Enquanto a transgressão de Adão resultou na queda e na sujeição de todos ao pecado, a obediência de Cristo trouxe justificação e reconciliação com Deus. Assim, Adão e Cristo representam dois marcos opostos: o primeiro trouxe a condenação, e o segundo, a redenção por meio da graça de Deus.
Romanos 5 – Justificação e reconciliação
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“Mas não é assim o dom gratuito como a ofensa. Porque, se pela ofensa de um morreram muitos, muito mais a graça de Deus, e o dom pela graça, que é de um só homem, Jesus Cristo, abundou sobre muitos.” (Romanos 5:15).
Romanos 4 – Abraão não duvidou da promessa de Deus
A estrutura da epístola aos Romanos
Antes de avançarmos na análise versículo a versículo da Epístola, é essencial observarmos como Paulo estruturou a carta aos Romanos.
A introdução de Paulo sobre a justiça de Deus pela fé em Cristo aparece logo no capítulo 1, versos 16 e 17. A partir daí, o apóstolo expõe que todos os homens pecaram e foram destituídos da glória de Deus em Adão (Romanos 1:16 até 3:20). Ao mostrar que todos — judeus e gentios — tornaram-se culpáveis diante de Deus, ele retoma a ideia inicial da justificação pela fé. Observe:
- “Não me envergonho do evangelho, pois é poder de Deus para salvação de todo aquele que crê; primeiro do judeu, e também do grego. Pois nele se descobre a justiça de Deus de fé em fé.” (Romanos 1:16-17);
- “Mas agora se manifestou, sem a lei, a justiça de Deus, tendo o testemunho da lei e dos profetas. Isto é, a justiça de Deus pela fé em Jesus Cristo para todos [e sobre todos] os que creem. Não há distinção.” (Romanos 3:21-22).
Entre esses dois textos, Paulo apresenta elementos que mostram a culpa universal de todos os homens perante Deus.
A estrutura entre esses trechos destaca a justiça de Deus através do evangelho (fé dada aos santos), oferecida igualmente a judeus e gentios (Judas 1:3; Filipenses 1:27). No capítulo 1, versos 16 e 17, Paulo apresenta a justiça de Deus acessível a todos pela fé (crer) em Cristo, sem distinção. No capítulo 3, versos 21 e 22, ele reforça que essa justiça é conferida a todos os que creem, sem diferenciação entre judeus e gentios.
Na sequência, Paulo oferece uma argumentação fundamentada sobre a justificação pela fé (Romanos 3:23-27) e conclui:
“Concluímos, pois, que o homem é justificado pela fé, sem as obras da lei.” (Romanos 3:28).
No capítulo 4, ele apresenta exemplos de justificação pela fé nas Escrituras, recorrendo a Abraão (exemplo pessoal) e Davi (profeta) como autoridades do Antigo Testamento para apoiar sua argumentação (Romanos 4:1-25).
Chegamos, então, ao capítulo 5, onde Paulo retoma a linha argumentativa inicial sobre a justificação pela fé:
“Tendo sido, pois, justificados pela fé…” (Romanos 5:1).
Esse desenvolvimento revela o tema central de Paulo: a justificação pela fé em Cristo, oferecida sem distinção entre judeus e gentios. Nos quatro primeiros capítulos, Paulo discute essa justificação com ênfase nas diferenças culturais e religiosas. Já no capítulo 5, ele continua a tratar da justificação pela fé em Cristo, mas sem focar nas distinções que se fazia entre judeus e gentios, pois sua ênfase agora é a unidade em Cristo.
Nos primeiros quatro capítulos, Paulo demonstrou que todos pecaram; no quinto capítulo, ele retrocede para explicar onde e em quem todos pecaram (Romanos 5:12-21). Enquanto os capítulos anteriores se concentram na lei, na fé como evangelho e nas diferenças entre judeus e gentios, o capítulo 5 apresenta a condição dos que estão em Cristo (Romanos 5:1-5) e a condição da humanidade antes de conhecer Cristo por meio do evangelho (Romanos 5:6-10).
Assim, ao final do estudo do capítulo 5 de Romanos, o leitor compreenderá como todos os homens se tornaram pecadores e como podem participar da graça de Deus. Além disso, poderá reconhecer a condição dos que estão em Cristo e a dos que ainda permanecem na condição de inimigos de Deus.
Paz com Deus por meio do evangelho
1 TENDO sido, pois, justificados pela fé, temos paz com Deus, por nosso Senhor Jesus Cristo;
Não é correto basearmos a interpretação das cartas bíblicas apenas nas divisões em capítulos e versículos. Ao examinar o texto, devemos evitar limitar a análise seguindo como referencial os capítulos ou a um conjunto isolado de versículos. Cada frase ou versículo deve ser considerado dentro do contexto abrangente da carta, que é uma unidade completa de pensamento.
Essas divisões, embora úteis, podem influenciar a compreensão do texto ao sugerirem separações onde o autor original não as propôs. Assim, capítulos e versículos servem apenas como referências práticas para localização e citação de trechos específicos, mas não devem orientar o entendimento isolado das mensagens.
Essa observação é especialmente relevante na análise do capítulo em questão. Quando Paulo afirma: “Tendo sido, pois, justificados pela fé…” (Romanos 5:1), ele não apenas conclui uma linha de raciocínio, mas também inicia uma nova ideia. Essa transição conecta a argumentação anterior com a nova exposição que ele desenvolverá a seguir.
Ao escrever “Tendo sido, pois, justificados pela fé…”, Paulo encerra a discussão sobre as questões relacionadas aos judeus — como a observância da lei, a descendência de Abraão segundo a carne, a circuncisão e a desobediência à lei. Com isso, ele conclui o contraponto aos judaizantes, que sustentavam que somente os gentios eram pecadores e que a justiça de Deus provinha da lei mosaica.
Ao ser justificado pela fé em Cristo, essas questões passam para um plano secundário, pois em Cristo não há distinção entre gentios e judeus. Essa afirmação se conecta com a ideia central defendida em Romanos 1:16-17 e 3:21-22, e, a partir daí, o apóstolo começa a destacar os fundamentos da justificação pela fé.
Por meio do evangelho, os cristãos alcançam paz com Deus através de Cristo Jesus. Ao exercerem fé em Cristo, são declarados justos e reconciliados com Deus, o que coloca a nova condição em Cristo em nítido contraste com a argumentação dos judaizantes exposta nos versos 9 e 10 do capítulo 4.
“Vem, pois, esta bem-aventurança sobre a circuncisão somente, ou também sobre a incircuncisão? Porque dizemos que a fé foi imputada como justiça a Abraão. Como lhe foi, pois, imputada? Estando na circuncisão ou na incircuncisão? Não na circuncisão, mas na incircuncisão.” (Romanos 4:9-10).
Essa paz foi proclamada pelo profeta Isaías, com o propósito de alcançar tanto os judeus, considerados próximos, quanto os gentios, vistos como distantes. Essa paz seria difundida por meio do fruto dos lábios, uma mensagem destinada a atingir, sem distinção, todas as famílias da terra.
“Eu crio os frutos dos lábios: paz, paz, para o que está longe; e para o que está perto, diz o SENHOR, e eu o sararei.” (Isaías 57:19).
Firmados em Cristo
2 Pelo qual também temos entrada pela fé a esta graça, na qual estamos firmes, e nos gloriamos na esperança da glória de Deus.
Desde já, é importante observar que, ao tratar da salvação em Cristo, Paulo geralmente inicia a exposição pela condição atual dos cristãos — a paz com Deus decorrente da reconciliação — para, em seguida, explicar como essa condição foi alcançada (“pelo qual também temos entrada pela fé a esta graça”). Assim, ao longo da análise da carta aos Romanos, veremos que o apóstolo frequentemente parte do estado presente dos fiéis (paz com Deus) e, então, retrocede para destacar a condição anterior (inimizade).
Por meio de Jesus, os cristãos têm acesso a essa graça, alcançando a justificação e a reconciliação com Deus por exercerem fé n’Ele. Esse versículo evidencia que, através do exercício da fé em Cristo, os cristãos recebem a graça divina (justificação e reconciliação), enquanto o verso anterior enfatiza a graça já recebida: a justificação e a amizade com Deus.
Paulo sublinha que ele e todos os que estão em Cristo (“…também temos…”) estão firmes na graça oriunda do evangelho (“…na qual estamos firmes…”). É pela fé em Cristo que o homem obtém acesso à graça divina e, assim, deve perseverar firmemente, sem se afastar da esperança oferecida pelo evangelho (Colossenses 1:23; 2 Tessalonicenses 2 : 15; 1 Pedro 5:9).
Enquanto alguns se vangloriam de elementos relacionados à carne (como demonstrado em 2 Coríntios 11:18 e 22 e Filipenses 3:3-9), os cristãos se gloriam na esperança proposta pelo evangelho: um dia possuir a glória de Deus.
“Quando Cristo, que é a nossa vida, se manifestar, então também vós vos manifestareis com ele em glória.” (Colossenses 3:4).
Embora Paulo não retorne explicitamente à questão das diferenças entre gentios e judeus, ele aborda essas distinções de forma implícita, evidenciando que elas são criações humanas, não divinas. Gloriar-se na esperança da glória de Deus traz à memória a futilidade dos que se vangloriam nas práticas externas segundo mandamentos de homens, lembrando aos cristãos que sua verdadeira glória está na promessa do evangelho.
Gloriando-se na esperança e tribulações
3 E não somente isto, mas também nos gloriamos nas tribulações; sabendo que a tribulação produz a paciência,
Enquanto os que pertencem à fé se gloriam na esperança proposta pelo evangelho e suportam com alegria as tribulações decorrentes das perseguições, os que pertencem à carne se vangloriam em coisas terrenas, nas tradições que receberam dos pais e em obedecer mandamentos de homens.
“Pois que muitos se gloriam segundo a carne, eu também me gloriarei (…) Se convém gloriar-me, gloriar-me-ei no que diz respeito à minha fraqueza.” ( 2 Coríntios 11:18 e 30 ).
Enquanto aqueles que pertenciam à carne buscam motivos para se gloriarem externamente na carne dos irmãos em Cristo, impondo a circuncisão aos cristãos, Paulo ensina que os cristãos devem gloriar-se exclusivamente na cruz de Cristo, que é a verdadeira esperança da glória.
“Porque nem ainda esses mesmos que se circuncidam guardam a lei, mas querem que vos circuncideis, para se gloriarem na vossa carne. Mas longe esteja de mim gloriar-me, a não ser na cruz de nosso Senhor Jesus Cristo, pela qual o mundo está crucificado para mim e eu para o mundo.” (Gálatas 6:13-14).
A esperança em Cristo é motivo de alegria; as tribulações exigem perseverança, e o cristão deve permanecer firme e confiante. Ao ser provado na tribulação, o cristão deve demonstrar firmeza, manifestando constância e resistência.
“Alegrai-vos na esperança, sede pacientes na tribulação, perseverai na oração;” (Romanos 12:12);
“Confirmando os ânimos dos discípulos, exortando-os a permanecer na fé, pois que por muitas tribulações nos importa entrar no reino de Deus.” (Atos 14:22).
4 E a paciência a experiência, e a experiência a esperança. 5 E a esperança não traz confusão, porquanto o amor de Deus está derramado em nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi dado.
A paciência ao enfrentar a tribulação gera aprovação, e a aprovação fortalece a esperança, que, por sua vez, elimina a desonra. Nesse contexto, tanto Tiago quanto Pedro destacam que as provações devem ser motivo de alegria e exultação, pois a fé do crente, ao ser provada, produz perseverança. Crer em Cristo é fundamental, mas perseverar nessa fé, aguardando a plena revelação de Cristo, culminará em louvor, glória e honra (Colossenses 3:4).
“Meus irmãos, tende por motivo de grande gozo o passardes por provações, sabendo que a prova da vossa fé desenvolve a perseverança. Ora a perseverança deve terminar a sua obra…” (Tiago 1:2 -4).
“Nisto vos exultais, ainda que no presente, por breve tempo, se necessário, sejais contristados por várias provações. Essas provações são para que a prova da vossa fé (…) redunde para louvor, glória e honra na revelação de Jesus Cristo.” (1 Pedro 1:6 -7).
Em Cristo, a graça foi revelada a todos os povos, e é pela fé que se tem “entrada” nessa graça divina. Por meio da esperança oferecida, o cristão encontra força para enfrentar as tribulações. Por isso, o alerta das Escrituras é claro: corramos com perseverança a carreira que nos foi proposta, fixando os olhos em Cristo. Ele, como exemplo perfeito, suportou a cruz e desprezou a vergonha, motivado pela alegria que lhe estava reservada (Hebreus 12:1-3).
Quando o apóstolo declara que “a esperança não traz confusão”, ele destaca a obra do Espírito Santo, concedido por meio de Cristo. Ao guardar as palavras de Cristo, o cristão torna-se templo de Deus, e a plenitude do amor divino manifesta-se na realidade de que Cristo, juntamente com o Pai, habita no crente.
“Jesus respondeu, e disse-lhe: Se alguém me ama, guardará a minha palavra, e meu Pai o amará, e viremos para ele, e faremos nele morada.” (João 14:23);
“E isto disse ele do Espírito que haviam de receber os que nele cressem; porque o Espírito Santo ainda não fora dado, por ainda Jesus não ter sido glorificado.” (João 7:39).
Ao escrever aos cristãos em Éfeso, Paulo aborda essa mesma questão da seguinte forma: ele destaca que, pela fé, os crentes são edificados como uma morada de Deus no Espírito, sendo fortalecidos no homem interior para que Cristo habite em seus corações. Assim, o apóstolo enfatiza que os cristãos, enraizados e fundamentados no amor, podem compreender a largura, o comprimento, a altura e a profundidade do amor de Cristo, que excede todo entendimento, para serem cheios de toda a plenitude de Deus (Efésios 3:16-19).
Além de ser o amor de Deus que transborda no coração do cristão, o Espírito Santo também é o penhor da herança destinada aos salvos. Ele é a garantia divina da redenção da possessão adquirida, assegurando o cumprimento pleno das promessas de Deus.
“Em quem também vós estais, depois que ouvistes a palavra da verdade, o evangelho da vossa salvação; e, tendo nele também crido, fostes selados com o Espírito Santo da promessa. O qual é o penhor da nossa herança, para redenção da possessão adquirida, para louvor da sua glória.” (Efésios 1:13 -14).
A prova do Amor de Deus
6 Porque Cristo, estando nós ainda fracos, morreu a seu tempo pelos ímpios. 7 Porque apenas alguém morrerá por um justo; pois poderá ser que pelo bom alguém ouse morrer.
O apóstolo relembra que, quando todos os cristãos ainda estavam enfermos e incapazes, no tempo oportuno, Cristo morreu pelos pecadores. Ele ressalta que, mesmo sendo raro que alguém estivesse disposto a morrer por um justo (alguém correto), talvez houvesse quem ousasse se oferecer para morrer por uma pessoa nobre (ἀγαθός), no sentido aristocrático.
Em diversas culturas, guerreiros e líderes têm histórias de se sacrificarem em batalhas ou situações de risco para proteger seus reis, líderes ou pessoas consideradas nobres. Esses atos são muitas vezes enraizados em códigos de honra ou lealdade. Nesse sentido, há um relato em 2 Samuel 23:13-17 e 1 Crônicas 11:15-19, onde três dos valentes de Davi, em um ato extraordinário de coragem e lealdade, arriscaram suas vidas para atender a um desejo expresso por Davi.
Durante um momento de cerco, Davi expressou, talvez como um anseio nostálgico, que gostaria de beber da água do poço de Belém, sua cidade natal, que estava então sob o controle dos filisteus. Movidos por sua admiração e lealdade, três de seus guerreiros romperam as linhas inimigas, tiraram água do poço e a trouxeram para Davi. No entanto, ao receber a água, Davi não a bebeu, mas a derramou como oferta ao Senhor, dizendo:
“E disse: Nunca meu Deus permita que faça tal! Beberia eu o sangue destes homens com as suas vidas? Pois com perigo das suas vidas a trouxeram. E ele não a quis beber. Isto fizeram aqueles três homens.” (1 Crônicas 11:19).
8 Mas Deus prova o seu amor para conosco, em que Cristo morreu por nós, sendo nós ainda pecadores.
9 Logo muito mais agora, tendo sido justificados pelo seu sangue, seremos por ele salvos da ira. 10 Porque se nós, sendo inimigos, fomos reconciliados com Deus pela morte de seu Filho, muito mais, tendo sido já reconciliados, seremos salvos pela sua vida.
O apóstolo esclarece que, agora, justificados por meio do sacrifício de Cristo, os cristãos têm a garantia de que serão salvos da ira divina. Ele apresenta um argumento poderoso: se, quando ainda eram inimigos de Deus, foram reconciliados com Ele pela morte de Seu Filho, muito mais, agora que estão reconciliados, serão salvos por Sua vida.
Essa vida de Cristo, ressuscitado dentre os mortos, é a base para a salvação plena e definitiva, pois Ele vive para interceder por aqueles que foram redimidos, garantindo-lhes segurança eterna na comunhão com Deus.
11 E não somente isto, mas também nos gloriamos em Deus por nosso Senhor Jesus Cristo, pelo qual agora alcançamos a reconciliação.
Enquanto aqueles que vivem segundo a carne se gloriam na lei e permanecem distantes da justificação, os que creem em Cristo foram justificados pela fé em Cristo e desfrutam de comunhão com Deus. Além disso, os cristãos são salvos pela vida que há em Cristo e podem se gloriar em Deus por meio de Cristo Jesus, pois n’Ele encontram a plena reconciliação.
A doutrina da justificação é amplamente desenvolvida por Paulo no capítulo 6 de Romanos, onde ele explica a união do cristão com Cristo no batismo: sendo batizados em Sua morte, também ressuscitamos com Ele para uma nova vida. Essa união com Cristo só é possível após a morte para o pecado e o início de uma nova vida criada pelo poder de Deus.
Além disso, a manifestação do amor de Deus, já mencionada no capítulo 5, é retomada e ampliada no capítulo 8. Ali, Paulo expõe como o amor de Deus é inseparável dos que estão em Cristo, garantindo-lhes segurança eterna e reafirmando que nada poderá separá-los do amor de Deus que está em Cristo Jesus, nosso Senhor.
“Aquele que nem mesmo a seu próprio Filho poupou, antes o entregou por todos nós, como nos não dará também com ele todas as coisas?” (Romanos 8:32).
O Primeiro e o último Adão
“Assim está também escrito: O primeiro homem, Adão, foi feito em alma vivente; o último Adão em espírito vivificante.” (1 Coríntios 15:45).
Adão e Cristo são figuras centrais na interpretação bíblica, pois representam dois momentos fundamentais para a humanidade: a queda no Éden e a redenção na cruz. Grande parte das parábolas de Jesus e das figuras do Novo Testamento remetem diretamente a esses eventos, ilustrando suas implicações para a história humana.
Um exemplo é a parábola dos “dois caminhos”, que, implicitamente, reflete as consequências do que ocorreu no Éden e na cruz. Adão foi criado como alma vivente, mas, ao desobedecer à ordem divina, passou à condição de morto diante de Deus. Essa nova condição trouxe a sujeição ao pecado, devido à natureza adquirida com a queda.
A sujeição ao pecado colocou Adão em inimizade com Deus. Pela condenação decorrente de sua desobediência, deixou de ser participante da vida que há em Deus e passou a viver para o pecado, ou seja, morto para Deus e vivo para o pecado. Todos os descendentes de Adão — nascidos da carne, da vontade do homem e do sangue — passaram a ser filhos da ira e da desobediência.
A morte, decorrente da ofensa de Adão, alcançou todos os seus descendentes, trazendo consigo uma nova condição: a separação de Deus. Por essa razão, é declarado que “todos pecaram” (Romanos 3:23), pois, em Adão, todos foram destituídos da glória de Deus. Essa condição não se refere apenas a atos pecaminosos individuais, mas à natureza herdada que resulta da queda, tornando todos os homens participantes do estado de pecado e sujeitos à morte.
Essa condição universal é ilustrada na parábola das duas portas e dos dois caminhos. Por serem descendentes de Adão, todos os homens entram pela porta larga e seguem pelo caminho espaçoso que conduz à perdição (Mateus 7:13). Em Adão, todos morreram e foram separados da glória de Deus. A porta larga representa Adão, a cabeça da humanidade terrena. Todos que nascem de sua semente corruptível entram no mundo por meio dele, a porta larga, e passam a viver para o pecado.
Por outro lado, por meio de Cristo, o último Adão, que foi constituído espírito vivificante, aqueles que creem entram por Cristo, a porta estreita, e nascem de novo. São recriados por Deus em verdadeira justiça e santidade, mediante o poder do evangelho, e feitos filhos de Deus (João 1:12). Esses estão em Cristo, o caminho estreito, que conduz à vida. Contudo, poucos o encontram, pois, em termos absolutos, muitos nascem segundo Adão, enquanto poucos creem para a salvação em Cristo, o último Adão.
Em Adão, toda a humanidade morreu e passou a viver para o pecado. Em Cristo, todos os que creem morrem para o pecado e para o mundo, sendo recriados para viver para Deus. Amém.
Vaso para Honra e para Desonra
Outro exemplo que remonta a Adão e Cristo é a figura dos vasos, como mencionado por Paulo em Romanos:
“Ou não tem o oleiro poder sobre o barro, para da mesma massa fazer um vaso para honra e outro para desonra?” (Romanos 9:21).
Nesta metáfora, Deus é o oleiro e o homem é o barro. Todos os homens derivam da mesma massa e são criados por Deus como almas viventes, segundo Adão. No entanto, como descendentes de Adão, todos são feitos vasos para desonra, ou seja, vasos de ira preparados para a perdição. Através desses vasos, Deus demonstra Sua ira e revela Seu poder, suportando-os com muita paciência.
Ainda assim, o evangelho é o chamado de Deus para transformar vasos de ira em vasos de misericórdia. Aqueles que atendem ao chamado e creem tornam-se vasos para honra, nos quais Deus manifesta o poder de Sua graça. Como Paulo ensina, tanto os nascidos em Adão quanto os nascidos em Cristo são formados da mesma massa, mas os primeiros são vasos para desonra, enquanto os segundos são vasos para honra, feitos novas criaturas em Cristo (1 Coríntios 15:46).
Todos os homens, ao nascerem, são feitos almas viventes, ou seja, tornam-se homens naturais, conforme o modelo de Adão. Essa condição inicial é essencial, pois antecede a criação do homem espiritual, que ocorre somente por meio do novo nascimento em Cristo.
No entanto, os homens naturais, descendentes de Adão, herdam sua natureza corrompida e passam à condição de escravos do pecado. Essa escravidão resulta do pecado original, que trouxe condenação e afastamento de Deus.
O grande diferencial entre os nascidos segundo Adão e os nascidos em Cristo está na transformação espiritual. Os descendentes de Adão são vasos para desonra, destinados à ira e à perdição, pois permanecem sob o domínio do pecado. Em contraste, os que nascem de novo, em Cristo, são feitos vasos para honra, criados em verdadeira justiça e santidade. Estes, pelo poder do evangelho, são libertos da escravidão ao pecado e passam a viver para Deus, refletindo a glória de Cristo como novas criaturas.
Quando o leitor não compreende a profundidade dos eventos do Éden e da cruz, interpreta a Bíblia de maneira equivocada. Ao se deparar com parábolas e ilustrações, como as mencionadas, tende a aplicar uma concepção meramente humana, permanecendo preso a uma compreensão carnal e superficial.
Muitos acreditam que a porta larga representa apenas a entrega aos prazeres do mundo, associando-a ao comportamento sensual, cético ou criminoso. Entendem que a largura da porta se deve à falta de dificuldades ou exigências para se entrar por ela. Da mesma forma, o caminho estreito é frequentemente associado a restrições morais, comportamentais ou religiosas, sendo visto como um conjunto de exigências a serem cumpridas para alcançar a salvação.
Essa visão distorcida alimenta o surgimento de diversas religiões, igrejas e denominações, que multiplicam discursos centrados em disciplina, sofrimento, penitências, orações, moralidade, serviço e santidade. Qualidades oriundas do ego humano, como coragem, determinação, disciplina e resignação, são insistentemente exaltadas como virtudes necessárias à salvação.
O ritualismo, o formalismo e o legalismo tornam-se ferramentas para caracterizar a devoção religiosa, criando mecanismos para medir e avaliar os outros conforme padrões estabelecidos. Esses sistemas estabelecem códigos de justiça e santidade baseados em preceitos humanos, frequentemente extraídos do paganismo e das filosofias terrenas, ignorando o verdadeiro evangelho.
No entanto, essas abordagens falham em compreender o que Jesus disse a Nicodemos:
“Em verdade, em verdade te digo que quem não nascer de novo, não pode ver o reino de Deus” (João 3:3).
O melhor que a religião, a lei, a moralidade ou o comportamento humano podem oferecer não tornam o homem agradável a Deus. Por isso, Jesus exortou até mesmo um dos mestres do judaísmo a reconhecer a necessidade do novo nascimento.
O mundo continua apegado a elementos fracos e pobres que são incapazes de libertar o homem da escravidão ao pecado (Gálatas 4:9-10). Contudo, o apóstolo Paulo, consciente das consequências da desobediência de Adão e da obediência de Cristo, expõe essas verdades ao escrever aos cristãos de Corinto:
“O primeiro homem, Adão, foi feito alma vivente; o último Adão, espírito vivificante” (1 Coríntios 15:45-50).
Essas palavras de Paulo nos conduzem a uma reflexão profunda: apenas em Cristo, pelo novo nascimento, o homem pode romper com sua condição herdada em Adão e trilhar o caminho estreito que conduz à vida.
Esses equívocos resultam em práticas legalistas e ritualistas, com esforços humanos sendo exaltados como caminhos de salvação. Contudo, Paulo alerta contra esse “pretenso evangelho” em sua carta a Timóteo, dizendo que nos últimos tempos muitos se desviarão da fé, abraçando doutrinas humanas.
“Mas o Espírito expressamente diz que nos últimos tempos alguns apostatarão da fé (…) que proíbem o casamento, e ordenam a abstinência de alimentos” (1 Timóteo 4:1-3).
Por isso, a análise dos capítulos 6 e 7 de Romanos é crucial, pois eles se fundamentam nos eventos do Éden e da cruz, elucidando suas consequências para a humanidade. Apenas pela revelação do evangelho é possível compreender plenamente a obra redentora de Cristo e viver na verdadeira liberdade para Deus.
Glórias a Deus !! Muito boa está palavra que Deus continue abençoando grandemente !
Compreendermos nossa condição miserável de pecado e saber do valor do sacrifício de Cristo por nós, faz com q queiramos cada dia mais amar e glorificar nosso Deus! Aleluia!!! Palavra preciosa. Q Deus abençoe sua vida cada dia mais meu irmão!🙌
Muito bom esse estudo,adoro saber o que o texto biblico nos ilumina com mais detalhes.esse texto em especial o verso 20,21,me tras a memoria o quanto Deus é cuidafoso com sua obra.adoro saber da salvacao.