Em momento algum Cristo foi desamparado na cruz. O próprio Salmo 22, de forma profética, evidencia que Cristo não foi desprezado, e que Deus não virou o Seu rosto para longe d’Ele.
Cristo foi desamparado na Cruz?
Conteúdo do artigo
“E perto da hora nona exclamou Jesus em alta voz, dizendo: Eli, Eli, lamá sabactáni; isto é, Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste? E alguns dos que ali estavam, ouvindo isto, diziam: Este chama por Elias, e logo um deles, correndo, tomou uma esponja, e embebeu-a em vinagre, e, pondo-a numa cana, dava-lhe de beber. Os outros, porém, diziam: Deixa, vejamos se Elias vem livrá-lo. E Jesus, clamando outra vez com grande voz, rendeu o espírito” ( Mt 27:46 -50)
Introdução
O que diz as Escrituras?
A obra A Bíblia Explicada, de S. E. McNair, publicada pela CPAD, traz a seguinte observação:
“Jesus nunca afirmou ter sido desamparado pelo Pai, mas, ao ser ‘feito pecado’ por nós, sentiu-se abandonado por Deus” (McNair, S. E. A Bíblia Explicada. 4ª ed. Rio de Janeiro: CPAD, 1983, p. 331).
Com base em qual passagem bíblica McNair chegou a essa conclusão de que Jesus se sentiu abandonado por Deus? Os Salmos, os profetas ou os apóstolos falaram abertamente que Jesus se sentiu abandonado? Ou se trata de uma ilação?
Essa interpretação de “sentir-se abandonado” é uma ilação, um raciocínio construído a partir do brado que Jesus deu na cruz, mas não um dado explicitamente afirmado nos textos bíblicos.
O ministério de Jesus foi marcado principalmente pelo ensinamento acerca do reino de Deus. Desde a infância, Ele ensinava seus compatriotas com sabedoria e profundidade.
“Todos os que o ouviam admiravam-se da sua inteligência e respostas” (Lucas 2:47).
Quando Jesus se assentou no templo e leu o texto do Livro de Isaías que dizia: “O Espírito do Senhor está sobre mim, pelo que me ungiu para evangelizar aos pobres” (Lucas 4:18), Ele declarou com autoridade: “Hoje se cumpriu esta Escritura em vossos ouvidos” (Lucas 4:21).
Mesmo em seus últimos momentos, pregado à cruz, o padrão de ensino continuou. Ao clamar em hebraico: “Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste?”, Ele não estava reclamando ou afirmando que o Pai o havia abandonado.
Quando Jesus bradou: “Eli, Eli, lamá sabactâni”, Ele entregou aos seus ouvintes uma última lição, semelhante àquela que dera na sinagoga no início de seu ministério (Lucas 4:21). De que maneira?
Ao usar as palavras exatas do Salmo 22, Jesus estava mostrando que aquela Escritura também se cumpria diante dos que assistiam à crucificação, revelando mais uma vez que Ele era o cumprimento das promessas de Deus.
Perceba que, quando Jesus clamou “Eli, Eli, lamá sabactâni”, alguns dos presentes interpretaram erroneamente, achando que Ele estava chamando por Elias:
“E alguns dos que ali estavam, ouvindo isto, diziam: Ele chama por Elias” (Mateus 27:47).
Se Jesus estivesse reclamando que Deus o havia abandonado, Ele poderia ter clamado em latim ou grego, línguas mais amplamente compreendidas. No entanto, Ele escolheu proferir essas palavras em aramaico, o que gerou confusão entre o povo sobre o que realmente estava sendo dito.
Outros ainda diziam: “Deixa, vejamos se Elias vem salvá-lo” (Mateus 27:49). Pouco depois, Jesus bradou novamente e entregou o espírito (Mateus 27:50).
Observe a sequência dos brados. A penúltima frase de Jesus antes de entregar o espírito foi: “Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste?”. Logo em seguida, Ele proferiu a última frase:
“Pai, nas tuas mãos entrego o meu espírito.” (Lucas 23:46).
Há uma clara diferença entre o primeiro e o último brado. No primeiro, Jesus clama “Eli, Eli”, que significa “Deus meu” em aramaico. Já na última frase, Ele usa a linguagem comum de sua relação íntima com Deus, chamando-O de “Pai”.
O que isso nos ensina? O primeiro brado é claramente uma citação do Salmo 22, uma expressão profética que Jesus invoca para ensinar e revelar o cumprimento das Escrituras. Já o segundo brado reflete a confiança final do Filho ao entregar Seu espírito nas mãos do Pai, demonstrando a completa confiança na proteção do Pai no momento de Sua morte.
Citando as Escrituras
Ao observar o texto que narra Jesus lendo o profeta Isaías na sinagoga:
“E foi-lhe dado o livro do profeta Isaías; e, quando abriu o livro, achou o lugar em que estava escrito: ‘O Espírito do Senhor está sobre mim, pois que me ungiu para evangelizar os pobres. Enviou-me a curar os quebrantados de coração, a pregar liberdade aos cativos, e restauração da vista aos cegos, a pôr em liberdade os oprimidos, a anunciar o ano aceitável do Senhor.’ E, cerrando o livro, e tornando-o a dar ao ministro, assentou-se; e os olhos de todos na sinagoga estavam fitos nele. Então começou a dizer-lhes: ‘Hoje se cumpriu esta Escritura em vossos ouvidos'” (Lucas 4:17-21).
Quando Jesus citou esse texto de Isaías, Ele demonstrou que aquela profecia estava se cumprindo integralmente diante dos ouvidos do povo, revelando sua missão messiânica.
Da mesma maneira, ao bradar “Eli, Eli, lamá sabactâni”, Jesus estava claramente mostrando que o Salmo 22 se cumpria cabalmente ante os olhos dos que assistiam à crucificação.
Sabemos que eventos inusitados, cruéis ou chocantes marcam profundamente a memória humana. Então, Cristo perderia a última oportunidade de fixar na mente dos que estavam presentes mais uma Escritura que apontava diretamente para Ele? Certamente que não!
Uma breve citação das Escrituras seria suficiente para evocar na mente dos ouvintes todo o conteúdo daquele texto. Entre os judeus, a memorização das passagens bíblicas era comum, o que significa que as palavras de Jesus na cruz teriam imediatamente trazido à memória de muitos o contexto completo do Salmo 22, confirmando a identidade messiânica de Jesus no momento crucial de Sua morte.
A interpretação de McNair de que Jesus “sentiu-se abandonado” é uma ilação, um raciocínio construído a partir de uma leitura simplista do brado na cruz, mas não um dado explicitamente afirmado nos textos bíblicos.
Estarei com Ele na angustia
“Ele me invocará, e eu lhe responderei; estarei com ele na angústia; dela o retirarei, e o glorificarei.” (Salmo 91:15).
De maneira alguma Cristo foi abandonado pelo Pai! Deus jamais abandona Seus filhos, e muito menos o Seu Filho Amado.
Ao ler e estudar o Salmo 22, é imprescindível que o façamos sob uma perspectiva profética. Este salmo é claramente messiânico e descreve, com precisão, diversos eventos cruciais da vida do Messias entre os homens, especialmente durante Sua crucificação.
Nos versículos de 1 a 6, o salmista antevê a profunda angústia do Servo do Senhor, mas em nenhum momento afirma que Cristo seria abandonado por Deus. Pelo contrário, ele registra um clamor profético em meio à aflição, contrastando o tratamento que o Pai dispensou aos filhos de Israel com a forma como lidaria com Seu Filho.
Da mesma forma, ao bradar “Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste?”, Jesus não estava declarando que havia sido desamparado por Deus. Pelo contrário! Seu clamor não era uma afirmação de rompimento, mas a evocação de uma profecia que apontava para Sua missão e Seu sofrimento redentor.
- O salmista demonstra claramente que, ao longo da história, os pais (patriarcas, profetas, reis) clamaram a Deus, e Ele os livrou. Isso evidencia que todos os que confiaram em Deus receberam livramento. E o que ocorreu com Cristo? Será que Ele clamou e não foi ouvido? Observemos como Jesus clamou ao Pai: “E, indo um pouco mais para diante, prostrou-se sobre o seu rosto, orando e dizendo: Meu Pai, se é possível, passe de mim este cálice; todavia, não seja como eu quero, mas como tu queres” (Mateus 26:39). Cristo não foi “desamparado” em relação à sua pessoa, mas sim em relação ao pedido específico de que o cálice fosse afastado. Nos versículos 2 a 6 do Salmo 22, o salmista enfatiza o clamor, a confiança e o livramento por parte de Deus. O desamparo mencionado refere-se ao pedido, e não à pessoa de Cristo;
- Por que o pedido de Cristo não foi atendido, ou melhor, por que Ele clamou e não foi ouvido? Teria sido porque Deus o abandonou? De modo algum! Deus não atendeu ao pedido de Cristo porque a santidade de Deus é imutável. A santidade de Deus não podia ceder ao desejo de afastar o cálice, pois o plano redentor exigia o cumprimento de Sua vontade soberana, como evidenciado no Salmo 22:3: “Tu és santo”. O pedido de Cristo não foi atendido, não por abandono, mas porque a santidade de Deus exigia que a vontade divina prevalecesse;
- O Salmo 22 continua (versículos 4-6), destacando que os pais confiaram em Deus e foram atendidos em suas petições. Contudo, por causa da paixão da cruz, Cristo não foi atendido no seu pedido específico, pois prevaleceu a vontade de Deus. Enquanto os pais foram ouvidos, Cristo se humilhou até a condição de verme, sendo oprimido e desprezado pelos homens. Essa condição de “verme” não indica que Cristo foi abandonado, mas que Ele voluntariamente se submeteu à vontade do Pai em sua totalidade. Ele assumiu essa condição não por desamparo, mas porque Deus é santo e Sua vontade precisava ser cumprida, independentemente do sofrimento que isso implicava para o Filho.
Dessa forma, a humilhação de Cristo na cruz reflete Sua plena obediência à santidade de Deus, e não um abandono por parte do Pai.
“Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste? Por que te alongas do meu auxílio e das palavras do meu bramido? Deus meu, eu clamo de dia, e tu não me ouves; de noite, e não tenho sossego. Porém tu és Santo, tu que habitas entre os louvores de Israel. Em ti confiaram nossos pais; confiaram, e tu os livraste. A ti clamaram e escaparam; em ti confiaram, e não foram confundidos. Mas eu sou verme, e não homem, opróbrio dos homens e desprezado do povo” (Salmo 22:1 -6).
Nos versículos, vemos que os pais (os ancestrais de Israel) confiaram em Deus, clamaram em suas aflições, e não foram confundidos nem desamparados. Deus os ouviu e os livrou. O salmista destaca essa confiança e a resposta de Deus:
“Em ti confiaram nossos pais; confiaram, e tu os livraste. A ti clamaram e escaparam; em ti confiaram, e não foram confundidos” (Salmo 22:4-5).
Agora, contrastando essa narrativa com a situação de Cristo, o Filho clama na cruz: “Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste?” (Salmo 22:1; Mateus 27:46), mas aparentemente não há uma resposta de livramento imediato como ocorreu com os pais. No entanto, esse aparente “não atendimento” não é sinal de abandono, mas parte do cumprimento do plano redentor de Deus. Jesus, como o Messias, assumiu a condição de Servo sofredor, humilhando-se e aceitando o cálice da ira de Deus para salvar a humanidade.
O fato de Cristo não ser atendido em Seu pedido de afastar o cálice da cruz (Mateus 26:39) não indica desamparo divino, mas, sim, a necessidade do cumprimento da vontade soberana de Deus, que envolvia o sacrifício do Cordeiro de Deus pelos pecados do mundo. Enquanto os pais foram atendidos e livrados, o Filho, em Sua submissão plena à vontade do Pai, aceitou a não resposta ao Seu pedido para que o plano da salvação se realizasse.
Esse contraste entre os pais que clamaram e o Filho que não foi atendido revela o peso da missão redentora de Cristo, que, para trazer libertação a muitos, teve que suportar o sofrimento e a aparente ausência de resposta, cumprindo a profecia messiânica do Salmo 22.
Jesus não foi desprezado
Enquanto os pais clamaram e foram atendidos em suas súplicas, escapando de suas aflições, Cristo, o Filho de Deus, assumiu a condição de “verme” e “opróbrio dos homens” (Salmo 22:6). Em razão dessa humilhação imposta pela missão redentora, o pedido de Jesus com relação ao cálice que não foi atendido.
“Meu Pai, se é possível passa de mim este cálice…” (Mateus 26:39).
O pedido de Jesus em nenhum momento afrontou a vontade do Pai, pois Ele veio ao mundo justamente para cumprir essa vontade. No entanto, em Sua humanidade, expressou o desejo de, se possível, ser poupado da agonia da cruz (João 6:38). Mesmo assim, Ele submeteu-se completamente ao plano divino, dizendo: “Não seja como eu quero, mas como tu queres”.
Aos olhos dos algozes, Cristo parecia desamparado por Deus, mas na realidade, Ele estava cumprindo plenamente a vontade divina, para que a justiça de Deus fosse estabelecida. Embora, segundo a visão limitada dos homens, parecesse que Deus O havia abandonado, o que ocorria naquele momento era um sacrifício perfeito. Esse sacrifício, longe de representar desamparo, subiu como um cheiro suave e agradável às narinas de Deus, cumprindo o plano redentor.
“Confiou em Deus; livre-o agora, se o ama; porque disse: Sou Filho de Deus.” (Mateus 27:43);
“Não escondas de mim a tua face, não rejeites ao teu servo com ira; tu foste a minha ajuda, não me deixes nem me desampares, ó Deus da minha salvação. Porque, quando meu pai e minha mãe me desampararem, o SENHOR me recolherá.“ (Salmo 27:9 -10).
Deus não desamparou Jesus na cruz, visto que a oferta do corpo de Cristo não foi uma oferta pelo pecado como ocorria na Antiga Aliança. Pelo contrário, Cristo, como Servo do Senhor, em obediência total, apresentou-se como o Cordeiro imaculado diante de Deus. Isso demonstra que Deus não “virou o rosto” ou rejeitou Jesus, como muitas vezes é sugerido popularmente. Hebreus 9:14 reforça que Cristo se ofereceu “sem mácula a Deus”.
“Àquele que não conheceu pecado, o fez pecado por nós; para que nele fôssemos feitos justiça de Deus” (2 Coríntios 5:21).
“Pois não desprezou nem abominou a aflição do aflito; não escondeu dele o seu rosto, mas quando ele clamou, O ouviu” (Salmo 22:24).
Boa tarde!
Todos os comentários tem sido edificante. Tem me ajudado em muitos questionamentos, rogo ao Senhor que continue lhe usando!
Att. Geilson Moreira dos Santos
Explicação muito longa e confusa, poderia ser mais sucinto no assunto, a extensão do texto faz com que a pessoa que lê tenha que recorrer várias vezes a citações anteriores, tornando-se complexo o entendimento,