Romanos

Romanos 4 – Promessa firme à posteridade

A fidelidade e imutabilidade de Deus é a base da promessa de Deus que permanece firme a toda posteridade, de qaue em Cristo, o descendente, todas as famílias da terra seriam benditas.


Promessa firme à posteridade

Romanos 3 – Deus é justo e justificador daquele que tem fé em Jesus

Revisão

Nas análises realizadas até este ponto da carta aos Romanos, observa-se que, desde o capítulo 1, verso 18, até o final do capítulo 3, o apóstolo Paulo se dedicou a desconstruir a alegada vantagem que os judeus presumiam ter no que tange à salvação. Através de diversos argumentos e com base na autoridade das Escrituras, Paulo demonstra que todos os homens, judeus e gentios, estão igualmente presos à condição herdada de Adão.

“Todos os que sem lei pecaram, sem lei também perecerão, e todos os que sob a lei pecaram, pela lei serão julgados” (Romanos 2:12);

“Porque todos pecaram e destituídos estão da glória de Deus” (Romanos 3:23).

Esses versículos mostram que tanto judeus quanto gentios estão sob condenação. Mesmo sem a lei, os gentios eram pecadores e pereceriam; os judeus, apesar de terem a lei, também eram pecadores e seriam julgados por ela em relação às suas obras. Ninguém será justificado, independentemente de ser judeu ou gentio, e o único fator de distinção entre eles é que, enquanto os gentios perecerão sem a lei, os judeus serão julgados conforme a lei quanto às suas ações. Assim como todos foram julgados e condenados em Adão, é certo que o julgamento ao qual o apóstolo se refere trata-se de um julgamento das obras (Romanos 2:6-11).

Ao ler as epístolas paulinas em relação ao juízo de Deus, não podemos nos esquecer da seguinte observação:

“Pois assim como por uma só ofensa veio o juízo sobre todos os homens para condenação, assim também por um só ato de justiça veio a graça sobre todos os homens para justificação de vida. Porque, como pela desobediência de um só homem, muitos foram feitos pecadores, assim pela obediência de um muitos serão feitos justos.” (Romanos 5:18-19).

É fundamental lembrar que o juízo de Deus veio em consequência da ofensa de Adão, e todos os seus descendentes, tanto judeus quanto gentios, compartilham dessa condenação e estão destinados a perecer. Assim, é importante destacar que o juízo de Deus não se baseia nas obras da lei, pois a condenação inicial se deu por meio do pecado herdado de Adão. A salvação, portanto, não pode ser alcançada pelas obras da lei, mas somente pela graça, mediante a fé em Cristo.

No entanto, para aqueles que morrerem sem alcançar a salvação, restará o julgamento de suas ações no grande Juízo do Trono Branco, conforme descrito em Apocalipse 20:11-15. Nesse julgamento final, as ações de todos os indivíduos, sem exceção, serão consideradas, mas não para a justificação, pois todos já estarão condenados eternamente pela ofensa herdada de Adão. Portanto, enquanto a salvação é exclusivamente pela fé, oferecida no tempo oportuno que se chama “hoje”, o julgamento das obras (ações) se aplicará àqueles que rejeitaram essa salvação, resultando na plena execução da condenação que já pairava sobre eles devido ao pecado original.

Nos versículos 21 a 31 do capítulo 3, Paulo retoma a discussão sobre a eficácia do evangelho, já mencionada nos versículos 16 e 17 do capítulo 1, ao afirmar:

“Não me envergonho do evangelho, pois é o poder de Deus para a salvação de todo aquele que crê; primeiro do judeu, e também do grego. Pois nele se descobre a justiça de Deus de fé em fé, como está escrito: O justo viverá pela fé (…) Mas agora, sem a lei, se manifestou a justiça de Deus, tendo o testemunho da lei e dos profetas. Isto é, a justiça de Deus pela fé em Jesus Cristo para todos os que creem. Não há distinção” (Romanos 1:16-17 e 3:21-22).

Ao chegar ao capítulo 4, Paulo passa a exemplificar, por meio das Escrituras, a justificação pela fé que ele apresentou anteriormente, em especial nos versos 21 a 31 do capítulo 3.

Em suma, Paulo demonstrou que:

  • Jesus é a manifestação da justiça de Deus para os homens (Romanos 3:21);
  • A justiça de Deus é recebida pela fé em Jesus Cristo (Romanos 3:22);
  • A salvação é oferecida a todos, pois todos pecaram (Romanos 3:22-23);
  • A redenção em Cristo liberta os homens da condenação herdada de Adão, uma vez que em Adão todos pecaram;
  • Aqueles que foram condenados em Adão são declarados justos pela graça, mediante a redenção em Cristo (Romanos 3:24);
  • Cristo é a propiciação pelos pecados, redimindo os pecadores por meio da fé no seu sangue, o que constitui a base da justificação (Romanos 3:25);
  • Pela fé, a lei é confirmada, e diante de Deus não há distinção entre os homens.

Após concluir sua argumentação no versículo 28 do capítulo 3, Paulo começa a apresentar a evidência da justificação pela fé através do exemplo de Abraão, o patriarca.

 

A justiça própria

Antes de prosseguirmos, é importante esclarecer duas passagens bíblicas que nos fornecem uma compreensão mais profunda sobre a justiça que Jesus recomendou:

“Porque vos digo que, se a vossa justiça não exceder a dos escribas e fariseus, de modo nenhum entrareis no reino dos céus.” (Mateus 5:20).

É bem sabido que os fariseus formavam uma das seitas mais rigorosas do judaísmo. Eles lideravam um movimento que buscava trazer o povo à obediência estrita à lei de Deus, sendo conhecidos por seu legalismo, formalismo e apego à tradição. Embora o termo “fariseu” hoje carregue em seu bojo uma conotação negativa, na época de Cristo, o termo fazia alusão ao melhor seguimento do judaísmo, e eram vistos como exemplos de justiça e retidão, destacando-se pela observância cuidadosa das tradições e seus requisitos.

“Sabendo de mim desde o princípio (se o quiserem testificar), que, conforme a mais severa seita da nossa religião, vivi fariseu.” (Atos 26:5).

Aos olhos dos homens, eles eram considerados justos, pois suas ações externas refletiam um padrão elevado de moralidade e comportamento segundo a lei. Contudo, Jesus revelou a verdadeira condição de seus corações:

“Assim também vós exteriormente pareceis justos aos homens, mas interiormente estais cheios de hipocrisia e de iniquidade.” (Mateus 23:28).

Diante disso, surge a necessidade de perguntar: qual justiça Jesus estava recomendando aos seus ouvintes? Que justiça poderia exceder a dos fariseus, que eram tidos como o padrão máximo de retidão? Essa justiça teria por base os preceitos da lei mosaica?

A resposta se encontra na própria pessoa de Cristo. Sabemos que Cristo é a justiça de Deus manifestada aos homens (Romanos 3:21-22). Ele é a justiça que excede a dos escribas e fariseus, pois a justiça divina não se baseia em ações externas, como comportamento, moralidade, caráter, sacrifícios ou religiosidade. Pelo contrário, essa justiça é imputada por meio da fé em Cristo e provém do alto, como descrito em Romanos 10:6: “A justiça que vem da fé diz assim: Não digas em teu coração: Quem subirá ao céu?”

Assim como para entrar no reino de Deus é necessário nascer de novo (João 3:3), a justiça que excede a dos fariseus também decorre de um novo nascimento. Enquanto os fariseus e saduceus não conseguiram alcançar a justificação pelas obras da lei, aqueles que creem em Cristo são transformados e recebem de Deus o poder para se tornarem filhos de Deus (João 1:12). Estes, nascidos da semente incorruptível, que é a Palavra de Deus (1 Pedro 1:23), são declarados justos por Deus, não por suas ações cotidianas ou obras segundo a lei, mas pela graça mediante a fé em Cristo.

Os fariseus e saduceus jamais seriam justificados diante de Deus por serem descendentes de Abraão, mesmo se cumprissem precitos da lei. O problema deles precedia a própria lei, pois a condenação de todos os homens teve origem em Adão. Assim, mesmo sendo descendentes de Abraão, eles continuavam sob a condenação herdada de Adão, e, por isso, suas obras não eram feitas em Deus, como Jesus afirmou:

“Quem nele crê não é condenado; mas quem não crê já está condenado, porquanto não crê no nome do unigênito Filho de Deus. E a condenação é esta: a luz veio ao mundo, e os homens amaram mais as trevas do que a luz, porque as suas obras eram más” (João 3:18-19).

A solução que Jesus apresentou à multidão no Sermão da Montanha é a mesma que Ele anunciou a Nicodemos, um fariseu. Tanto a multidão quanto Nicodemos precisavam entrar pela porta estreita, ou seja, nascer de novo. As portas mencionadas na parábola dos dois caminhos (Mateus 7:13-14) simbolizam dois tipos de nascimento: o nascimento natural e o nascimento espiritual.

O nascimento segundo a carne, mesmo que seja da descendência de Abraão, submete o recém-nascido à condenação herdada de Adão. Isso significa que, por mais que os judeus, incluindo fariseus e saduceus, tentassem alcançar justificação por meio das obras da lei, permaneciam sob o peso dessa condenação.

Por outro lado, o nascimento segundo a Palavra de Deus, que é comparada a uma semente incorruptível (1 Pedro 1:23), representa a entrada pela porta estreita, que concede uma nova existência a homens e mulheres livres da condenação de Adão. Jesus está revelando que a verdadeira justiça e o verdadeiro caminho para o reino dos céus não vêm da obediência à lei, mas do novo nascimento espiritual concedido pela verdade do evangelho, que liberta da condenação original e introduz à vida eterna.

Os condenados em Adão, ao se apresentarem diante do grande Tribunal do Trono Branco, não serão justificados, pois suas obras, comparadas a “trapos de imundície” (Isaías 64:6), são insuficientes para a justificação. A natureza corrompida herdada de Adão impede que qualquer esforço humano seja aceitável diante de Deus para salvação. Suas obras são feitas fora de Deus, mesmo aquelas decorrentes da lei, e por isso não têm valor redentor.

Em contrapartida, a nova criatura em Cristo, livre da condenação herdada de Adão, realiza obras que são aceitáveis diante de Deus. Isso ocorre porque essas obras são realizadas “em Deus”, por meio de Cristo, como explicado em João 3:21: “Mas quem pratica a verdade vem para a luz, a fim de que suas obras sejam manifestas, porque são feitas em Deus.” A nova criação não está mais sob a condenação do pecado original, mas vive em novidade de vida, e suas ações, guiadas pelo Espírito Santo, por intermédio do evangelho, se amoldam a vontade de Deus.

Enquanto os condenados em Adão enfrentarão o julgamento de suas obras no Trono Branco, aqueles que foram libertos pela fé em Cristo comparecerão diante do Tribunal de Cristo (2 Coríntios 5:10), onde suas obras serão julgadas, não para condenação, mas para recompensa. Nesse julgamento, as obras realizadas em Cristo, segundo a verdade do evangelho, serão avaliadas e recompensadas de acordo com o que cada um tiver feito.

Somente a justiça providenciada por Deus, por intermédio de Cristo, excede a dos escribas e fariseus. Enquanto estes confiavam em suas próprias ações, fundamentadas em preceitos de homens e tradições recebidas, suas obras eram realizadas segundo a natureza herdada de Adão, ou seja, eram obras mortas, incapazes de trazer justificação.

As obras dos escribas e fariseus, embora externamente pudessem parecer justas aos olhos humanos, não passavam de expressões de uma natureza corrompida, proveniente de Adão. Essas ações não tinham valor diante de Deus para a salvação, pois eram realizadas fora da nova vida em Cristo. Em contraste, a justiça que Deus providencia por meio de Cristo não é baseada no esforço humano, mas na verdade do evangelho. É uma justiça viva, que transcende as tentativas humanas de alcançar retidão.

Somente a justiça de Cristo, recebida pela fé n’Ele, pode justificar o homem e capacitá-lo a realizar obras verdadeiramente aceitáveis diante de Deus. Essas obras, feitas em Cristo, não são mais “trapos de imundície”, mas são fruto de uma nova natureza, que reflete a vida e a justiça divina.

“Vós também, como pedras vivas, sois edificados casa espiritual e sacerdócio santo, para oferecer sacrifícios espirituais agradáveis a Deus por Jesus Cristo.” (1 Pedro 2:5).

 

É necessário repudiar os familiares?

“Não cuideis que vim trazer a paz à terra; não vim trazer paz, mas espada; Porque eu vim pôr em dissensão o homem contra seu pai, e a filha contra sua mãe, e a nora contra sua sogra; E assim os inimigos do homem serão os seus familiares. Quem ama o pai ou a mãe mais do que a mim não é digno de mim; e quem ama o filho ou a filha mais do que a mim não é digno de mim. E quem não toma a sua cruz, e não segue após mim, não é digno de mim. Quem achar a sua vida perdê-la-á; e quem perder a sua vida, por amor de mim, achá-la-á.” (Mateus 10:32-39).

A outra observação decorre da interpretação de Myer Pearlman sobre os versículos mencionados, na qual ele pontuou:

“Esta é a ideia contida nestes versículos: A comunhão com Cristo pode significar separação daqueles que nos são queridos na terra, mas a recompensa será grande (…) É doloroso o repúdio dos familiares, talvez a mais severa tentação que o convertido possa enfrentar” Pearlman, Myer, Mateus, O evangelho do Grande Rei, Ed. CPAD, 1. ed. Rj, 1995, p. 75, V.

Com base na explicação de Pearlman, surgem algumas perguntas: Jesus realmente recomendou que abandonássemos nossos familiares? Como podemos conciliar essas palavras com o primeiro mandamento com promessa: “Honra a teu pai e a tua mãe, que é o primeiro mandamento com promessa” (Efésios 6:2)? Como entender que o Príncipe da Paz declarou não ter vindo trazer paz à terra? O Príncipe da Paz empunha uma espada? Por que Jesus teria semeado dissensão entre o homem e seu pai? Como devemos interpretar essa passagem?

Essa questão pode ser esclarecida pela interpretação cuidadosa do contexto bíblico e pelo entendimento espiritual dos ensinamentos de Cristo. Em Efésios 6:2, o apóstolo Paulo reforça o mandamento de honrar pai e mãe, que é o primeiro mandamento com uma promessa. À primeira vista, pode parecer contraditório em relação às palavras de Jesus em Mateus 10:34-36, onde Ele afirma: “Não vim trazer paz, mas espada”.

Para compreendermos melhor, devemos seguir o princípio exposto por Paulo em 1 Coríntios 2:13, onde ele nos ensina a interpretar as Escrituras “comparando as coisas espirituais com as espirituais”. A interpretação bíblica não pode ser fundamentada em suposições humanas, mas deve ser guiada pelo Espírito Santo. E como Ele nos ensina? Quando comparamos as palavras de Cristo, que são espírito e vida (João 6:63), com as profecias do Antigo Testamento, que é espírito (Joel 2:28).

“As quais também falamos, não com palavras de sabedoria humana, mas com as que o Espírito Santo ensina, comparando as coisas espirituais com as espirituais.” (1 Coríntios 2:13).

Jesus, ao citar “os inimigos do homem serão os da sua própria casa” (Mateus 10:36), estava se referindo a Miqueias 7:6. No contexto de Miqueias, uma primeira leitura parece sugerir que o profeta lamenta a corrupção moral e espiritual do povo de Israel, como se até mesmo as relações mais próximas — entre pais e filhos, noras e sogras — estavam contaminadas pela desconfiança e pelo mal. No entanto, essa profecia apontava para o fato de que, quando o Messias viesse, Ele traria uma divisão entre o povo de Israel, pois muitos questionariam se Ele realmente era o Messias prometido.

“E, chegando Jesus às partes de Cesareia de Filipe, interrogou os seus discípulos, dizendo: Quem dizem os homens ser o Filho do Homem? E eles disseram: Uns, João Batista; outros, Elias; e outros, Jeremias, ou um dos profetas.” (Mateus 16:13-14).

Essa análise nos permite entender que Jesus não está incitando um abandono literal ou desonra aos familiares. Ao contrário, Ele estava destacando o cumprimento das Escrituras, que previam que a verdade do evangelho inevitavelmente provocaria uma divisão entre Seus concidadãos quanto à Sua identidade como o Messias.

Ao analisar o contexto da profecia de Miqueias, percebe-se que o profeta expressa profunda lamentação por sua condição, pois ao olhar ao seu redor, não encontrava nada que saciasse sua fome por justiça (Miqueias 7:1). Mas por que essa fome e sede? Porque, mesmo entre os filhos de Israel, não havia homens piedosos na terra. Ninguém era reto, nem mesmo os israelitas (Salmo 53:1-3).

É importante lembrar que, antes de Cristo, o único homem piedoso que viveu sobre a terra foi Adão. No entanto, após a sua queda, todos os seus descendentes se desviaram, incluindo os judeus (Miqueias 7:2; Salmo 58:1-3). Miqueias oferece um diagnóstico contundente de seu povo: “não há entre os homens um que seja justo; todos armam ciladas para sangue; cada um caça a seu irmão com a rede,” (Miqueias 7:2).

“DAI voltas às ruas de Jerusalém, e vede agora; e informai-vos, e buscai pelas suas praças, a ver se achais alguém, ou se há homem que pratique a justiça ou busque a verdade; e eu lhe perdoarei.” (Jeremias 5:1).

As obras dos filhos de Israel revelam sua natureza corrupta, pois, assim como a árvore só pode produzir fruto segundo sua espécie, também cada um deles manifesta o que está em seu interior (Miqueias 7:3). O melhor entre os homens de Israel é comparado a um espinho, e o mais reto a uma cerca feita de espinhos (Miqueias 7:4; Mateus 12:33). Contudo, apesar da condição nefasta de Israel, Miqueias vislumbra algo extraordinário: a chegada do “dia dos vigias”, o dia daqueles que aguardavam a visitação de Deus! “Os vigias” se referem aos profetas, cuja missão era servir como atalaias para o povo de Israel (Habacuque 2:1).

Porém, o esperado dia da visitação, além de ser um dia de punição, traria confusão (Miqueias 7:4). Embora os caldeus tenham trazido destruição quando deportaram Israel, a confusão a que Miqueias se refere é mais profunda: diz respeito à vinda e rejeição do Messias.

“Ao SENHOR dos Exércitos, a ele santificai; e seja ele o vosso temor e seja ele o vosso assombro. Então ele vos será por santuário; mas servirá de pedra de tropeço, e rocha de escândalo, às duas casas de Israel; por armadilha e laço aos moradores de Jerusalém. E muitos entre eles tropeçarão, e cairão, e serão quebrantados, e enlaçados, e presos.” (Isaías 8:13-15).

Esse tempo de confusão seria marcado pela desconfiança, como predito por Miqueias: “O filho desprezará o pai, a filha se voltará contra a mãe, e a nora contra a sogra” (Miqueias 7:5). A observação de Miquéias culmina na frase repetida por Jesus: “Os inimigos do homem serão os da sua própria casa”.

A divisão que se instalou em Israel girava em torno da pessoa do Messias. Muitos questionavam se o carpinteiro de Nazaré era realmente o Cristo. Desobedecendo às advertências das Escrituras, os judeus não confiaram no discernimento profético e, por isso, se escandalizaram com Jesus.

“Não é este o carpinteiro, filho de Maria, e irmão de Tiago, e de José, e de Judas e de Simão? e não estão aqui conosco suas irmãs? E escandalizavam-se nele.” (Marcos 6:3).

Essa passagem aponta para a divisão existente entre os judeus em relação a Jesus. Muitos se dividiam em sua compreensão acerca de quem Ele era: os líderes religiosos afirmavam que Cristo era um impostor; alguns amigos o viam como apenas mais um profeta; seus próprios irmãos o consideravam apenas um dos filhos de José e Maria. Diante disso, não havia consenso sobre sua verdadeira identidade.

O alerta de Deus, transmitido por meio do profeta, era claro e incisivo! Ninguém podia confiar em amigos, guias religiosos, e até mesmo os mais próximos, como os próprios filhos, não eram confiáveis quanto à verdadeira identidade do Messias. A desconfiança se estendia até àqueles em quem se depositava maior afeição e intimidade (“os filhos que repousam no teu seio”). O profeta exortava o povo a se guardar, inclusive, das palavras daqueles que lhes eram mais queridos.

“Não creiais no amigo, nem confieis no vosso guia; daquela que repousa no teu seio, guarda as portas da tua boca.” (Miquéias 7:5).

Portanto, Jesus não está recomendando o abandono literal dos familiares, mas alertando que o evangelho traria divisões inevitáveis, até mesmo entre os mais próximos, à medida que muitos rejeitariam a mensagem de salvação.

Quando Jesus cita esse pequeno trecho de Miqueias, Ele estava anunciando ao povo que aquela profecia se cumpriu. Ele declarou que era o Messias tão esperado e que o “dia da visitação” havia chegado. No entanto, devido à incredulidade do povo, esse dia seria marcado por confusão e dissensão (Mateus 10:21-22).

O texto de Miqueias é claro: o Messias não traria paz, mas divisão (Miqueias 7:5-6). Por quê? A mensagem do evangelho revela que os filhos de Israel serviam a si mesmos, não a Deus. A condição de injustiça dos judeus não se originava de suas ações, mas em Adão, pois a morte passou a todos os homens, incluindo os judeus, e é por isso que todos pecaram e carecem da glória de Deus.

Jesus veio buscar as ovelhas perdidas da casa de Israel, mas foi rejeitado por seus concidadãos (Mateus 10:5-6). Ao se aconselharem com amigos e familiares, os judeus rejeitaram o Cristo. Eles se julgavam justos por serem descendentes de Abraão, e por isso, não creram no enviado de Deus (João 1:11). No entanto, Jesus veio para os injustos — aqueles que tinham fome e sede de justiça, conforme descrito em Mateus 5:6.

Deus jamais poderia estabelecer comunhão com os filhos da ira, e por isso é necessário que eles morram com Cristo para que essa comunhão seja restaurada. Para aqueles que nasceram sob o domínio do pecado, a morte física apenas sela a condenação eterna, pois a condenação foi estabelecida em Adão. Entretanto, enquanto os descendentes de Adão estiverem vivos, ao crerem em Cristo, experimentam uma morte espiritual para o pecado, sendo unidos à morte de Cristo. Nesse ato de fé, eles ressurgem espiritualmente como novas criaturas, vivas para Deus, livres da condenação e aptas a desfrutar da comunhão com o Criador.

Cristo, embora seja a paz que excede todo entendimento, não trouxe paz aos Seus concidadãos, mas sim a espada, que simboliza dissensão e confusão. Os ímpios não podem se encontrar com a paz de Cristo diretamente, mas sim com a cruz, pois é somente através dela que a paz com Deus é restaurada. A espada que Jesus trouxe se aplica especialmente aos judeus, pois Ele provocou dissensão até mesmo entre familiares.

O homem está condenado diante de Deus devido à sua filiação a Adão, enquanto os judeus acreditavam que sua salvação estava garantida por serem descendentes de Abraão. Jesus, contudo, desafiou essa crença, convocando Seus ouvintes a romperem tanto com suas origens em Adão quanto com a falsa segurança de que seriam justificados pela descendência de Abraão. Para serem salvos, era necessário que O recebessem como Salvador, abandonando a confiança em sua linhagem natural e reconhecendo a necessidade de um novo nascimento espiritual.

Assim como Abraão, pela confiança na palavra de Deus, deixou sua terra e seguiu a Deus, é também pela promessa do evangelho que alguém pode abandonar as ligações com pai, mãe, irmãos e irmãs para seguir a Cristo. Somente essa fé, demonstrada por Abraão, é capaz de conduzir à verdadeira filiação divina.

Seguir a Cristo implica tomar a própria cruz. Não há como caminhar com Cristo até Deus sem antes passar pela cruz. É na cruz de Cristo que o homem rompe com todas as suas relações com o pecado de Adão, bem como com a crença de que sua filiação a Deus se dá apenas pela descendência natural.

A cruz de Cristo é a espada que corta o velho homem, nascido em Adão. Somente ao se encontrar com Cristo o homem tem sua fome e sede de justiça saciadas. Ele perde sua vida terrena, mas encontra uma nova vida em Deus — uma vida plena e abundante.

Aqueles que encontram essa nova vida em Deus são recebidos como filhos de Deus e declarados justos.

Portanto, fica evidente que, em momento algum, Jesus incentivou o abandono de nossos pais ou parentes. Pelo contrário, Ele reafirmou a importância de honrar pai e mãe, cumprindo os mandamentos de Deus, como afirmou:

“E assim invalidastes, pela vossa tradição, o mandamento de Deus.” (Mateus 15:6).

 

O que proporcionou a benesse dada a Abraão?

1 QUE diremos, pois, ter alcançado Abraão, nosso pai segundo a carne?

A pergunta do apóstolo Paulo é extremamente relevante no contexto da salvação em Cristo. Os judaizantes afirmavam que sua salvação derivava de serem descendentes diretos de Abraão segundo a carne e o sangue, o que implicaria que o próprio Abraão teria recebido algo de Deus por sua linhagem carnal — o que não corresponde à verdade.

O que Abraão obteve por meio de sua descendência? Absolutamente nada. Ele era filho de pais gentios, que também não possuíam o sinal da circuncisão. Como vemos em Gênesis:

“E viveu Terá setenta anos, e gerou a Abrão, a Naor, e a Harã. E estas são as gerações de Terá: Terá gerou a Abrão, a Naor, e a Harã; e Harã gerou a Ló. E morreu Harã estando seu pai Terá ainda vivo, na terra do seu nascimento, em Ur dos caldeus.” (Gênesis 11:26-28).

Abraão era gentil, descendente dos caldeus, uma nação semita. A bênção que ele recebeu de Deus não teve qualquer ligação com sua linhagem ou origem familiar. Ela veio somente após sua obediência em romper os laços com seus familiares, conforme a promessa divina.

Ao se incluir na narrativa como um dos filhos de Abraão segundo a carne, o apóstolo Paulo claramente identifica seu público-alvo: os cristãos convertidos do judaísmo, embora a carta seja endereçada à igreja em Roma. Esse posicionamento estratégico indica que Paulo está dialogando diretamente com aqueles que possuíam uma herança judaica e, por isso, tinham Abraão como pai comum, segundo a carne.

No versículo em questão, o termo grego σάρξ, traduzido por “carne”, refere-se à descendência física dos judeus, que se orgulhavam de sua linhagem diretamente ligada a Abraão. No entanto, ao interpretar os capítulos subsequentes, será necessário ampliar o conceito de “carne”, pois, nas epístolas paulinas, esse termo transcende a simples descendência física. Em muitos contextos, “carne” passa a simbolizar não apenas a linhagem, mas também os sistemas e práticas da doutrina judaica, como Paulo ilustra em sua epístola aos filipenses.

Por exemplo, em Filipenses 3:3-6, Paulo faz referência à “carne” ao falar de seu próprio passado como fariseu, descrevendo elementos como circuncisão, linhagem, tribo e zelo pela lei. Nesse contexto, “carne” abrange todo o conjunto de obras e rituais judaicos, que contrastam com a “fé” e/ou “espírito”, que é o evangelho de Cristo. Portanto, ao longo da carta aos Romanos, Paulo gradualmente expande o conceito de σάρξ para abranger não apenas a herança física, mas também o sistema de crenças e práticas do judaísmo, preparando o terreno para o contraste entre a lei e a graça que ele desenvolve nos capítulos seguintes.

“Porque a circuncisão somos nós, que servimos a Deus em espírito, e nos gloriamos em Jesus Cristo, e não confiamos na carne. Ainda que também podia confiar na carne; se algum outro cuida que pode confiar na carne, ainda mais eu: Circuncidado ao oitavo dia, da linhagem de Israel, da tribo de Benjamim, hebreu de hebreus; segundo a lei, fui fariseu; segundo o zelo, perseguidor da igreja; segundo a justiça que há na lei, irrepreensível.” (Filipenses 3:3-6).

Aqui, Paulo apresenta os elementos da “carne”: circuncisão, linhagem, tribo, nação, lei e religião — os pilares da fé judaica, em contraste com o “espírito”, que é o evangelho e a essência da fé cristã.

Antes de usar o termo grego σάρξ traduzido por “carne”, em Romanos 4, Paulo já o havia utilizado três vezes anteriormente:

“Acerca de seu Filho, que nasceu da descendência de Davi segundo a carne.” (Romanos 1:3)
“Porque não é judeu o que o é exteriormente, nem é circuncisão a que o é exteriormente na carne.” (Romanos 2:28)
“Por isso, nenhuma carne será justificada diante dele pelas obras da lei, porque pela lei vem o conhecimento do pecado.” (Romanos 3:20)

Nessas passagens, σάρξ assume diferentes conotações conforme o contexto: em Romanos 1:3, significa linhagem; em Romanos 2:28, refere-se ao corpo físico, especificamente ao prepúcio; e, em Romanos 3:20, denota a humanidade em geral, sem distinção entre judeus e gentios.

Portanto, quando Paulo questiona o que Abraão, o “pai” dos judeus, alcançou, ele nos leva a refletir sobre o fato de que a justificação não se deu por meio de seu corpo físico, nem decorreu de sua linhagem carnal. Se aceitássemos a ideia de que a justificação veio por intermédio da descendência carnal de Abraão, isso implicaria, de forma incoerente, que a graça da justificação teria se originado em sua família, particularmente em Terá, seu pai. No entanto, esse era o argumento sustentado por muitos judeus da época, que acreditavam serem salvos simplesmente por serem descendentes carnais de Abraão, alguém que havia recebido a promessa divina do descendente.

 

A jactância é excluída diante de Deus

2 Porque, se Abraão foi justificado pelas obras, tem de que se gloriar, mas não diante de Deus.

Essa observação do apóstolo Paulo deixa evidente que a discussão introduzida no versículo anterior tem o objetivo de refutar os principais elementos constitutivos do judaísmo, tais como a circuncisão, linhagem, tribo, nação, lei e religião — em outras palavras, as “obras” da lei. Paulo utiliza a figura de Abraão como exemplo central para ilustrar o que já havia afirmado nos versículos 27 e 28 de Romanos 3:

“Onde está logo a jactância? É excluída. Por qual lei? Das obras? Não; mas pela lei da fé. Concluímos, pois, que o homem é justificado pela fé sem as obras da lei.” (Romanos 3:27-28).

Os judeus buscavam sua justificação por meio dessas obras, mas Paulo ressalta que, se Abraão tivesse sido justificado por elas, teria motivo para se vangloriar — mas não diante de Deus.

Por que não diante de Deus? Porque os judeus buscavam a glória entre si mesmos, exaltando-se uns aos outros com base em características como circuncisão, linhagem e observância da lei. Além disso, quando convertiam um prosélito, usavam isso como uma oportunidade para se gloriarem na “carne” dos outros:

“Porque nem ainda esses mesmos que se circuncidam guardam a lei, mas querem que vos circuncideis, para se gloriarem na vossa carne.” (Gálatas 6:13)

“Porque não nos recomendamos outra vez a vós; mas damo-vos ocasião de vos gloriardes de nós, para que tenhais que responder aos que se gloriam na aparência e não no coração.” (2 Coríntios 5:12)

Se Abraão tivesse realizado algo, ou seja, obras da lei que o justificassem, ele teria motivo para gloriar-se (jactância) perante os homens — uma prática comum dos judeus em relação aos gentios. Romanos 4:1-2 é a evolução do argumento que iniciou-se em Romanos 3:27-28.

Se Abraão tivesse sido justificado pelas obras da lei, como os judeus tentavam fazer, então poderíamos afirmar que Abraão, por meio dessas obras, se tornara superior aos gentios. No entanto, Paulo já havia concluído, em Romanos 3:9, que tanto judeus quanto gentios estavam igualmente debaixo do pecado, desfazendo qualquer pretensão de superioridade judaica por meio da lei.

“Pois quê? Somos nós mais excelentes? De maneira nenhuma, pois já dantes demonstramos que, tanto judeus como gregos, todos estão debaixo do pecado;” (Romanos 3:9).

 

Abraão creu na palavra de Deus

3 Pois, que diz a Escritura? Creu Abraão em Deus, e isso lhe foi imputado como justiça.

O apóstolo Paulo, em sua argumentação, recorre à autoridade das Escrituras, citando Gênesis 15:6:

“Creu Abrão no Senhor, e isso lhe foi imputado para justiça.”

Essa citação revela que Abraão não foi justificado por obras da lei, mas por crer na promessa de Deus. Essa fé, demonstrada por Abraão, não estava baseada apenas na existência de Deus, mas na confiança plena em Suas promessas.

Crer na mera existência de Deus não justifica ninguém; a justificação decorre de crer na promessa divina, o que, por sua vez, envolve crer que Deus existe e que Ele recompensa aqueles que O buscam. É importante notar que o evangelista deve proclamar as boas novas do evangelho, que contêm a promessa de salvação, e não apenas convencer os homens da existência de Deus.

Outro ponto crucial é que a fé em Deus só é possível após a revelação divina. Antes de Deus falar com Abraão, determinando que ele saísse de sua terra e deixasse seus parentes, não havia como Abraão crer n’Ele. O máximo que poderia ocorrer seria uma crença na existência de Deus, o que, por si só, não é recompensado. Abraão foi justificado quando creu na promessa anunciada, de que sua descendência seria tão numerosa quanto as estrelas do céu (Gênesis 15:5).

Para que o homem possa crer em Deus, é essencial que lhe seja anunciada a palavra da fé, que é a firme base das coisas que se esperam e a evidência das que não se veem (Hebreus 11:1). Sem ouvir essa palavra, a fé em Deus é impossível. Como Paulo ensina:

“De sorte que a fé é pelo ouvir, e o ouvir pela palavra de Deus.” (Romanos 10:17).

A palavra de Deus precede a regeneração, justificação e santificação. Quando Paulo afirma que o crente é salvo pela fé, ele está se referindo à palavra de Deus, que é fiel e verdadeira, designada no grego como πίστις (pistis), que significa fé ou fidelidade, da qual deriva o verbo πιστεύω (pisteuo), que significa crer. Pistis gera fé, mas pisteuo (o ato de crer) sempre deriva da pistis (fé).

Cristo, por ser a fé manifesta (Gálatas 3:23), é o meio pelo qual o homem pode crer em Deus, como está escrito:

“E por ele credes em Deus, que o ressuscitou dentre os mortos e lhe deu glória, para que a vossa fé e esperança estivessem em Deus.” (1 Pedro 1:21);

“Mas, antes que a fé viesse, estávamos guardados debaixo da lei, e encerrados para aquela fé que se havia de manifestar.” (Gálatas 3:23).

A justificação vem pela palavra de Deus, mas isso implica crer na palavra da promessa. A promessa dada a Abraão, de que sua descendência seria numerosa, era aparentemente impossível, visto que Sara, sua esposa, era estéril. Da mesma forma, a promessa do evangelho parece impossível ao homem, pois ele não pode salvar a si mesmo; por isso, é necessário crer em Cristo.

Quando Deus fez a promessa a Abraão, a lei mosaica ainda não existia. Portanto, a única opção de Abraão foi crer em Deus, já que nada lhe foi ordenado para realizar. Sua justificação veio exclusivamente por sua fé na promessa divina, um exemplo claro de que a fé, e não as obras da lei, é o caminho para a justiça diante de Deus.

 

Dívida versus graça

4 Ora, àquele que faz qualquer obra não lhe é imputado o galardão segundo a graça, mas segundo a dívida. 5 Mas, àquele que não pratica, mas crê naquele que justifica o ímpio, a sua fé lhe é imputada como justiça.

O apóstolo Paulo destaca que qualquer pessoa que se vangloria por realizar obras baseadas na lei, espera que Deus se torne seu devedor, tornando a recompensa algo merecido, e não um presente da graça divina. Se a justificação fosse segundo o que os judaizantes pregavam, Deus teria uma dívida para com Abraão, e Abraão, em vez de ser considerado um servo (ou amigo de Deus), assumiria o papel de alguém que presta serviços em troca de pagamento.

Essa é a altivez do homem: recusar-se a submeter ao senhorio de Deus, que é generoso e concede galardões não como dívida, mas segundo a Sua graça. A Escritura nos alerta sobre a arrogância:

“Abominação é ao SENHOR todo o altivo de coração; não ficará impune mesmo de mãos postas.” (Provérbios 16:5).

E todo altivo é maldito:

“Assim diz o SENHOR: Maldito o homem que confia no homem, e faz da carne o seu braço, e aparta o seu coração do SENHOR!” (Jeremias 17:5).

Em contrapartida, aquele que não pratica as obras da lei (como foi o caso de Abraão), mas crê em Deus, que tem o poder de justificar o ímpio, verá sua fé imputada como justiça. Paulo utiliza uma linguagem evangelística aqui, que não segue os rigorosos termos da teologia.

Na evangelização, expressões como “Deus salva o pecador” ou “Deus justifica o ímpio” são válidas, pois o objetivo é transmitir a mensagem de salvação de maneira simples e compreensível. Entretanto, quando analisamos esses termos à luz da teologia, surgem questões mais profundas, como: “Como um Deus justo pode justificar o ímpio? Deus abriria mão de Sua justiça?”

A resposta está no próprio caráter de Deus, como revelado em Êxodo 34:7:

“Que guarda a beneficência em milhares; que perdoa a iniquidade, e a transgressão e o pecado; que ao culpado não tem por inocente; que visita a iniquidade dos pais sobre os filhos e sobre os filhos dos filhos até à terceira e quarta geração.”

Deus é o justificador, aquele que perdoa iniquidades, transgressões e pecados, mas também é justo e não tem o culpado por inocente. Como conciliar então a afirmação de que Deus justifica o ímpio?

Quando Paulo diz que Deus justifica o ímpio, ele se refere àquele que, ao crer, já não é mais ímpio. Teologicamente, quem não crê permanece na condição de ímpio, mas aquele que crê é considerado justo. A fé transforma o ímpio em justo, permitindo que Deus o declare justo. Assim, a linguagem evangelística de que “Deus justifica o ímpio” é verdadeira, mas teologicamente, sabemos que Deus não justificará aquele que persiste na impiedade.

Da mesma forma, o pecador que crê deixa de ser escravo do pecado e se torna servo da justiça. Teologicamente, o “velho homem” (o pecador) é crucificado com Cristo, e o “novo homem” (o justo) surge na ressurreição. Embora seja correto dizer evangelisticamente que Deus salva o pecador, teologicamente, é impossível afirmar que Deus salva aquele que ainda é servo do pecado, ou o “velho homem”, que permanece sob a escravidão do pecado.

Essa aparente contradição entre as linguagens evangelística e teológica se resolve quando entendemos que o pecador que crê morre para o pecado ao ser sepultado com Cristo e nasce de novo, como uma nova criatura. O ímpio deixa sua impiedade na sepultura, e Deus o declara justo diante d’Ele. Portanto, quando Paulo diz que “Deus justifica o ímpio”, esse ímpio primeiramente crê em Deus, e sua fé é imputada como justiça. O ex-ímpio se torna justo por meio do evangelho, sendo recriado em verdadeira justiça e santidade.

Em suma, a linguagem evangelística destaca a oferta de salvação a todos, incluindo os ímpios, enquanto a linguagem teológica ressalta o processo pelo qual o ímpio se transforma em justo, através da fé em Cristo, a fim de ser justificado por Deus.

Romanos 4 – A Promessa Firme a Toda a Posteridade

Claudio Crispim

É articulista do Portal Estudo Bíblico (https://estudobiblico.org), com mais de 360 artigos publicados e distribuídos gratuitamente na web. Nasceu em Mato Grosso do Sul, Nova Andradina, Brasil, em 1973. Aos 2 anos de idade sua família mudou-se para São Paulo, onde vive até hoje. O pai, ‘in memória’, exerceu o oficio de motorista coletivo e, a mãe, é comerciante, sendo ambos evangélicos. Cursou o Bacharelado em Ciências Policiais de Segurança e Ordem Pública na Academia de Policia Militar do Barro Branco, se formando em 2003, e, atualmente, exerce é Capitão da Policia Militar do Estado de São Paulo. Casado com a Sra. Jussara, e pai de dois filhos: Larissa e Vinícius.

One thought on “Romanos 4 – Promessa firme à posteridade

  • Estou aprendendo muito com os artigos. Que Deus te abençoe amado irmão e que a Glória do Senhor transborde cada vez mais.

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