recomendação foi passada a Timóteo pelo apóstolo Paulo, e o modo como foi redigido o alerta dá elementos suficientes para uma interpretação mais segura:
“Assim, pois, se alguém a si mesmo se purificar destes erros, será utensílio para honra, santificado e útil ao seu possuidor, estando preparado para toda boa obra.” (2 Timóteo 2:21).
Enquanto Deus santifica ao purificar o homem do pecado (hamartia) de Adão, de onde adveio a condenação de toda a humanidade, a determinação do apóstolo Paulo refere-se a erros a que todos os cristãos estão sujeitos.
“Porque todos tropeçamos em muitas coisas. Se alguém não tropeça em palavra, o tal é perfeito, e poderoso para também refrear todo o corpo.” (Tiago 3:2).
É objetivo de todos cristãos se portarem honestamente em tudo, embora sejam passíveis de muitos erros conceituais e comportamentais.
“Orai por nós, porque confiamos que temos boa consciência, como aqueles que em tudo querem portar-se honestamente.” (Hebreus 13:18).
Portar-se honestamente é um elemento humano e não visa alcançar salvação, pois a salvação é providencia de Deus por meio do evangelho. A honestidade dos cristãos tem em vista os não crentes, para que não haja qualquer entrave ao anuncio da mensagem do evangelho.
“Para que andeis honestamente para com os que estão de fora, e não necessiteis de coisa alguma.” (1 Tessalonicenses 4:12 ).
Geralmente, quando se lê a recomendação para os cristão se ‘purificar da imundície da carne e do espírito’, é comum muitos leitores abstraírem que há tipos distintos de imundície e, que estas se subdividem em imundícies pertinentes à carne, e outras, ao espírito, mas não é assim. Há traduções que verte o termo ‘carne’, por corpo, e assim, comprometem ainda mais o entendimento.
‘Corpo’ e ‘espírito’ são entes distintos na essência, porém, ambos são utilizados pelo apóstolo Paulo para fazer referência a completude humana que o torna indivíduo.
“Porque fostes comprados por bom preço; glorificai, pois, a Deus no vosso corpo, e no vosso espírito, os quais pertencem a Deus.” (1 Coríntios 6:20).
O cristão, como indivíduo, deve se purificar de toda imundície, pois foi chamado à santificação.
“Porque não nos chamou Deus para a imundícia, mas para a santificação (…) Porque também já assim o fazeis para com todos os irmãos que estão por toda a Macedônia. Exortamos-vos, porém, a que ainda nisto aumenteis cada vez mais. E procureis viver quietos, e tratar dos vossos próprios negócios, e trabalhar com vossas próprias mãos, como já vo-lo temos mandado.” (1 Tessalonicenses 4:7 e 12).
Imundície na 1ª epístola aos de Tessalônica é tudo o que foge de um viver sossegado, pleno de moderação. Quem se intromete em questões alheias ou quem foge do trabalho, no contexto da 1ª carta aos tessalonicenses é tido como imundície. Percebe-se que, como a primeira epístola escrita pelo apóstolo foi aos cristãos de Tessalônica, as questões decorrentes dos judaizantes não são destacadas, pois os judeus se propunham a perseguir e tolher que se anunciasse o evangelho.
“Os quais também mataram o SENHOR Jesus e os seus próprios profetas, e nos têm perseguido; e não agradam a Deus, e são contrários a todos os homens, e nos impedem de pregar aos gentios as palavras da salvação, a fim de encherem sempre a medida de seus pecados; mas a ira de Deus caiu sobre eles até ao fim.” (1 Tessalonicenses 2:15-16).
A imundice, ou mancha, na epístola ao Tessalonicenses está relacionado a determinados comportamentos inconvenientes em sociedade, o que é distinto da imundície decorrente da sujeição ao pecado, que é a própria existência do homem separado de Deus por ter sido gerado segundo a carne de Adão. A salvação do pecado é obra de Deus que, através de Cristo, concede ao homem um novo coração e um novo espírito, ou seja, resultando do novo nascimento, e a imundície diz de comportamento reprovável, inconveniente, no seio da comunidade cristã.
Já na carta aos Coríntios, o apóstolo Paulo não trata de questões inconvenientes, e sim, de algo mais específico: a imundície da carne e do espírito. A ação dos judaizantes já havia evoluído de perseguição e proibição de anuncio do evangelho, pois eles se introduziram em meios aos cristãos negando a eficácia da obra de Cristo. Enquanto a carta aos Tessalonicenses tem um tom saudosista, a 2ª carta aos Coríntios visa corrigir algumas questões decorrentes da primeira, e alertando contra aqueles que astuciosamente falsificavam a palavra de Deus (2 Coríntios 4:2).
A salvação do pecado torna o homem membro do corpo de Cristo, por meio do evangelho, que é dom de Deus, ou seja, a salvação não se dá por questões morais ou comportamentais. Concomitantemente com o advento da igreja (corpo de Cristo), surgiram muitas comunidades cristãs, formada por um misto de povos de todas as nações e línguas, cujo comportamento difere de indivíduo para indivíduo, o que demanda por parte dos seus integrantes o recomendado pelo apóstolo Pedro:
“Mas o homem encoberto no coração; no incorruptível traje de um espírito manso e quieto, que é precioso diante de Deus.” (1 Pedro 3:4).
Nesse sentido, pontuou o apóstolo Paulo:
“E NÓS, cooperando também com ele, vos exortamos a que não recebais a graça de Deus em vão (Porque diz: Ouvi-te em tempo aceitável E socorri-te no dia da salvação; Eis aqui agora o tempo aceitável, eis aqui agora o dia da salvação). Não dando nós escândalo em coisa alguma, para que o nosso ministério não seja censurado; Antes, como ministros de Deus, tornando-nos recomendáveis em tudo; na muita paciência, nas aflições, nas necessidades, nas angústias,” (2 Coríntios 6:1-4).
Como entender esse cenário de apelo aos cristãos para viverem sossegados, tratarem dos próprios interesses, não dar escândalo algum, ter um espírito manso e quieto? Os judaizantes estavam cooptando os cristãos para a causa deles, a pretexto de estabelecerem o reino, precisavam de adeptos para se insurgirem contra o Império Romano.
“Porque muitos há, dos quais muitas vezes vos disse, e agora também digo, chorando, que são inimigos da cruz de Cristo, cujo fim é a perdição; cujo Deus é o ventre, e cuja glória é para confusão deles, que só pensam nas coisas terrenas. Mas a nossa cidade está nos céus, de onde também esperamos o Salvador, o Senhor Jesus Cristo,” (Filipenses 3:18-20).
Não se pode confundir a aludida ‘carne’ e o ‘espírito’ do verso 1, do capítulo 7, com a ‘carne’ que é despojada através da circuncisão de Cristo e sepultada no batismo com Cristo. A carne despojada através da circuncisão de Cristo diz da natureza pecaminosa herdada de Adão (natureza de filho da ira, filho da desobediência) e, a ‘carne’ que trata este capítulo, refere-se ao comportamento reprovável de homens sob domínio do pecado a pretexto de uma lei, mas que seguiam mandamentos de homens.
“Entre os quais todos nós também antes andávamos nos desejos da nossa carne, fazendo a vontade da carne e dos pensamentos; e éramos por natureza filhos da ira, como os outros também.” (Efésios 2:3);
“No qual também estais circuncidados com a circuncisão não feita por mão no despojo do corpo dos pecados da carne, a circuncisão de Cristo; Sepultados com ele no batismo, nele também ressuscitastes pela fé no poder de Deus, que o ressuscitou dentre os mortos.” (Colossenses 2:10-11).
“A vontade do pensamento” de Efésios 2, verso 3 refere-se ao ‘espírito’ de 2 Coríntios 7, verso 1, ou seja, em ambos os versos, o sentido de ‘espírito’ e ‘pensamento’ remetem apenas à psique do homem, e este elemento humano demanda controle por parte do homem.
“… e sobre ti será o seu desejo, mas sobre ele deves dominar.” (Gênesis 4:7).
Observe que o apóstolo Paulo não se apresenta como um legalista impondo ou delineando regras comportamentais, pois tudo é abordado como recomendação e exortação, como inicialmente foi acordado no primeiro concílio em Jerusalém.
“Na verdade pareceu bem ao Espírito Santo e a nós, não vos impor mais encargo algum, senão estas coisas necessárias: Que vos abstenhais das coisas sacrificadas aos ídolos, e do sangue, e da carne sufocada, e da prostituição, das quais coisas bem fazeis se vos guardardes. Bem vos vá.” (Atos 15:28 -29).
Em todas as cartas paulinas não é imposto leis, regras ou normas, pois o apóstolo tinha em vista a necessidade de deixar claro que o evangelho de Cristo não se constituía e nem possuía elementos normatizadores, legalistas, ritualistas ou prescritivos de comportamento humano, seja em questões legais, éticas ou morais.
“ROGO-VOS, pois, eu, o preso do Senhor, que andeis como é digno da vocação com que fostes chamados.” (Efésios 4:1).
A despeito da disparidade comportamental existente no seio da comunidade cristã primitiva em decorrência das múltiplas questões de ordem sociocultural pertinentes à época, o apóstolo simplesmente apontava um norte, delineando alguns princípios a serem seguidos por todos, que sejam judeus, gentios, servos, livres, bárbaros, gregos, etc.
Ao escrever a Tito o apóstolo Paulo apresenta algumas questões comportamentais, e enfatiza que tais ações são um ‘ornamento da doutrina de Deus’, diferentemente da abordagem feita aos cristãos de corintos, que o ‘aperfeiçoamento’ da santificação possui correlação direta com a doutrina do evangelho. Tito 2, verso 10 possui relação direta com 2 Coríntios 6, verso 3.
“Não defraudando, antes mostrando toda a boa lealdade, para que em tudo sejam ornamento da doutrina de Deus, nosso Salvador.” (Tito 2:10).
Como a ‘palavra de Deus’ é o mesmo que ‘o temor do Senhor’ , e a santificação decorre da palavra de Deus, segue-se que o que o apóstolo recomenda é um comportamento que sirva de ornamento ao temor (doutrina, palavra) do Senhor (João 17:17; Salmo 34:11; Salmo 19:9).
“Confirma a tua palavra ao teu servo, que é dedicado ao teu temor.” (Salmo 119:38).
Entranhável afeto
2 Recebei-nos em vossos corações; a ninguém agravamos, a ninguém corrompemos, de ninguém buscamos o nosso proveito. 3 Não digo isto para vossa condenação; pois já antes tinha dito que estais em nossos corações para juntamente morrer e viver. 4 Grande é a ousadia da minha fala para convosco, e grande a minha jactância a respeito de vós; estou cheio de consolação; transbordo de gozo em todas as nossas tribulações.
Os versos 14 à 18, do capítulo 6, de 2 Coríntios, e o verso 1 do capítulo 7, de 2 Coríntios, é um grande parêntese na carta para exortar os cristãos a não voltarem às questões defendidas pelos judaizantes.
O versículo 2, retoma uma questão que estava tolhendo a relação de confiança que havia entre o apóstolo e os cristãos de corintos.
“Ó coríntios, a nossa boca está aberta para vós, o nosso coração está dilatado. Não estais estreitados em nós; mas estais estreitados nos vossos próprios afetos. Ora, em recompensa disto, (falo como a filhos) dilatai-vos também vós.” ( 2 Corintos 6:11- 13).
Como os cristãos de corintos estavam estreitados em seus próprios afetos, e não o apóstolo, Paulo roga para que abrissem espaço, figurativamente, que deixassem o coração aberto para receber o apóstolo e Timóteo.
Como a ‘boca fala do que o coração está cheio’, o apóstolo Paulo enfatiza que tanto a boca dele, quanto a de Timóteo estavam abertas para os cristãos, pois o coração de ambos possuíam espaço (dilatados) para acolhe-los.
E por que os cristãos de corintos deveriam recebê-los? Pelos seguintes motivos: eles não ofenderam ninguém, não corromperam ninguém e, muito menos, buscavam proveito próprio (2 Coríntios 12:14).
Quando esclarece que o que estava sendo dito não era para censurá-los, o apóstolo deixa claro que o pedido para serem recebidos era somente para evidenciar o quanto os amava, vez que os exortava como se exorta os filhos.
“Porque em muita tribulação e angústia do coração vos escrevi, com muitas lágrimas, não para que vos entristecêsseis, mas para que conhecêsseis o amor que abundantemente vos tenho.” (II Coríntios 2:4).
O apóstolo lembra que, antes dos eventos que trouxeram certa divisão, já havia dito que os cristãos estavam nos corações de Paulo e Timóteo tanto para morrerem, quanto para viverem.
O apóstolo dos gentios procura faze-los compreender que, por ser pai deles, por tê-los gerado em Cristo, na qualidade de pai acabava sendo ousado ao se dirigir àquela comunidade cristã.
“Porque ainda que tivésseis dez mil aios em Cristo, não teríeis, contudo, muitos pais; porque eu pelo evangelho vos gerei em Jesus Cristo.” (1 Coríntios 4:15).
Quando fazia qualquer alusão acerca dos cristãos de Corintos, o apóstolo Paulo fazia com ousadia e, não tinha receio de se gabar, ou de se gloriar deles. A consolação do apóstolo decorria do fato de os cristãos de corintos suportarem as mesmas aflições que ele.
“Mas, se somos atribulados, é para vossa consolação e salvação; ou, se somos consolados, para vossa consolação e salvação é, a qual se opera suportando com paciência as mesmas aflições que nós também padecemos; E a nossa esperança acerca de vós é firme, sabendo que, como sois participantes das aflições, assim o sereis também da consolação.” (2 Coríntios 1:6 -7).
O apóstolo tinha grande alegria pelo fato de dividirem as mesmas tribulações, visto que esta era uma prova de que estavam firmes no evangelho.
“Ao qual resisti firmes na fé, sabendo que as mesmas aflições se cumprem entre os vossos irmãos no mundo.” (1 Pedro 5:9).
Deus consola os abatidos
5 Porque, mesmo quando chegamos à Macedônia, a nossa carne não teve repouso algum; antes em tudo fomos atribulados: por fora combates, temores por dentro. 6 Mas Deus, que consola os abatidos, nos consolou com a vinda de Tito. 7 E não somente com a sua vinda, mas também pela consolação com que foi consolado por vós, contando-nos as vossas saudades, o vosso choro, o vosso zelo por mim, de maneira que muito me regozijei.
Embora a Macedônia parecesse representar um local de descanso, o apóstolo Paulo e os que com ele estavam não puderam descansar. Além de não conseguirem descansar o corpo, se viram atribulados, pois por fora estava empenhados em combater o bom combate em defesa do evangelho, mas por dentro, o sentimento de receio e temores com o paradeiro de Tito os consumia, vez que não encontraram Tito em Trôade.
“Ora, quando cheguei a Trôade para pregar o evangelho de Cristo, e abrindo-se-me uma porta no SENHOR, não tive descanso no meu espírito, porque não achei ali meu irmão Tito; mas, despedindo-me deles, parti para a Macedônia” (2 Coríntios 2:12-13 ; 1 Tessalonicenses 2:2).
Esta é a frase mais importante deste capítulo: “Mas Deus, que consola os abatidos (tristes)…”, pois nela está o supedâneo necessário para interpretação dos versículos restante do capítulo 7.
Sabemos que Deus consola os abatidos, mas quem são os ‘abatidos’? São os ‘pobres de espírito’ e os ‘tristes’ que Jesus fez alusão no Sermão do Monte (Mateus 5:3 -4). O profeta Isaías também fez alusão aos tristes e abatidos:
“A apregoar o ano aceitável do SENHOR e o dia da vingança do nosso Deus; a consolar todos os tristes.” (Isaías 61:2 );
“A ordenar acerca dos tristes de Sião que se lhes dê glória em vez de cinza, óleo de gozo em vez de tristeza, vestes de louvor em vez de espírito angustiado; a fim de que se chamem árvores de justiça, plantações do SENHOR, para que ele seja glorificado.” (Isaías 61:3).
Com base nos versículos em destaques, conclui-se que consolar os tristes, os que choram, ou os abatidos é ação exclusiva de Deus através da pessoa de Cristo.
“Porque assim diz o Alto e o Sublime, que habita na eternidade, e cujo nome é Santo: Num alto e santo lugar habito; como também com o contrito e abatido de espírito, para vivificar o espírito dos abatidos, e para vivificar o coração dos contritos.” (Isaías 57:15).
‘Abatidos’, ‘oprimidos’, ‘quebrantados’, ‘perturbados’, ‘cansados’, ‘tristes’, ‘aflitos’, ‘necessitados’, ‘pobres’, e outros, são termos utilizados para fazer referência aos homens que reconhecem a impossibilidade de se salvarem, e que confiam que somente Deus é capaz de salvá-los.
“Perto está o SENHOR dos que têm o coração quebrantado, e salva os contritos de espírito.” (Salmos 34:18).
Somente Deus sara os abatidos de espírito e, os abatidos são aqueles que se refugiam em Deus, que, por sua vez, serão consolados, instruídos, etc.
“Sara os quebrantados de coração, e lhes ata as suas feridas.” (Salmos 147:3);
“E os errados de espírito virão a ter entendimento, e os murmuradores aprenderão doutrina.” (Isaías 29:24).
Neste verso o apóstolo Paulo enfatiza que Deus consola os abatidos, ou seja, evidenciando que a salvação é obra exclusiva de Deus. Deus consola a todos que creem que Jesus é o Cristo com salvação, pois essa é a promessa que Ele fez: vida eterna (1 João 2:25).
Embora o consolo prometido não seja reaver amigos neste mundo, o apóstolo Paulo atribui a Deus a alegria proporcionada com a chegada de Tito, que pelo desencontro em Trôade deixou todos contristados.
E não somente isto, o apóstolo também considerou um alento da parte de Deus receber a notícia de que os irmãos sentiam saudades, o quanto prantearam e o zelo que nutriam para com o apóstolo Paulo, o que foi motivo de regozijo.
O alento com a vinda de Tito e a alegria decorrente do apreço demonstrado pelos irmãos de corintos é totalmente diferente do consolo decorrente da salvação, visto que, este é concernente à salvação em Cristo, e aquele, diz das relações interpessoais. Qualquer que crê em Cristo terá o consolo da salvação, mas isso não significa que é certa a consolação de rever amigos ou a solução de problemas deste mundo.
Contristados para arrependimento
8 Porquanto, ainda que vos contristei com a minha carta, não me arrependo, embora já me tivesse arrependido por ver que aquela carta vos contristou, ainda que por pouco tempo. 9 Agora folgo, não porque fostes contristados, mas porque fostes contristados para arrependimento; pois fostes contristados segundo Deus; de maneira que por nós não padecestes dano em coisa alguma.
Sem entrar nas questões especulativas sobre a existência de uma carta paulina extraviada e que não chegou em nossas mãos, ou sobre o tema que levou os cristãos de corintos a ficarem tristes, certo é que apóstolo Paulo enfatiza que, com sua carta, havia entristecido os cristãos.
Quando o apóstolo Paulo soube que os cristãos de Corintos ficaram tristes com o conteúdo de uma carta que havia enviado, e por pouco tempo, o apóstolo se arrependeu de ter escrito aquela carta, mas, ao verificar que a carta produziu nos cristãos uma mudança de concepção (arrependimento), mudou de postura com relação a carta.
Apesar de ter deixado os cristãos entristecidos (contristados) por causa do conteúdo da carta, e ter se arrependido de tê-la enviado ao saber que contristou os seus filhos na fé, naquele momento (agora), o apóstolo demonstra estar regozijado (folgo), pois todos eles foram contristados de modo que mudaram de concepção (metanóia) acerca da matéria abordada.
A palavra grega ‘metanoeo’ empregada pelo apóstolo Paulo e por outros apóstolos, significa ‘mudança de mente’, ‘mudança de concepção’, ‘mudança de ideia acerca de uma matéria’, o que difere da concepção que foi utilizada ao longo dos séculos, que inicialmente foi adotada na ‘vulgata latina’ por ‘penitencia’ e, até mesmo, difere do que se abstrai da palavra arrependimento em nossos dias, que muitos entendem como ‘abandono do pecado’, ‘tristeza em vista dos erros de conduta’, ‘remorso’, ou, simplesmente, ‘mudança de comportamento’.
O apóstolo Paulo deixa claro que não havia ficado contente ao saber que os cristãos se entristeceram (metanoeo), mas que o seu contentamento se dera em função da mudança de pensamento que ocorreu (v. 9).
Se tristeza fosse elemento essencial ao arrependimento segundo Deus, certo é que, em momento algum o apóstolo teria demonstrado arrependimento pelo fato de tê-los contristados.
“Porque, se eu vos entristeço, quem é que me alegrará, senão aquele que por mim foi contristado?” (2 Coríntios 2:2).
A alegria do apóstolo não era em decorrência dos cristãos ficarem tristes, antes porque foram contristados e se arrependeram. Pelo fato de terem mudado de concepção, o apóstolo enfatiza:
“… pois fostes contristados segundo Deus; de maneira que por nós não padecestes dano em coisa alguma” (v. 9).
Este verso deve ser analisado com base no verso 6: “Mas Deus, que consola os abatidos…” (v. 6).
A tristeza ou a contrição aqui não é algo visível aos olhos dos homens, pois mesmo o apóstolo Paulo, diante da tristeza dos cristãos, não soube, inicialmente, discernir se a tristeza era segundo Deus ou segundo o mundo, que opera morte, como se observa no verso 10.
Ser contristado segundo Deus ocorre quando se tem contato efetivo com a Sua palavra.
“Foi-me bom ter sido afligido, para que aprendesse os teus estatutos.” (Salmos 119:71 e 81-82).
A contrição, ou a tristeza, diz da conscientização que o homem adquire da real condição que está em vista do contato com o que foi anunciado por Deus, o que cria uma crise que redunda em mudança de entendimento.
Ser contristado segundo Deus é garantia de que o homem será consolado por Ele, pois é Ele que consola os abatidos e rejeita os altivos.
“Isto é a minha consolação na minha aflição, porque a tua palavra me vivificou.” (Salmos 119:50).
A tristeza segundo Deus está intimamente ligada à salvação, sendo que a consolação de Deus é a salvação.
Ora, se ocorreu uma mudança de pensamento após a carta que os contristou, certo é que os cristãos de corintos foram contristados segundo Deus, pois é Ele quem corrige a quem recebe por filho.
“Porque o Senhor corrige o que ama, E açoita a qualquer que recebe por filho (…) para sermos participantes da sua santidade. E, na verdade, toda a correção, ao presente, não parece ser de gozo, senão de tristeza, mas depois produz um fruto pacífico de justiça nos exercitados por ela.” (Hebreus 12:6-11).
Com este argumento, o apóstolo Paulo demonstra que os cristãos não haviam sofrido nenhum agravo por parte dele, antes foram devidamente instruídos segundo Deus por intermédio daquela carta, o que promoveu a mudança de pensamento.
A ‘tristeza segundo Deus’ não é promovida por decepção, desilusão, necessidades materiais, desgosto, à vista de erros cotidianos, etc., ou seja, não deriva de um sentimento intrínseco ao homem decorrente de seus erros. O arrependimento segundo Deus possui conexão direta com a sujeição a palavra de Deus, que é o afligir da alma, e não do corpo (Isaías 58:5), o jejum verdadeiro estipulado por Deus.
10 Porque a tristeza segundo Deus opera arrependimento para a salvação, da qual ninguém se arrepende; mas a tristeza do mundo opera a morte. 11 Porque, quanto cuidado não produziu isto mesmo em vós que, segundo Deus, fostes contristados! Que apologia, que indignação, que temor, que saudades, que zelo, que vingança! Em tudo mostrastes estar puros neste negócio.
Se os cristãos foram entristecidos por causa da carta enviada pelo apostolo Paulo, como não sofreram agravo? A resposta está no verso 10.
Qual é a tristeza segundo Deus que opera a mudança de concepção (metanoeo) para a salvação? É a tristeza evidenciada no verso 6: “Mas Deus, que consola os ‘abatidos’…” (v. 6).
A ‘tristeza’ segundo Deus promove a mudança de concepção (arrependimento) e produz salvação. É uma referência específica acerca dos abatidos de espíritos, dos tristes, dos contritos, etc., que em várias passagens bíblicas, como nos Salmos, Profetas e na Lei, pois Deus só salva os contritos e abatidos de espírito.
“Perto está o SENHOR dos que têm o coração quebrantado, e salva os contritos de espírito.” (Salmos 34:18).
Qualquer um que seja ‘altivo’, ‘farto’, ‘abastado’, ‘rico’, ou seja, que segue seu coração enganoso, pois se estriba na carne, não será salvo por Deus.
“Assim diz o SENHOR: Maldito o homem que confia no homem, e faz da carne o seu braço, e aparta o seu coração do SENHOR!” (Jeremias 17:9).
A ‘tristeza’ provocada pela carta do apóstolo Paulo operou uma mudança de concepção (arrependimento) nos cristãos, mas tal arrependimento não tinha em vista a salvação da condenação eterna.
Eles foram contristados e se arrependeram de algo que não estava diretamente atrelado à salvação, mas que poderia comprometê-los. O apóstolo esclarece no verso 10 que a tristeza segundo Deus opera uma mudança de concepção para que o homem possa ser salvo, mas que ninguém se arrepende da salvação decorrente da tristeza segundo Deus.
Enquanto a tristeza segundo Deus opera a salvação, a tristeza segundo o mundo opera a morte, pois tal tristeza diz de um sentimento promovido por ódio, inveja, contenda, porfia, etc.
O fato de os cristãos de corintos serem contristados em decorrência da carta paulina, segundo a contrição proveniente de Deus, tornou-os cuidadosos, diligentes e atenciosos. Além de despertar cuidado, se puseram em defesa, cheios de indignação, obedientes (temor), saudosos, zelosos e defensores da questão levantada, pois não eram culpados (estava puros na questão). A atitude deles demonstrou que, na questão abordada na carta, os cristãos de corintos não estavam envolvidos!
O zelo dos cristãos
12 Portanto, ainda que vos escrevi, não foi por causa do que fez o agravo, nem por causa do que sofreu o agravo, mas para que o vosso grande cuidado por nós fosse manifesto diante de Deus. 13 Por isso fomos consolados pela vossa consolação, e muito mais nos alegramos pela alegria de Tito, porque o seu espírito foi recreado por vós todos.
O apóstolo Paulo destaca que o objetivo da carta não era corrigir quem agiu injustamente ou que sofreu a injustiça, antes destacar o cuidado que dispensaram ao apóstolo e Timóteo.
O foco do apóstolo Paulo estava em evidenciar o cuidado que dispensaram a ele e a Timóteo, mas alguns ao lerem a epistola, se focaram em uma questão de somenos importância. Através da 2ª epístola, o apóstolo procura corrigir a distorção causada pela carta anterior, e que o que era importante é que foram consolados pela consolação que proporcionaram.
Em vista da apologia, indignação, temor, saudades, etc., o apóstolo se sentiu revigorado, consolado, sem falar na alegria de Tito, que além de contagiante, evidenciava o cuidado que os irmãos tiveram por Ele.
14 Porque, se nalguma coisa me gloriei de vós para com ele, não fiquei envergonhado; mas, como vos dissemos tudo com verdade, também a nossa glória para com Tito se achou verdadeira. 15 E o seu entranhável afeto para convosco é mais abundante, lembrando-se da obediência de vós todos, e de como o recebestes com temor e tremor. 16 Regozijo-me de em tudo poder confiar em vós.
O apóstolo Paulo enfatiza que havia anunciado a Tito coisas boas a respeito dos cristãos de corintos, e que eles, por sua vez, não o decepcionaram. De tudo que o apóstolo se gloriou acerca do cristãos de corintos, Tito confirmou que era verdade. E por isso, Tito foi enlaçado afetivamente por eles.
Tito destacou ao apóstolo Paulo, que os irmãos de corintos eram obedientes e que o receberam com temor e tremor (em obediência a palavra de Deus), o que promoveu alegria e a satisfação do apóstolo dos gentios por depositar confiança nos cristãos de corintos.