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É Deus quem chamou a descendência de Abraão ao prometer: ’em ti serão benditas todas as famílias da terra’. É Deus quem providenciou linhagem a Abraão ao dizer: ‘Por este tempo virei, e Sara terá um filho’. E foi Deus que disse: ‘O maior servirá o menor’, com relação a eleição da linhagem de Jacó, em virtude da primogenitura adquirida, sendo rejeitada a linhagem de Esaú.


A eleição em Esaú e Jacó

“Porque, não tendo eles ainda nascido, nem tendo feito bem ou mal (para que o propósito de Deus, segundo a eleição, ficasse firme, não por causa das obras, mas por aquele que chama), foi-lhe dito a ela: O maior servirá o menor.” (Romanos 9:11-12).

Introdução

A passagem bíblica de Romanos 9, versos 11 e 12, é um dos textos mais utilizados pelos calvinistas para defender a ideia da eleição e da predestinação para salvação.

A dedução equivocada dos calvinistas decorre de má leitura do texto, pois não consideram no contexto a citação que o apóstolo Paulo fez da promessa à Rebeca que consta no Livro do Gênesis.

Vale destacar que, os livros e epístolas que compõe a Bíblia, ao serem escritos, não possuíam divisões e subdivisões em capítulos e versículos. Quando foram redigidos, também não haviam nos textos títulos, subtítulos, elementos temáticos e subdivisões, e outros, que foram introduzidos muito tempo depois com objetivo único de facilitar a localização e citação de determinadas passagens.

Ao redigir a carta aos Romanos, o apóstolo Paulo desenvolveu o texto com apresentação, saudação, introdução, desenvolvimento e conclusão, de modo que, para compreender a epístola, se faz necessário considerar todo o texto, inclusive as citações do Antigo Testamento e o seu contexto.

Por que a necessidade de fazer esse alerta? Para não incorrermos no seguinte equívoco:

“Essas pessoas, numa tentativa tola de se livrarem da dificuldade do texto, tentam dizer que o texto se refere aos filhos de Jacó e o povo de Esaú, aos filhos de Israel e aos filhos de Edom. A própria Bíblia mostra que isso não é correto. Romanos, capítulo 9, versículo 11-12 dizem: “Porque, não tendo eles ainda nascido, nem tendo feito bem ou mal para que o propósito de Deus, segundo a eleição, ficasse firme… o maior servirá o menor”. Este versículo refere-se a Jacó e Esaú. Ele não refere às nações de Israel e Edom. O texto significa justamente o que diz: “Amei Jacó, e odiei Esaú”. Não devemos tentar alterar a Palavra de Deus.” Spurgeon, Charles H., Jacó e Esaú, Trecho extraído do livro “Sermões Sobre a Salvação”, Editora PES, p.p. 74-82.

 

O maior servirá o menor

Quando disse a Rebeca: – ‘O maior servirá o menor’, Deus não estava tratando de indivíduos, e sim, de duas nações!

“E o SENHOR lhe disse: Duas nações há no teu ventre, e dois povos se dividirão das tuas entranhas, e um povo será mais forte do que o outro povo, e o maior servirá ao menor.” (Gênesis 25:23).

Estava sendo gerado dois povos no ventre de Rebeca: os edomitas e os israelitas, povos descendentes de Esaú e Jacó, respectivamente. Quando Isaque abençoou Jacó e Esaú, abençoou ambos no tocante a eventos futuros, e não, com relação às questões no momento presente de ambos.

“Pela fé Isaque abençoou Jacó e Esaú, no tocante às coisas futuras.” (Hebreus 11:20).

Enquanto viveu, Jacó temia Esaú, tanto que fugiu do seu irmão para Harã (Gênesis 27:41-44), e, ao retornar, Jacó se postou como servo para abrandar a ira do seu irmão, Esaú (Gênesis 32:4 e 33:3).

A bênção herdada por Jacó não fez com que o seu irmão, Esaú, se submetesse subserviente a Jacó. A história de ambos evidencia que a benção herdada por Jacó tinha em vista eventos futuro.

Isto posto, fica evidente que a promessa citada pelo apóstolo Paulo tinha em vista nações, tanto que, quando os filhos de Israel desdenharam a declaração de Deus, dizendo: – ‘Em que nos tem amado?’, Deus apresenta a prova do seu amor, dizendo:

‘Não era Esaú irmão de Jacó? Todavia amei a Jacó, E odiei a Esaú.’ (Malaquias 1:2-3).

É imprescindível para um entendimento correto do texto considerar que a citação do apóstolo Paulo respeita o contexto do Livro do Gênesis. Se a promessa envolvia duas nações, a citação da promessa no texto da epístola aos Romanos, verso 9, não trata especificamente dos dois irmãos, e sim, da origem e do passado da nação eleita para trazer e abrigar o Cristo no mundo.

“E dize: Assim diz o Senhor DEUS a Jerusalém: A tua origem e o teu nascimento procedem da terra dos cananeus. Teu pai era amorreu, e tua mãe hetéia.” (Ezequiel 16:3).

Quando o apóstolo cita um verso ou trecho de um verso do Antigo Testamento, é necessário considerar o texto e o contexto citado. Mesmo sendo minúscula a citação, ela remete ao texto do Antigo Testamento por completo.

Durante a gestação, Rebeca questionou: se uma gestação era daquela forma  ou, se a gestação dela era diferente das demais mulheres por causa dela mesma, visto que a agitação no seu ventre era grande.

Deus fez referência à gestação de Rebeca como sendo duas nações no ventre, e que os dois povos se dividiriam, e um povo haveria de ser mais forte que o outro, de modo que o maior (mais forte), serviria ao menor (mais fraco).

A referência: “… e o maior servirá ao menor.”, refere-se aos povos que haveriam de se dividir, sendo um mais forte e, o outro, mais fraco.

Mas, a leitura que os calvinistas fazem, é que se trata do filho mais velho (Esaú) servindo ao mais jovem (Jacó), o quem é inconcebível, já que Esaú e Jacó eram gêmeos. Como eram gêmeos, não há que se falar em mais velho ou mais moço, até porque não houve interrupção no parto.

Quando Deus enfatiza que amou Jacó e desprezou Esaú através do profeta Malaquias, a questão em voga não era os gêmeos, e sim, a nação de Israel. Os filhos de Israel questionavam no que Deus os teria amado, daí a resposta, evidenciando que os Edomitas não foram amados, e sim, os filhos de Israel.

“Eu vos tenho amado, diz o Senhor. Mas vós dizeis: Em que nos tens amado? Não era Esaú irmão de Jacó? disse o Senhor; todavia amei a Jacó, e odiei a Esaú; e fiz dos seus montes uma desolação, e dei a sua herança aos chacais do deserto.” (Malaquias 1:2-3).

O expresso em Malaquias está em consonância ao exposto pelo escritor aos Hebreus, de que Esaú e Jacó foram abençoados com relação a eventos futuras (Hebreus 11:20).

 

O direito de primogenitura

“E cumprindo-se os seus dias para dar à luz, eis gêmeos no seu ventre. E saiu o primeiro ruivo e todo como um vestido de pêlo; por isso chamaram o seu nome Esaú. E depois saiu o seu irmão, agarrada sua mão ao calcanhar de Esaú; por isso se chamou o seu nome Jacó. E era Isaque da idade de sessenta anos quando os gerou.” (Gênesis 25:24-26).

O escritor do Livro de Gênesis deixou registrado o evento do parto de Esaú e Jacó por ser relevante para o nascimento de Jesus. Vale destacar que o escritor do Gênesis não aponta Esaú como primogênito, mas como o primeiro a sair da madre.

Ora, a primeira criança a sair do ventre de Rebeca deveria ser o primogênito de Isaque, mas a criança que saiu por último, saiu com a mão grudada no calcanhar da que saiu primeiro, e a história ganhou um novo contorno.

Quando uma criança nasce, se for a primeira a abrir a madre, será o primogênito. Mas, no caso de Esaú e Jacó, essa questão não foi definida no parto, pois não houve interrupção do parto entre o nascimento de uma criança e outra. Embora Esaú tenha saído primeiro, a questão da primogenitura, que envolvia direitos de berço, não estava definida.

Por exemplo: Ismael foi o único filho segundo a carne de Abraão, antes da morte de Sara, e, Isaque, o único filho segundo a promessa. Depois que Sara morreu, Abraão teve mais filhos segundo a carne (Gêneses 25:1). Entre Ismael e Isaque, foi Sara que estabeleceu quem teria direito a herança:

“E disse a Abraão: Ponha fora esta serva e o seu filho; porque o filho desta serva não herdará com Isaque, meu filho.” (Gênesis 21:10).

Embora Ismael fosse descendência de Abraão e, por isso mesmo, acabou sendo abençoado e tornou-se uma grande nação, somente a nação de Israel é contada como descendência de Abraão e é chamada de israelita (Gênesis 21:10-13).

Outra questão a ser analisada no texto é o direito de primogenitura, um direito estabelecido, à época, que conferia ao filho mais velho certas prerrogativas com relação a herança e precedência sobre os filhos mais novos.

“E assentaram-se diante dele, o primogênito segundo a sua primogenitura, e o menor segundo a sua menoridade; do que os homens se maravilhavam entre si.” (Gênesis 43:33).

A lei mosaica, muito depois do patriarca Isaque, disciplinou a questão do direito de primogenitura, nos seguintes termos:

“Quando um homem tiver duas mulheres, uma a quem ama e outra a quem despreza, e a amada e a desprezada lhe derem filhos, e o filho primogênito for da desprezada, será que, no dia em que fizer herdar a seus filhos o que tiver, não poderá dar a primogenitura ao filho da amada, preferindo-o ao filho da desprezada, que é o primogênito. Mas ao filho da desprezada reconhecerá por primogênito, dando-lhe dobrada porção de tudo quanto tiver; porquanto aquele é o princípio da sua força, o direito da primogenitura é dele.” (Deuteronômio 21:15-17).

O direito de primogenitura estava estabelecido muito antes de Esaú e Jacó virem ao mundo, e Deus não transtorna o que é de direito. Como a bênção era do primogênito, Deus não transtornaria o direito de um para beneficiar o outro.

Como no nascimento de Esaú e Jacó não houve interrupção do parto e somente foram separados após o nascimento de ambos, visto que a mão de Jacó estava ligada ao calcanhar de Esaú, o direito de primogenitura não foi determinado naturalmente.

Somente neste caso coube a negociação entre Esaú e Jacó sobre o direito de primogenitura. Percebe-se pela leitura da história de Esaú e Jacó que este sempre esteve atento à questão, enquanto aquele, achava ser uma questão de somenos importância.

Vale destacar que a negociação entre Esaú e Jacó se deu quando adultos, homens formados, portanto, plenamente cônscios de seus direitos e deveres. E essa foi a negociação:

“E Jacó cozera um guisado; e veio Esaú do campo, e estava ele cansado; E disse Esaú a Jacó: Deixa-me, peço-te, comer desse guisado vermelho, porque estou cansado. Por isso se chamou Edom. Então disse Jacó: Vende-me hoje a tua primogenitura. E disse Esaú: Eis que estou a ponto de morrer; para que me servirá a primogenitura? Então disse Jacó: Jura-me hoje. E jurou-lhe e vendeu a sua primogenitura a Jacó. E Jacó deu pão a Esaú e o guisado de lentilhas; e ele comeu, e bebeu, e levantou-se, e saiu. Assim desprezou Esaú a sua primogenitura.” (Gênesis 25:29-34).

Como só é possível a existência de um primogênito em uma família, depois de selado o negócio entre ambos com juramento, o acordado entre ambos não poderia ser desfeito. Mesmo se arrependendo e buscando com lágrimas direito que abriu mão, Esaú não conseguiu reaver o seu direito.

“E ninguém seja devasso, ou profano, como Esaú, que por uma refeição vendeu o seu direito de primogenitura. Porque bem sabeis que, querendo ele ainda depois herdar a bênção, foi rejeitado, porque não achou lugar de arrependimento, ainda que com lágrimas o buscou.” (Hebreus 12:17).

Esaú é nomeado devasso (πόρνος) e profano (βέβηλος) pelo fato de abrir mão (ἀποδιδομι) do seu direito que lhe conferia bênçãos futura somente para satisfazer uma necessidade no tempo presente.

Observe que, para ser considerado devasso ou profano, o individuo não precisa viver uma vida transviada. Esaú somente fez um negócio que, do ponto de vista humano, foi legítimo, pois abriu mão de um direito que era seu e, por isso, diante de Deus foi devasso e profano.

Em nossos dias, muitos entendem que ser devasso ou profano decorre de questões de ordem moral ou religiosa. Entretanto, a ação de Esaú evidencia que abrir mão de dádivas divina, como o reino futuro que não pode ser abalado, negligenciando a graça revelada no evangelho, é o mesmo que devassidão e profanação.

 

Por que o apóstolo Paulo utilizou Esaú e Jacó para falar de eleição?

Algumas peculiaridades do texto de Romanos auxiliam entender o motivo de Esaú e Jacó serem citados pelo apóstolo Paulo para ilustrar a doutrina da eleição.

Antes de abordar as questões envolvendo a nação de Israel no capítulo 9, o apóstolo Paulo fez no capítulo 8, um contraponto entre a lei e o evangelho, a carne e o espírito. O erro de leitura do capítulo 9, geralmente decorre de má leitura do capítulo 8, em especial, a má leitura que se faz do que é ‘carne’, e o que é ‘espírito’. A leitura que muitos fazem do que é ‘carne’ e ‘espírito’, geralmente, é enviesada e dá contornos ao termo que não é o que foi sublinhado pelo apóstolo Paulo.

Ao concluir: “Portanto, agora nenhuma condenação há para os que estão em Cristo Jesus, que não andam segundo a carne, mas segundo o Espírito.” (Romanos 8:1), o apóstolo Paulo define que a nova criatura, por estar em Cristo, é isenta de toda e qualquer condenação, e apresenta o motivo: porque anda segundo o espírito, ou seja, o evangelho que é poder de Deus para salvação.

Com essa conclusão, o apóstolo pontua que aqueles que anda segundo a carne, ou seja, que seguem mandamentos de homens que por tradição receberam, os judaizantes, ainda pesa sobre eles toda condenação.

O que é evidenciado pelo apóstolo através dos termos ‘espírito’ e ‘carne’ é o antagonismo entre o evangelho e a lei. Por que o apóstolo faz essa conclusão? Para evidenciar aos cristãos em Roma que eles não deviam nada a circuncisão (Gálatas 2:6), de modo que devessem se sujeitar a qualquer ordenança humana (carne), pois se seguissem qualquer das ordenanças do judaísmo, certamente morreriam.

De outra banda, quando se mata a função do corpo por intermédio do evangelho, vez que, aqueles que estão em Cristo crucificam o velho homem para que o corpo do pecado seja desfeito, a pessoa viverá (Romanos 6:6; 8:10). Os que vivem por meio do evangelho não devem nada à doutrina dos homens, pois como são guiados pelo evangelho são filhos de Deus (Gálatas 3:29).

“De maneira que, irmãos, somos devedores, não à carne para viver segundo a carne. Porque, se viverdes segundo a carne, morrereis; mas, se pelo Espírito mortificardes as obras do corpo, vivereis. Porque todos os que são guiados pelo Espírito de Deus esses são filhos de Deus.” (Romanos 8:12-14).

Após evidenciar a inutilidade da lei para salvação, o apóstolo destaca que os cristãos são salvos em esperança (Romanos 8:24), e que foram chamados ao propósito de Deus (Romanos 8:28), o que leva a seção seguinte: a tristeza e continua dor do apóstolo dos gentios pelos seus parentes segundo a carne, os judeus (Romanos 9:1-3).

O apóstolo especifica tudo o que é próprio à nação de Israel segundo o prometido a Abraão e a casa de Davi:

“Que são israelitas, dos quais é a adoção de filhos, e a glória, e as alianças, e a lei, e o culto, e as promessas; dos quais são os pais, e dos quais é Cristo segundo a carne, o qual é sobre todos, Deus bendito eternamente. Amém.” (Romanos 9:4-5).

Embora o elencado acima seja pertinente à nação de Israel, não significa ser pertencente à nação é o mesmo que ser israelita. De igual modo, não é porque se é descendência de Abraão, que será contado como filho de Abraão. E o apóstolo deixa claro: o problema não decorre da palavra de Deus, como se ela tivesse falhado!

“Não que a palavra de Deus haja faltado, porque nem todos os que são de Israel são israelitas; Nem por serem descendência de Abraão são todos filhos; mas: Em Isaque será chamada a tua descendência. Isto é, não são os filhos da carne que são filhos de Deus, mas os filhos da promessa são contados como descendência.” (Romanos 9:6-8).

Por que o apóstolo Paulo teve que destacar essas questões? Porque os judaizantes utilização o fato de serem israelitas e descendentes da carne de Abraão para se posicionarem como mestres e transtornarem a verdade do evangelho impondo aos cristãos a necessidade de andarem segundo a carne, ou seja, seguindo mandamentos de homens que faziam da carne de Abraão o seu braço.

“Dize-lhes pois: Assim diz o SENHOR Deus de Israel: Maldito o homem que não escutar as palavras desta aliança,” (Jeremias 11:3).

Os judaizantes se diziam filhos de Abraão, ou seja, salvos, por descenderem da carne de Abraão, Isaque e Jacó, e através de genealogias queriam encerrar qualquer questão. O apóstolo Paulo invoca a autoridade das Escrituras e demonstra que ‘em Isaque seria chamada a descendência de Abraão’ e, não como liam os judeus, que os filhos de Isaque seriam a descendência de Abraão.

“Ora, as promessas foram feitas a Abraão e à sua descendência. Não diz: E às descendências, como falando de muitas, mas como de uma só: E à tua descendência, que é Cristo.” (Gálatas 3:16).

No verso 7, ao citar a parte final de Gênesis 21:12, que diz: “Porém Deus disse a Abraão: Não te pareça mal aos teus olhos acerca do moço e acerca da tua serva; em tudo o que Sara te diz, ouve a sua voz; porque em Isaque será chamada a tua descendência.”, o apóstolo Paulo introduz o tema eleição, quando aponta como o povo de Israel foi escolhido para trazer o Cristo ao mundo, e no versículo 9 apresenta a promessa:

“Porque a palavra da promessa é esta: Por este tempo virei, e Sara terá um filho.” (v. 9);

“Haveria coisa alguma difícil ao Senhor? Ao tempo determinado tornarei a ti por este tempo da vida, e Sara terá um filho.” (Gênesis 18:14).

Primeiro veio a palavra da promessa (Gênesis 18:14), depois foi estabelecido o parâmetro da eleição: a descendência (Gênesis 21:12; Gálatas 3:16). A descendência prometida a Abraão é o parâmetro estabelecido por Deus para eleição de Israel e, por isso mesmo, houve outra promessa anunciada a Rebeca: ‘O maior servirá ao menor.’!

Observe que quando o apóstolo Paulo confessa a sua profunda tristeza e continua dor, a questão destacada é a descendência de Abraão, e um dos parâmetros pela qual uma descendência é construída, além do sangue, é a primogenitura.

Os judaizantes se apoiavam na promessa que dizia: ‘em Isaque será chamada a tua descendência’ para se dizerem filhos de Abraão. O apóstolo Paulo, por sua vez, destaca que a promessa não foi somente com relação ao nascimento de Isaque, mas também com relação a gestação de Esaú e Jacó, quando foi dito: ‘O maior servirá ao menor.’, evidenciando que a descendência de Abraão, além do sangue, foi definida pela primogenitura, como está escrito: ‘Amei a Jacó, e odiei a Esaú.’.

Por que Deus disse: ‘Amei a Jacó, e odiei a Esaú’? Porque os próprios filhos de Israel questionavam a Deus que havia anunciado que os amava.

“Eu vos tenho amado, diz o SENHOR. Mas vós dizeis: Em que nos tem amado?” (Malaquias 1:2).

A resposta divina é acompanhada de prova: “Não era Esaú irmão de Jacó?”. Será que não consideravam que Esaú era descendente da carne de Abraão, todavia, como era direito de Jacó a primogenitura, Deus honrou o que era de direito, e por isso é dito:

“… todavia amei a Jacó, e odiei a Esaú; e fiz dos seus montes uma desolação, e dei a sua herança aos chacais do deserto. Ainda que Edom diga: Empobrecidos estamos, porém tornaremos a edificar os lugares desolados; assim diz o SENHOR dos Exércitos: Eles edificarão, e eu destruirei; e lhes chamarão: Termo de impiedade, e povo contra quem o SENHOR está irado para sempre. E os vossos olhos o verão, e direis: O SENHOR seja engrandecido além dos termos de Israel.” (Malaquias 1:2-5).

O apóstolo Paulo utiliza Esaú e Jacó para evidenciar que Deus não torce o direito! Que o amor e a misericórdia de Deus não transtornam o que está estabelecido e nem a sua palavra volta atrás.

 

O amor e a misericórdia de Deus

“Porquanto o SENHOR teu Deus é Deus misericordioso, e não te desamparará, nem te destruirá, nem se esquecerá da aliança que jurou a teus pais.” (Deuteronômio 4:31).

Pouco se compreende acerca da misericórdia e do amor de Deus, e só conseguiremos compreender a dimensão da misericórdia e do amor por intermédio das Escrituras.

Há uma promessa estabelecida sobre Israel que impede a sua destruição e desamparo, expressão da misericórdia de Deus que decorre da aliança feita com Abraão, Isaque e Jacó.

Sobre as misericórdias que decorrem da aliança feita com os pais é dito que ela se renova a cada manhã, pois grande é a fidelidade de Deus, e por isso, o povo de Israel jamais será consumido. Essa misericórdia inesgotável se estende sobre a descendência de Abraão como povo e nação de geração a geração, e não, sobre indivíduos, pois tem por base uma aliança perpétua.

“As misericórdias do SENHOR são a causa de não sermos consumidos, porque as suas misericórdias não têm fim; Novas são cada manhã; grande é a tua fidelidade.” (Lamentações 3:22-23).

A fidelidade de Deus é grande, pois tem em vista a palavra anunciada a Abraão, de modo que a misericórdia sobre o seu por se renova a cada manhã e esse é o segredo de não terem sido consumidos.

E qual é a misericórdia que se destina a indivíduos? A expressa por Deus nos dez mandamentos:

“E faço misericórdia a milhares dos que me amam e aos que guardam os meus mandamentos.” (Êxodo 20:6).

A misericórdia que se destina a indivíduos está condicionada em amor a Deus, que consiste em guardar os seus mandamentos. Sem obediência ao que Deus determina não haverá misericórdia, pois só ama a Deus aquele que guarda os seus mandamentos.

“Aquele que tem os meus mandamentos e os guarda esse é o que me ama.” (João 14:21).

Diferente da misericórdia que protege Israel, temos a misericórdia que se destina ao indivíduo:

“Portanto, tudo sofro por amor dos escolhidos, para que também eles alcancem a salvação que está em Cristo Jesus com glória eterna. Palavra fiel é esta: que, se morrermos com ele, também com ele viveremos; Se sofrermos, também com ele reinaremos; se o negarmos, também ele nos negará; Se formos infiéis, ele permanece fiel; não pode negar-se a si mesmo.” (2 Timóteo 2:10-13).

A salvação está em Cristo e, por isso, o cristão de permanecer firme no evangelho, pois se alguém negar a Cristo, Ele também o negará, pois Ele permanece fiel à sua palavra, ou seja, não pode negar-se a si mesmo.

Quando o povo de Israel reclamou com Deus dizendo: “Em que nos tem amado?”, é porque consideravam que Deus os havia abandonado por causa do exílio na Babilônia e as dificuldade decorrentes ao voltarem para Jerusalém. Não atinavam que, justamente em função da misericórdia e da fidelidade de Deus, o povo de Israel não havia sido completamente destruído.

O povo de Israel foi deportado porque não obedeceram a Deus desde que foram resgatados do Egito, e por isso, muitos da nação pereceram, pois, a misericórdia de Deus que se estende a indivíduos está condicionada a amar a Deus, obedecendo-O.

Desde o profeta Moisés, Deus dizia: ‘Eu vos tenho amado!’, como se lê:

“E, porquanto amou teus pais, e escolheu a sua descendência depois deles, te tirou do Egito diante de si, com a sua grande força,” (Deuteronômio 4:37);

“Porque povo santo és ao SENHOR teu Deus; o SENHOR teu Deus te escolheu, para que lhe fosses o seu povo especial, de todos os povos que há sobre a terra. O SENHOR não tomou prazer em vós, nem vos escolheu, porque a vossa multidão era mais do que a de todos os outros povos, pois vós éreis menos em número do que todos os povos; Mas, porque o SENHOR vos amava, e para guardar o juramento que fizera a vossos pais, o SENHOR vos tirou com mão forte e vos resgatou da casa da servidão, da mão de Faraó, rei do Egito. Saberás, pois, que o SENHOR teu Deus, ele é Deus, o Deus fiel, que guarda a aliança e a misericórdia até mil gerações aos que o amam e guardam os seus mandamentos.” (Deuteronômio 7:6-9).

O amor de Deus deveria ser mensurado pelos filhos de Israel em função da preservação da nação, a pesar de serem rebeldes (Isaías 1:9). Deus amou os pais e escolheu a descendência depois deles, e não Esaú ou Jacó, em particular. Agora, como o Senhor os amava em função dos pais e para guardar o juramento que foi feito, em função do direito de primogenitura, a descendência depois de Jacó a ser a escolhida.

Deus não tinha preferência entre Jacó e Esaú, como era o caso de Isaque e Rebeca. Esaú era amado por Isaque, porque Isaque gostava de caça e Esaú era perito em caça. Já Rebeca, amava Jacó, pois ele era simples e habitava em tendas.

“E amava Isaque a Esaú, porque a caça era de seu gosto, mas Rebeca amava a Jacó.” (Gênesis 25:28).

Mas, a bênção foi dada a Jacó porque Deus tinha preferência por Jacó? Não! A benção foi dada a Jacó porque ele detinha o direito de primogenitura. Como Esaú saiu primeiro do ventre, detinha o direito de primogenitura, mas, desprezou o direito por considerar que era algo sem valor. Embora ouvisse os seus pais falarem dos bens futuros, a promessa feita a Abraão e Isaque, teve sua vida por mais preciosa.

“E disse Esaú: Eis que estou a ponto de morrer; para que me servirá a primogenitura? (…) E Jacó deu pão a Esaú e o guisado de lentilhas; e ele comeu, e bebeu, e levantou-se, e saiu. Assim desprezou Esaú a sua primogenitura.” (Gênesis 25:32 e 34).

Temos aqui um alerta! Muitos cristãos acham que abrir mão da herança futura só ocorre em questões reprováveis segundo a moral humana, entretanto, a história de Esaú evidencia que a falta de confiança na palavra de Deus em relação aos bens futuros se dá em questões do dia a dia, como se assentar e comer pão e um guisado.

Muitos cristãos desconhecem o que recebeu ao crer que Jesus é o Cristo, e não retem a verdade do evangelho tal qual foi anunciado por Jesus e os apóstolos.

“Por isso, tendo recebido um reino que não pode ser abalado, retenhamos a graça, pela qual sirvamos a Deus agradavelmente, com reverência e piedade;” (Hebreus 12:28).

Com sua atitude, Esaú não honrou a Deus, por isso não foi honrado por Deus!

“Portanto, diz o SENHOR Deus de Israel: Na verdade tinha falado eu que a tua casa e a casa de teu pai andariam diante de mim perpetuamente; porém agora diz o SENHOR: Longe de mim tal coisa, porque aos que me honram honrarei, porém os que me desprezam serão desprezados.” (1 Samuel 2:30).

Eli foi devasso e profano da mesma forma que Esaú, e apesar de ter uma promessa sobre a sua linhagem, tal promessa foi revogada. Semelhantemente, Saul tinha uma promessa acerca do reino de Israel, mas, por ser devasso e profano, não obedeceu a ordem divina a pretexto de oferecer sacrifício (1 Samuel 15:22).

Observe que assim como a misericórdia de Deus sobre Israel é infinita, o amor de Deus revelado em Cristo é inesgotável e alcança todas as famílias da terra. Quando é dito: “Deus amou o mundo de tal maneira que Deus o Seu Filho…” (João 3:16), o amor decorre da promessa anunciada a Abraão: “Em ti serão benditas todas as famílias da terra.”.

“Ora, tendo a Escritura previsto que Deus havia de justificar pela fé os gentios, anunciou primeiro o evangelho a Abraão, dizendo: Todas as nações serão benditas em ti.” (Gálatas 3:8).

Mas, qualquer que queira estar abrigado sob o amor de Deus manifesto em Cristo, deve se sujeitar ao mandamento de Deus, que é crer em Cristo como o enviado de Deus como salvador do mundo. Sem obedecer ao mandamento de Deus, que é se sujeitar a Ele como servo fazendo a sua obra, o indivíduo não será amado por Deus.

“Jesus respondeu, e disse-lhes: A obra de Deus é esta: Que creiais naquele que ele enviou.” (João 6:29);

“E, sendo ele consumado, veio a ser a causa da eterna salvação para todos os que lhe obedecem;” (Hebreus 5:9).

A atitude de Jacó em buscar a primogenitura é equivalente a atitude de Tamar, uma estrangeira, que ao buscar descendência para seu marido morto, Er, filho de Judá, não teve a sua vida e reputação por preciosa, pois considerou os bens futuros, segundo o que soube acerca do prometido a Abraão, Isaque e Jacó (Israel).

Rúben, pelo seu erro, apesar de ser o primogênito, foi preterido quanto a promessa (Gênesis 49:3-4).  Simeão e Levi, por causa da violência, também foram preteridos (Gênesis 49:4-5). Judá, o quarto filho de Jacó (Israel), recebeu a bênção que seria do primogênito, e a descendência de Judá firmou-se porque Tamar soube edificar a sua casa, e, assim, passou a figurar na linhagem de Cristo.

“Judá, a ti te louvarão os teus irmãos; a tua mão será sobre o pescoço de teus inimigos; os filhos de teu pai a ti se inclinarão. Judá é um leãozinho, da presa subiste, filho meu; encurva-se, e deita-se como um leão, e como um leão velho; quem o despertará? O cetro não se arredará de Judá, nem o legislador dentre seus pés, até que venha Siló; e a ele se congregarão os povos. Ele amarrará o seu jumentinho à vide, e o filho da sua jumenta à cepa mais excelente; ele lavará a sua roupa no vinho, e a sua capa em sangue de uvas. Os olhos serão vermelhos de vinho, e os dentes brancos de leite.” (Gênesis 49:8-12).

Ao analisar a exposição paulina, percebe-se que o que está em voga é a eleição e preservação da nação de Israel tendo em vista o prometido a Abraão, Isaque e Jacó. A eleição não teve por base Esaú e Jacó, pois não haviam nascido e nem feito bem ou mal, quando foi dito a Rebeca a palavra da promessa.

E por que foi dito: ‘O maior servirá o menor.’? Para que o propósito de Deus, segundo a eleição, ficasse firme, não por causa das obras, mas por aquele que chama. Qual o propósito segundo a eleição? A vinda do descendente prometido a Abraão para que n’Ele fosse benditas todas as famílias da terra.

A promessa de fazer de Abraão uma grande nação e de fazer todas as famílias da terra benditas foi condicionada à obediência de Abraão:

“ORA, o SENHOR disse a Abrão: Sai-te da tua terra, da tua parentela e da casa de teu pai, para a terra que eu te mostrarei. E far-te-ei uma grande nação, e abençoar-te-ei e engrandecerei o teu nome; e tu serás uma bênção. E abençoarei os que te abençoarem, e amaldiçoarei os que te amaldiçoarem; e em ti serão benditas todas as famílias da terra.” (Gênesis 12:1-3).

Como Abraão obedeceu (Gênesis 26:5), cumpre-se a palavra que diz:

“Mas, porque o SENHOR vos amava, e para guardar o juramento que fizera a vossos pais, o SENHOR vos tirou com mão forte e vos resgatou da casa da servidão, da mão de Faraó, rei do Egito. Saberás, pois, que o SENHOR teu Deus, ele é Deus, o Deus fiel, que guarda a aliança e a misericórdia até mil gerações aos que o amam e guardam os seus mandamentos. (Deuteronômio 7:8-9).

Quando Abraão amou a Deus guardando os seus mandamentos, a aliança foi selada, e não há quem possa invalidar a promessa de Deus. Como Abraão obedeceu aos mandamentos, a misericórdia de Deus se renova a cada manhã sobre os filhos de Israel, como resultado da fidelidade de Deus.

Há injustiça em Deus ao amar Jacó, e desprezar Esaú? De maneira alguma, pois Deus honra os que O honra. Esaú desprezou a primogenitura, e foi desprezado. Jacó buscou a primogenitura e foi honrado com a bênção em relação aos bens futuros.

Ao comprar o direito de primogenitura e enganar Isaque no momento da bênção, Jacó não teve a sua vida por preciosa, visto que teria de enfrentar a ira do seu irmão. Jacó comprou o direito de primogenitura e buscou a bênção que lhe era de direito, de modo que não houve injustiça em Deus, como foi dito a Moisés:

“Compadecer-me-ei de quem me compadecer, e terei misericórdia de quem eu tiver misericórdia.” (Romanos 9:15; Êxodo 33:19).

Deus já havia ensinado o povo de Israel que teria misericórdia dos que O amam, ou seja, dos que guardam o Seu mandamento, mas Moisés orou a Deus para que o povo de Israel fosse perdoado na questão do bezerro de ouro ou, senão, que o seu nome fosse riscado do livro da vida (Êxodo 32:31-32).

Ao que Deus respondeu Moisés, dizendo: “Compadecer-me-ei de quem me compadecer, e terei misericórdia de quem eu tiver misericórdia.”, evidenciando que o pedido era descabido, pois Deus teria que abrir mão da sua justiça para satisfazer o pedido de Moisés.

Já estava estabelecido de quem Deus se compadece e tem misericórdia: dos que O amam, de modo que, Deus responde de modo incisivo: Compadecer-me-ei de quem me compadecer, ou seja, de quem obedece aos mandamentos.

Não adiantou Esaú querer e correr atrás da primogenitura e da bênção, e nem Moisés orar pelo povo que havia pecado, pois a regra é clara: depende de Deus que se compadece! E qual é a regra estabelecida para Deus se compadecer? A soberania? A presciência? Não! A regra para Deus se compadecer é obedecer aos mandamentos!

“Assim, pois, isto não depende do que quer, nem do que corre, mas de Deus, que se compadece.” (Romanos 9:16).

 

Eleição para o propósito divino

Romanos 9, foi escrito para evidenciar a eleição de Israel como essencial ao propósito eterno de Deus, que é fazer o Cristo, o seu primogênito, a cabeça da igreja e o mais elevado que os reis da terra.

Para se efetivar o propósito eterno, primeiro era necessário trazer o Cristo ao mundo e, para trazer o Cristo, a linhagem de Abraão foi escolhida, e por isso foi anunciada as boas novas a Abraão, Isaque e Jacó.

Ler a passagem de Romanos 9, como se tratando de eleição de indivíduos para salvação é transtornar o expresso pelo texto, bem como o contexto, sem falar na distorção das citações do Antigo Testamento.

Ao falar da eleição, o apostolo Paulo destaca a fidelidade de Deus, e não a salvação de Jacó, ou a perdição de Esaú. Em ponto algum o apóstolo Paulo destaca que Jacó foi eleito para ser salvo, quer seja pela soberania ou presciência, e, muito menos, em ponto algum é dito que Esaú foi destinado a perdição.

O apóstolo Paulo somente estava evidenciando que nem todos que são pertencentes a nação de Israel, de fato são israelitas e, nem por serem descendência de Abraão, são de fato seus filhos. E isto não significa que a palavra de Deus tenha falhado, pois só os filhos da promessa são filhos de Abraão.

“Corromperam-se contra ele; não são seus filhos, mas a sua mancha; geração perversa e distorcida é.” (Deuteronômio 32:5).

Quais são os filhos da promessa que são contados como descendência de Abraão? Os crentes em Cristo!

”Estejais certos, portanto, de que os que são da fé, precisamente estes, é que são filhos de Abraão! (…) Porquanto, todos vós sois filhos de Deus por meio da fé que tendes em Cristo Jesus,” (Gálatas 3:6 e 26);

“Mas a todos quantos o receberam, deu-lhes o direito de se tornarem filhos de Deus, ou seja, aos que creem no seu Nome;” (João 1:12);

Com isso, o apóstolo Paulo evidencia que tudo aquilo que os judaizantes invocavam como essencial para se dizerem filhos de Abraão, como: a nação, a adoção, a glória, as alianças, a lei, o culto, as promessas e, até mesmo o Cristo segundo a carne, era inócuo para salvação. Ele diziam ter zelo de Deus, mas sem o conhecimento (Romanos 10:2).

“Que são israelitas, dos quais é a adoção de filhos, e a glória, e as alianças, e a lei, e o culto, e as promessas; Dos quais são os pais, e dos quais é Cristo segundo a carne, o qual é sobre todos, Deus bendito eternamente. Amém.” (Romanos 9:4-5).

Além de confrontar as premissas judaizantes, o apóstolo dos gentios estava conscientizando os cristãos em Roma de que a salvação em Cristo decorre de uma aliança superior e é firmada em promessas maior (Hebreus 8:6). Não é porque os que eram da circuncisão se diziam israelitas, que de fato eram, pois a verdadeira circuncisão é a do coração.

“Mas é judeu o que o é no interior, e circuncisão a que é do coração, no espírito, não na letra; cujo louvor não provém dos homens, mas de Deus.” (Romanos 2:29).

A abordagem de Romanos 9, segue a linha de raciocínio de Romanos 3, visto que a utilidade de ser judeu é grande, visto que a palavra de Deus lhes foi confiada. Entretanto, eles foram infiéis, mas a incredulidade deles não aniquilou a fidelidade de Deus! E o capítulo 9, retoma a abordagem do capítulo 3:

“QUAL é, pois, a vantagem do judeu? Ou qual a utilidade da circuncisão? Muita, em toda a maneira, porque, primeiramente, as palavras de Deus lhe foram confiadas. Pois quê? Se alguns foram incrédulos, a sua incredulidade aniquilará a fidelidade de Deus?” (Romanos 3:1-3);

“Porque eu mesmo poderia desejar ser anátema de Cristo, por amor de meus irmãos, que são meus parentes segundo a carne; Que são israelitas, dos quais é a adoção de filhos, e a glória, e as alianças, e a lei, e o culto, e as promessas; Dos quais são os pais, e dos quais é Cristo segundo a carne, o qual é sobre todos, Deus bendito eternamente. Amém. Não que a palavra de Deus haja faltado, porque nem todos os que são de Israel são israelitas;” (Romanos 9:3-6).

A essência da eleição é o descendente que viria da descendência de Abraão, e em função do descendente foi dada a palavra da promessa a Abraão, pois Abraão ordenaria os seus filhos e a sua linhagem segundo o estabelecido por Deus.

“Porque eu o tenho conhecido, e sei que ele há de ordenar a seus filhos e à sua casa depois dele, para que guardem o caminho do SENHOR, para agir com justiça e juízo; para que o SENHOR faça vir sobre Abraão o que acerca dele tem falado.” (Gênesis 18:19).

É Deus quem chamou a descendência de Abraão ao prometer: em ti serão benditas todas as famílias da terra’. É Deus quem providenciou linhagem a Abraão ao dizer: ‘Por este tempo virei, e Sara terá um filho’. E foi Deus que disse: ‘O maior servirá o menor’.

Os judaizantes não podiam se jactar da carne, pois Isaque veio por promessa. Se nem Abraão poderia jactar da sua carne (Romanos 4:1), vez que teve que oferecer o seu unigênito e, em figura, recobrá-lo dentre os mortos (Hebreus 11:18), que se dirá dos descendentes da carne de Abraão.

Os judaizantes não podiam se gloriar nas obras lei, pois nem mesmo Abraão foi justificado pelas obras (Romanos 4:4). Ora, a circuncisão foi dada após a promessa, bem como, a lei é posterior a promessa (Romanos 4:10 e 13).

“Mas digo isto: Que tendo sido a aliança anteriormente confirmada por Deus em Cristo, a lei, que veio quatrocentos e trinta anos depois, não a invalida, de forma a abolir a promessa.” (Gálatas 3:17).

Observe que no capítulo 9, o apóstolo destaca somente as promessas feita a Abraão e Rebeca (v. 7 e 9 e 12), daí a alusão ao fato de Esaú não terem feito bem ou mal, pois não eram nascidos. Se Esaú e Jacó nem eram nascidos e, por isso mesmo, não haviam feito bem ou mal, invocar as obras da lei como imprescindível à salvação era sem cabimento.

O propósito de Deus através da eleição, para ser firme, não se pauta nas obras e, sim, em quem chama, e por isso foi dito à Rebeca que ‘o maior haveria de servir o menor’. As obras da lei que eram invocadas pelos judaizantes eram inócuas ante a promessa de redenção em Cristo, tanto que a eleição da linhagem de Abraão que traria o Cristo ao mundo não se deu por obras.

Ao citar a eleição de Israel para trazer o Cristo ao mundo, o apóstolo Paulo cita Malaquias: “Amei a Jacó, e odiei a Esaú.”, para confirmar o cumprimento da promessa: “O maior servir o menor”, evidenciando que o assunto em voga é o Descendente e a nação de Israel.

“Foi-lhe dito a ela: O maior servirá o menor. Como está escrito: Amei a Jacó, e odiei a Esaú.” (Romanos 9:12-13).

Com o advento da nova aliança, o apóstolo evidência que os da circuncisão, que alegavam ser salvos por ter Abraão por pai, em nada eram diferentes dos filhos de Esaú, pois Esaú era descendente da carne de Abraão e a sua descendência não foi contada como israelita. Assim como a descendência de Esaú não era a descendência de Abraão, os filhos de Jacó não eram a descendência, como se falasse de muitas. As Escrituras falam de Abraão e a sua descendência, que é única, que é Cristo.

“Ora, as promessas foram feitas a Abraão e à sua descendência. Não diz: E às descendências, como falando de muitas, mas como de uma só: E à tua descendência, que é Cristo.” (Gálatas 3:16).

A descendência de Jacó era melhor que a descendência de Esaú? Evidente que não! A carne de Jacó, ou de Isaque, ou de Abraão não tem valor diante de Deus para salvação ou bens futuros.

Ora, o que é importante então? O Descendente em quem todas as famílias da terra seriam bem-aventuradas! (Romanos 4:9) O Descendente que seria chamado em Isaque! (Romanos 9:7; Hebreus 11:18) É no Descendente que se cumpre:  O maior servirá o menor, como está escrito: “Amei a Jacó, e odiei a Esaú.”, de modo que os dois povos que procederiam do ventre de Rebeca, sendo um povo mais forte que o outro povo, contudo, o povo maior seria sujeito ao povo menor!

“E o SENHOR lhe disse: Duas nações há no teu ventre, e dois povos se dividirão das tuas entranhas, e um povo será mais forte do que o outro povo, e o maior servirá ao menor.” (Gênesis 25:23).

“E pôs guarnições, em Edom, em todo o Edom pôs guarnições, e todos os edomeus ficaram por servos de Davi; e o SENHOR ajudava a Davi por onde quer que ia.” (2 Samuel 8:14).

É evidente que Deus elegeu o povo de Israel, não porque fosse melhor, mais justo ou mais numeroso que os outros povos. A escolha de Isaque em detrimento de Ismael, ou a escolha de Jacó e a preterição de Esaú, se deve exclusivamente ao amor de Deus pelos pais, de modo a cumprir a sua boa palavra.

“O SENHOR não tomou prazer em vós, nem vos escolheu, porque a vossa multidão era mais do que a de todos os outros povos, pois vós éreis menos em número do que todos os povos; Mas, porque o SENHOR vos amava, e para guardar o juramento que fizera a vossos pais, o SENHOR vos tirou com mão forte e vos resgatou da casa da servidão, da mão de Faraó, rei do Egito. Saberás, pois, que o SENHOR teu Deus, ele é Deus, o Deus fiel, que guarda a aliança e a misericórdia até mil gerações aos que o amam e guardam os seus mandamentos.” (Deuteronômio 7:7-9);

“Quando, pois, o SENHOR teu Deus os lançar fora de diante de ti, não fales no teu coração, dizendo: Por causa da minha justiça é que o SENHOR me trouxe a esta terra para a possuir; porque pela impiedade destas nações é que o SENHOR as lança fora de diante de ti. Não é por causa da tua justiça, nem pela retidão do teu coração que entras a possuir a sua terra, mas pela impiedade destas nações o SENHOR teu Deus as lança fora, de diante de ti, e para confirmar a palavra que o SENHOR jurou a teus pais, Abraão, Isaque e Jacó. Sabe, pois, que não é por causa da tua justiça que o SENHOR teu Deus te dá esta boa terra para possuí-la, pois tu és povo obstinado.” (Deuteronômio 9:4-6).

Deus elegeu a descendência de Abraão para trazer salvação a todos os homens, e por isso fez uma aliança com Abraão. Como Abraão amou a Deus se sujeitando aos seus mandamentos, Deus guarda a aliança e a misericórdia perpetuamente, evidenciando que Ele se compadece de quem O ama e tem misericórdia de quem obedece aos seus mandamentos.

A misericórdia de Deus não depende dos homens, quem quer que seja, e sim, da promessa de Deus, que se compadece. A palavra de Deus anunciada a Abraão tinha ao final uma promessa: ‘em ti serão benditas todas as famílias da terra’, diferente da palavra de Deus anunciada a Faraó, que tinha outro propósito: ‘para em ti mostrar o meu poder, e para que o meu nome seja anunciado em toda a terra’ (Romanos 9:17).

“Deste um mandamento que me salva, pois tu és a minha rocha e a minha fortaleza.” (Salmos 71:3).

Diferentemente da palavra anunciada a Abraão, a palavra anunciada a Faraó era uma ordem sob pena de sobrevirem pragas sobre o Egito. Faraó, obedecendo ou não, Deus revelaria o seu poder e, o seu nome, seria anunciado em toda a terra.

Deus se compadeceu da humanidade ao anunciar o Descendente a Abraão e, todos que creem na promessa dada Abraão, se tornam filhos de Abraão. A palavra dada a Faraó foi sem promessa, logo, conclui-se que Deus “… compadece-se de quem quer, e endurece a quem quer.” (Romanos 9:18).

 

Amei a Jacó, e aborreci Esaú

Charles H. Spurgeon, no Sermão Esaú e Jacó, disse não ser capaz de explicar os mistérios da predestinação de Deus, e não sabe o motivo pelo qual Deus certas pessoas para serem o seu povo.

“Não sou capaz de explicar os mistérios da predestinação de Deus. Não sei porque Deus escolheu certas pessoas para serem Seu povo antes dEle ter formado o mundo. O homem que pensa que compreende o propósito da predestinação de Deus demonstra que ele conhece bem pouco a esse respeito. A predestinação de Deus tem sido discutida desde os primeiros dias do cristianismo. Mas não é através de argumentação que entenderemos o profundo ensino de que Deus de fato escolheu um povo para Si.” Spurgeon, Charles H.  Sermões Sobre a Salvação, Editora PES, p.p. 74-82.

Entretanto, afirma categoricamente que o texto de Romanos 9 “se refere aos filhos de Jacó e o povo de Esaú, aos filhos de Israel e aos filhos de Edom”.

Spurgeon ao considerar a citação que o apóstolo faz de Malaquias, não leva em conta o contexto de Malaquias, quando Deus evidencia aos filhos de Israel que eles eram amados pelo fato de serem descendentes de Jacó, diferentemente, dos filhos de Esaú, visto que tanto ele quanto os seus descendentes foram desprezados. O contexto é claro: “Eu vos tenho amado, diz o SENHOR.” A declaração de amor é direcionada a Jacó? Não! A declaração é direcionada aos remanescentes de Israel! Como se fizeram de rogados, dizendo: “Em que nos tem amado?”, Deus aponta qual é a base do seu amor: “Não era Esaú irmão de Jacó? disse o SENHOR”.

Podia até parecer que Israel não era escolhido para o propósito de Deus trazer o Redentor ao mundo por causa a condição deplorável que estavam, entretanto, o fato de terem sido preservados do extermínio era prova suficiente da misericórdia de Deus. O texto de Malaquias não diz de Esaú e Jacó, e sim, da nação pecadora que desviou-se do seu Deus.

Ao propor responder por que Deus amou Jacó, Spurgeon afirma que o verso 11, de Romanos 9, diz que a razão para Deus amar Jacó foi sua graça soberana. Ao ler Romanos 9,verso 11, não há qualquer referência a graça soberana de Deus, e sim, ao propósito de Deus.

“Porque, não tendo eles ainda nascido, nem tendo feito bem ou mal (para que o propósito de Deus, segundo a eleição, ficasse firme, não por causa das obras, mas por aquele que chama),” (Romanos 9:11).

Considerando o Propósito Eterno de Deus, que é uma questão à parte da graça, verifica-se que o propósito de Deus centra-se em si mesmo, na pessoa de Cristo.

“Segundo o eterno propósito que fez em Cristo Jesus nosso Senhor,” (Efésios 3:11).

A graça faz parte do processo para atingir o propósito eterno, que é convergir em Cristo, todas as coisas:

“De tornar a congregar em Cristo todas as coisas, na dispensação da plenitude dos tempos, tanto as que estão nos céus como as que estão na terra;” (Efésios 1:10).

E qual o objetivo central do propósito eterno? A preeminência de Cristo em todas as coisas!

“E ele é a cabeça do corpo, da igreja; é o princípio e o primogênito dentre os mortos, para que em tudo tenha a preeminência. Porque foi do agrado do Pai que toda a plenitude nele habitasse, e que, havendo por ele feito a paz pelo sangue da sua cruz, por meio dele reconciliasse consigo mesmo todas as coisas, tanto as que estão na terra, como as que estão nos céus. (Colossenses 1:18-20).

O texto de Romanos não aborda o tema ‘graça’, antes evidencia que as questões relacionadas a eleição e predestinação, que não devem ser pensadas segundo as premissas calvinistas e arminianistas, tem relação com o propósito eterno, algo voltado para o Criador, e não, algo centrado nos homens, apesar de que os homens são chamados ao propósito eterno. Para ser chamado ao propósito eterno, que é Cristo o primogênito entre muitos irmãos, Deus elegeu em Cristo uma geração de homens espirituais que foram feitos santos e irrepreensíveis. Esses homens, também denominados novas criaturas, por estarem em Cristo, o eleito de Deus, foram predestinados a serem conforme a imagem de Cristo! A predestinação tem por foco a imagem de Cristo, e não a salvação, que é operada por meio do evangelho. Ao conceder aos que creem a imagem de Cristo, por sua vez, Cristo é constituído a cabeça da igreja, o primogênito dentre os mortos entre muitos irmãos semelhantes a Ele.

“Porque os que dantes conheceu também os predestinou para serem conformes à imagem de seu Filho, a fim de que ele seja o primogênito entre muitos irmãos.” (Romanos 8:29).

Equivocamente Spurgeon afirma que “a graça de Deus é a única razão porque Deus amou Jacó”, e cita: “Deus compadece-se de quem quer” (Romanos 9.18). São dois equívocos: a)  a razão porque Deus amou Jacó decorre do direito de primogenitura que ele adquiriu de Esaú, de modo que a sua linhagem foi escolhida para assegurar a aliança feita com Abraão, de que através do seu Descendente, Cristo, todas as famílias da terra seriam benditas; b)  a escolha de Jacó e a rejeição de Esaú não se refere a salvação, e sim, as benção futuras envolvendo o Descendente prometido a Abraão.

A única razão pela qual Esaú não achou lugar de arrependimento é porque não existem dois primogênitos. Com relação a salvação sempre haverá lugar de arrependimento, pois na questão da salvação Deus é misericordioso para com todos os que O invocam.

Por desconhecer a essência do arrependimento, Spurgeon afirma que “Esaú não se arrependeu verdadeiramente”. Spurgeon desconhece que arrepender-se é mudança de compreensão, entendimento sobre um determinado assunto, a chamada ‘metanoia’. O arrependimento de Esaú foi sincero, que até com lágrimas buscou herdar a bênção, mas já não havia lugar vago na primogenitura.

“Porque bem sabeis que, querendo ele ainda depois herdar a bênção, foi rejeitado, porque não achou lugar de arrependimento, ainda que com lágrimas o buscou.” (Hebreus 12:17).

Ao dizer que Deus se compadece de quem quer, o apóstolo cita a repreensão que Deus fez a Moisés, de que a misericórdia d’Ele se destina as que o amam e guardam os seus mandamentos.

“E faço misericórdia a milhares dos que me amam e aos que guardam os meus mandamentos.” (Êxodo 20:6).

A regra de ouro: “Também está escrito” foi desprezada por Spurgeon, pois diante do pedido infundado de Moisés para perdoar o pecado do povo, se não, que Deus riscasse o seu nome do livro da vida, que Deus evidenciou que tem misericórdia segundo os seus termos. E que termos eram esses? Soberania? Presciência? Não! A misericórdia é dada aos que O amam e aos que guardam o seu mandamento!

A questão de Esaú e Jacó não foi de misericórdia, mas de direito. Direito é direito, e quando Jacó adquiriu o direito de primogenitura, a questão que não foi decidida no nascimento foi definida de uma vez por todas. Mesmo que Jacó quisesse negociar o direito, não haveria lugar de negociação.

Claudio Crispim

É articulista do Portal Estudo Bíblico (https://estudobiblico.org), com mais de 360 artigos publicados e distribuídos gratuitamente na web. Nasceu em Mato Grosso do Sul, Nova Andradina, Brasil, em 1973. Aos 2 anos de idade sua família mudou-se para São Paulo, onde vive até hoje. O pai, ‘in memória’, exerceu o oficio de motorista coletivo e, a mãe, é comerciante, sendo ambos evangélicos. Cursou o Bacharelado em Ciências Policiais de Segurança e Ordem Pública na Academia de Policia Militar do Barro Branco, se formando em 2003, e, atualmente, exerce é Capitão da Policia Militar do Estado de São Paulo. Casado com a Sra. Jussara, e pai de dois filhos: Larissa e Vinícius.

3 thoughts on “A eleição em Esaú e Jacó

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