Apocalipse

Ao ministro de Laodiceia

A igreja de Laodiceia

Carta endereçada ao ministro de Laodiceia, o anjo da igreja, devido a falta de comprometimento com a sã doutrina e falta de cuidado para com o rebanho.


Ao ministro de Laodiceia

Introdução

No Livro das Revelações, o apóstolo João registrou o conteúdo de sete cartas, endereçadas a sete ministros (anjos, mensageiros), que cuidavam de sete comunidades cristãs (igrejas), localizadas na Ásia Menor.

Há certo prejuízo para a compreensão das sete cartas aos anjos das igrejas, se o leitor considerar a ideia presente nos subtítulos das traduções bíblicas, como por exemplo: ‘Sétima carta, à igreja de Laodiceia’, ‘Primeira carta, à igreja de Éfeso’, que consta da Almeida corrigida e fiel (ACF). Ora, as cartas não foram direcionadas às igrejas, mas, ao anjo de cada igreja, que estava em cada cidade ali mencionada.

Os subtítulos dão a entender aos leitores que as cartas foram endereçadas aos membros da comunidade (igreja), entretanto, as cartas foram endereçadas aos ministros das igrejas, uma espécie de epístola pastoral.

Moody, em seu comentário bíblico, embora reconheça que as sete cartas foram endereçadas aos anjos das igrejas, dá a entender que elas tinham por público alvo os membros dessas comunidades:

“A última carta é à Laodiceia, que não recebe nenhum elogio. As condições desfavoráveis desta igreja eram de mornidão: os membros não eram nem frios nem quentes (v. 15)” Comentário Bíblico Moody.

O veredito: ‘nem és frio, nem quente’ tem por alvo o anjo da igreja e não à comunidade de Laodiceia (Apocalipse 3:14).

As cartas contêm diversas figuras para comunicar uma ideia, que é peculiar aos ministros das igrejas, em função do conhecimento que possuem, o que demanda por parte do leitor uma atenção maior, pois a dificuldade de se interpretar um texto construído com figuras é maior.

As cartas aos anjos das igrejas foram escritas com inúmeras figuras, que exercem uma função mais próxima à da linguagem ‘icônica’, ou seja, uma linguagem que utiliza ícones (signo que apresenta uma relação de semelhança ou, analogia com o objeto que representa).

A linguagem das cartas enviadas pelo apóstolo João expressa e reproduz, com exatidão e fidelidade, uma realidade, diferente de uma linguagem figurada, que não tem a pretensão de espelhar a realidade, antes, que busca estabelecer uma analogia, substituindo ou, sugerindo algo ao leitor.

Por exemplo: Jesus chamou os escribas e fariseus de “Raça de víboras”. Se buscarmos nos dicionários, víbora é o mesmo que cobra e, através da linguagem figurativa, entende-se que Jesus chamou os fariseus de ‘pessoas falsas, mentirosas, interesseiras, que passavam por cima dos outros, invejosas, que queriam o mal para os outros, que têm duas caras, que odeiam, que não cumprimentam, hipócritas, etc.’. No entanto, Jesus não fez uso de uma linguagem figurativa ou, denotativa, pois o termo ‘víbora’ não é empregado de acordo com o senso comum, ou seja, não podemos entender que os fariseus eram ‘répteis da ordem dos ofídios’, ou, conforme constam dos dicionários, que os fariseus eram hipócritas.

Do ponto de vista bíblico, fariseu era alguém pertencente à mais ferrenha religião dos judeus (Atos 26:5) e a hipocrisia deles estava relacionada com o trato que dispensavam à Palavra de Deus.

Quando dizemos que a linguagem das cartas se aproxima de uma linguagem icônica, significa que o termo víboras, quando utilizado por Jesus, remete a uma figura bíblica, uma figura com ideia específica. utilizada na Lei e nos Profetas, que não consta dos dicionários seculares.

Por exemplo: na lei, ‘víbora’ é uma figura utilizada para fazer referência aos filhos de Israel, por serem pessoas faltas de conselhos, que não compreendiam o mandamento de Deus e produziam uma doutrina própria, cujo conteúdo é comparável ao veneno de serpentes, que produz morte (Deuteronômio 32:33; Deuteronômio 32:6).

A figura da serpente é utilizada pelos profetas no mesmo sentido empregado pelo profeta Moisés, para descrever a falta de compreensão do povo de Israel. Nesse sentido, quando Jesus nomeia os fariseus de ‘raça de víboras’, a linguagem é similar à linguagem icônica (ou seja, não cabe outra interpretação, além do que está estabelecido na Lei, nos Salmos e nos Profetas), pois a figura remete a um povo específico e a um contexto específico.

Não vamos encontrar na Bíblia ‘víbora’ como figura sendo aplicada aos gentios. É dos filhos de Israel que Isaías diz:

“Chocam ovos de basilisco, e tecem teias de aranha; o que comer dos ovos deles, morrerá; e, quebrando-os, sairá uma víbora” (Isaías 59:5).

Diante de uma placa de trânsito, onde está escrito ‘Proibido estacionar’, não se leva em conta as condições emocionais, sociais, de caráter, financeira, nacionalidade, profissão, etc., do usuário da via. A ideia transmitida é: não se pode estacionar naquela localidade e, por isso, utiliza-se a linguagem icônica para transmitir a ideia de proibido estacionar.

Dessa forma, quando as cartas do apóstolo amado apresentam figuras, elas remetem a signos contidos na Lei, nos Profetas, nos Salmos e nos Provérbios (Escrituras), ou seja, não fica a cargo do leitor atribuir significado à figura, segundo seus sentimentos, emoções, condições, etc.

Através das figuras utilizadas, é possível abstrair qual o destinatário (público alvo) das cartas: os ministros das igrejas. A carta não foi redigida aos membros da igreja local, mas, aos seus ministros.

Somente os ministros, que deviam manejar bem as Escrituras, tinham condições de compreender o conteúdo dessas cartas, pois as figuras utilizadas demandam a compreensão de símiles, adágios, parábolas, que constam na Lei, nos Profetas, nos Salmos e nos Provérbios.

Somente a carta endereçada ao anjo de Tiatira possui uma mensagem direcionada aos cristãos da igreja:

“Digo-vos, porém, a vós, os demais que estão em Tiatira, a todos quantos não têm esta doutrina, e não conheceram, como dizem, as profundezas de Satanás, que outra carga não porei sobre vós. O que tendes, retende-o até que eu venha” (Apocalipse 2:24 -25).

As demais cartas contêm exortação, consolo, ânimo, reprovação, incentivo, etc., aos ministros que estavam à frente daquelas comunidades, conteúdo semelhante aos das cartas endereçadas a Timóteo e a Tito.

Embora alguns teólogos considerem que a carta ao ministro de Laodiceia possui um tom mais grave que as outras cartas, todavia, temos de considerar que o tom de cada carta reflete a necessidade de cada ministro, no exercício do seu ministério.

Vale destacar que, apesar de a mensagem contida nas cartas ser atual, quando se considera o que foi tratado e a qualidade dos ministros do evangelho do presente tempo, a mensagem destinada ao anjo de Laodiceia não é de cunho profético.

Há aqueles que interpretam que as sete cartas que contam do Apocalipse são proféticas e que as sete igrejas são utilizadas para descrever sete diferentes períodos da história da Igreja. As cartas foram endereçadas aos líderes das igrejas da Ásia e não aos seus membros, em particular, portanto, resta equivocada essa abordagem, pois, se fosse profética, as cartas descreveriam sete lideranças no período histórico da igreja e não sete períodos históricos da igreja.

O corpo de Cristo, que é a igreja, não possui subdivisões, conforme o tempo (períodos históricos). O corpo de Cristo é um, com muitos membros, não importando período histórico, tendências políticas, lideranças de igrejas locais, etc. A igreja de Cristo é imaculada, perfeita, santa, separada, etc., portanto, a igreja não é constituída de mortos, mornos, doentes, sonolentos, etc., antes, essencialmente, é constituída de pessoas idôneas para participar da herança dos santos na luz.

 

A cidade de Laodiceia

A cidade de Laodiceia estava localizada na região da Frígia e Lídia, cerca de 150 km  à leste de Éfeso, no principal cruzamento de estradas dos vales da Ásia Menor, no que é hoje a Turquia. Originalmente, chamada de Dióspole (Diospolis) e Roa (Rhoas), posteriormente, em homenagem a Laódice, esposa de Antíoco II, passou a ser denominada como Laodiceia.

A carta foi escrita ao ministro (aggelos) da comunidade cristã, que se reunia na cidade de Laodiceia, e as considerações nela contidas, não decorrem de questões sociais, econômicas, políticas ou, culturais.

A acusação que pesa sobre o ministro de Laodiceia não era em decorrência do paganismo da cidade ou, da cultura grega, portanto, quase nada acrescenta divagar acerca das questões religiosas e culturais daquela cidade.

O que foi escrito ao anjo da igreja de Laodiceia não possui conexão com o fato de a cidade de Laodiceia situar-se, segundo os historiadores, sobre uma montanha que dava para um vale fértil ou, por ser um importante centro de administração e comércio dos romanos ou, porque as demandas judiciais das cidades cirunvizinhas eram ouvidas em Laodiceia ou, ainda, que fundos monetários dessas cidades eram depositados nos bancos de Laodiceia.

Relacionar uma questão histórica, de que a cidade de Laodiceia era próspera, com a questão do ministro da igreja professar que era rico, é temerário. Não há conexão entre a confisão: – “Rico sou”, com a prosperidade da cidade de Laodiceia, que mesmo após ser danificada por terremotos duas vezes, uma durante o reino de Augusto (27 a.C. – 14 d.C.) e outra em 60 d.C, não buscou recursos externos para sua reconstrução.

Também, não se deve relacionar o veredicto ‘és morno’, com questões geográficas, por ser a cidade de Laodiceia abastecida de água proveniente de fontes ao sul, até chegar em Laodiceia, tornando-a morna, pois era conduzida por aquedutos.

Observem que Barclay interpreta o texto da carta ao anjo de Laudiceia nestes termos:

“As palavras do Cristo ressuscitado respondem de maneira direta à riqueza e às habilidades técnicas que caracterizavam e tornavam Laodiceia famosa, e que a enchiam de tanto orgulho. Este orgulho, precisamente, tinha eliminado a necessidade de Deus na mente e no coração de muitos de seus cidadãos e, aparentemente, até entre os membros da Igreja” Barclay, William, Comentário do Novo Testamento.

É temerário fazer qualquer inferência de uma epístola bíblica, levando-se em conta questões históricas, geográficas ou, econômicas. A leitura que um historiador faz de uma sociedade, dificilmente reflete com exatidão a realidade socioeconômica ou, cultural, de uma comunidade tão pequena, como era o caso da igreja em Laodiceia, onde se reuniam vários indivíduos de diversos segmentos da sociedade, de diversas etnias.

A abordagem das cartas apostólicas não visa questões socioeconômicas, antes, possui relação intrínseca com o ministro e a sua relação com a Palavra de Deus.

O que se deve destacar é o contido nas Escrituras, com especial atenção ao redigido pelo apóstolo Paulo, que registrou várias considerações acerca dos cristãos das regiões da Ásia menor.

O apóstolo dos gentios notificou a Timóteo que todos os cristãos daquela região o abandonaram, citando os nomes de Figelo e Hermógenes (2 Timóteo 1:15). Ele deixou registado na carta aos Colossenses que Epáfras tinha cuidado especial pelos cristãos de três cidades: Colossos, Laodiceia e Hierápolis (Colossenses 4:13).

Depreendemos da leitura do verso 16, do capítulo 4, da carta aos Colossenses, que o apóstolo Paulo escreveu uma carta aos cristãos de Laodiceia e, como esta carta não chegou em nossas mãos, certamente, se perdeu.

A carta de Paulo aos Colossenses contém diversos avisos contra a doutrina dos judaizantes, assim, como, a carta aos Filipenses. Ele destaca que, apesar de não ter ido pessoalmente a Colossos e a Laodiceia, travou um grande combate pelos cristãos da região de Colossos e de Laodiceia (Colossenses 1:29 e Colossenses 2:1).

O aviso aos cristãos de Colossos é especifico:

“Tende cuidado, para que ninguém vos faça presa sua, por meio de filosofias e vãs sutilezas, segundo a tradição dos homens, segundo os rudimentos do mundo, e não segundo Cristo” (Colossenses 2:8).

Quando o apóstolo Paulo orienta dizendo: “Portanto, ninguém vos julgue pelo comer ou, pelo beber ou, por causa dos dias de festa ou, da lua nova ou, dos sábados” (Colossenses 2:16), vem a lume que o perigo que rondava a igreja de Colossos era proveniente da doutrina dos judaizantes.

Ao escrever aos Filipenses, a questão dos judaizantes, também, é abordada:

“Guardai-vos dos cães, guardai-vos dos maus obreiros, guardai-vos da circuncisão; porque a circuncisão somos nós, que servimos a Deus em espírito, nos gloriamos em Jesus Cristo e não confiamos na carne” (Filipenses 3:2-4).

O apóstolo Paulo era perseguido pelos seus concidadãos e, dentre eles, se sobressaíam os judaizantes. Geralmente, os judeus perseguiam o apóstolo Paulo, de cidade em cidade, incitando a multidão e conturbavam as cidades contra o apóstolo (Atos 17:13) e, dentro das igrejas, haviam aqueles que se diziam ‘convertidos’, porém, negavam a eficácia do evangelho, pois queriam fazer os cristãos se circuncidarem e guardarem preceitos da lei mosaica (Gálatas 5:8-12).

Essas questões apresentadas pelo apóstolo Paulo é que devem consideradas, quando da leitura das cartas aos anjos das igrejas que ficavam na Ásia, e não questões históricas, geográficas, econômicas, culturais, etc., que carecem de comprovação.

 

O Amém

“E ao anjo da igreja que está em Laodiceia escreve: Isto diz o Amém, a testemunha fiel e verdadeira, o princípio da criação de Deus” (Apocalipse 3:14)

Assim como o apóstolo Paulo produziu as epístolas pastorais, como as cartas a Timóteo e a Tito, as cartas que constam do Apocalipse são todas de cunho pastoral, endereçadas aos ministros, àqueles que tinham o dever de cuidar das igrejas.

O termo grego ἄγγελος, transliterado ‘aggelos’, comumente traduzido por ‘anjo’, no verso em análise, não se refere a seres celestiais, mas, aos ministros do evangelho que foram incumbidos de cuidar das igrejas (1 Pedro 5:2). Um ministro do evangelho é mensageiro de Deus, portanto, um ‘anjo’ portador da mensagem da reconciliação (2 Coríntios 5:20; 1 Timóteo 5:21).

O escritor aos Hebreus utiliza o termo ἄγγελος para fazer referência aos santos profetas que falam a palavra de Deus aos pais, demonstrando que a palavra dos mensageiros de Deus permaneceu firme e a tradução do termo por ‘anjos’, acaba por confundir o leitor, que passa a considerar que a palavra dos seres celestiais permaneceu firme.

“HAVENDO Deus antigamente falado muitas vezes, e de muitas maneiras, aos pais, pelos profetas (…) Porque, se a palavra falada pelos anjos permaneceu firme…” (Hebreus 1:2 e Hebreus 2:2).

O Senhor Jesus é o autor da carta e se apresenta como ‘O Amém’, sendo empregado termo grego ἀμήν, uma espécie de hebraísmo. O significado do termo ‘amém’, nos dicionários, é ‘assim seja’, mas, se analisarmos o contexto e quem se identificou como ‘O Amém’, o termo transcende a ideia que consta dos dicionários.

O termo ‘ἀμήν’ está diretamente ligado à fidelidade de Deus, pois quantas promessas há em Deus, que é fiel, em Cristo todas foram confirmadas e cumpridas (2 Coríntios 1:18-20). O fato de Cristo ter sido ressuscitado dentre os mortos, cumpriu a promessa de Deus feita aos pais (Atos 13:23 e 32). Tudo o que Deus revelou através dos seus santos profetas, acerca de Cristo, se cumpriu, pois Deus vela sobre a sua palavra para a cumprir (Isaías 55:11).

Com relação ao Verbo que se fez carne e ressurgiu dentre os mortos, o termo ‘ἀμήν’ vai além da expressão de anseio ou, de um desejo mágico: “Oxalá!”, “Que assim seja!”, antes, aponta para aquele que é inabalável: Cristo, o Verbo eterno, a palavra firme, fiel.

Quem direciona a palavra ao ministro da igreja que estava em Laodiceia é o Cristo glorificado, que, em carne, testemunhou de Deus (João 18:37) e de quem o Pai deu testemunho, através dos seus santos profetas (João 5:39).

Por que Cristo se apresenta como a ‘fiel testemunha’? Porque tudo o que anunciou aos homens, Cristo falou exatamente como o Pai mandou (João 8:28 e 38; João 12:50).

 

Princípio da criação de Deus

O Cristo glorificado se apresenta como o ‘princípio da criação de Deus’ (ἡ ἀρχὴ τῆς κτίσεως). Como compreender essa apresentação? O entendimento mais aceito entre os teólogos é o de que Cristo se apresentou como a origem, a causa primeira de todas as coisas.

Como a sabedoria é apresentada personificada no Livro de Provérbios, os teólogos entendem que, ao se apresentar como ‘princípio da criação de Deus’, Jesus apontou para a sua preexistência.

“O SENHOR me possuiu no princípio de seus caminhos, desde então, e antes de suas obras. Desde a eternidade fui ungida, desde o princípio, antes do começo da terra” (Provérbio 8:22-23).

Ora, sabemos que o Jesus de Nazaré, que foi gerado no ventre da virgem Maria, antes de ser introduzido no mundo como o Unigênito de Deus, na eternidade criou todas as coisas e sustenta todas elas pela palavra do seu poder (Hebreus 1:2).

Os discípulos conviveram com um homem igual a eles, em todos os sentidos (físico e emocional), contudo, quando Jesus ressurgiu dentre os mortos e assentou-se à destra da Majestade nas alturas, não mais deveriam ‘contemplá-lo’ (entender) segundo a perspectiva que tiveram quando O viram em carne, antes deveriam vê-Lo (compreender) coroado de glória e poder (Hebreus 2:8-9; 2 Coríntios 5:16).

O escritor aos Hebreus aplica à pessoa de Cristo o Salmo 102:

“E, Tu, Senhor, no princípio fundaste a terra e os céus são obras de tuas mãos…” (Salmo 102:25; Hebreus 1:10).

Nesse sentido, o evangelista João, também, destacou que todas as coisas foram criadas por Cristo e sem Ele nada do que foi feito se fez (João 1:3). O apóstolo dos gentios enfatizou que Cristo é quem criou todas as coisas que há nos céus e na terra, visíveis e invisíveis, e todas as coisas subsistem por Ele (Colossenses 1:16).

Mas, apesar de vários textos, tanto na Antiga, quanto na Nova Aliança, apontarem para o Verbo eterno como Deus na eternidade, antes de ser introduzido no mundo, na condição de homem, alguns segmentos pseudocrístãos, negam a divindade de Cristo e se valem de uma má leitura dessa apresentação de Jesus.

Além do que, quando lemos: “Isto diz o Amém, a testemunha fiel e verdadeira, o princípio da criação de Deus”, a ênfase da apresentação ‘o princípio da criação de Deus’, não está no fato de Cristo ser o criador de todas as coisas.

Nessa apresentação, Jesus não estava se identificando como o λόγος (logos) divino pelo fato de Ele ser Deus e, no princípio, estar com Deus (João 1:1 -2). A proposta é outra, completamente diferente da ideia que se propagada no meio cristão.

O termo grego ἀρχὴ[1], transliterado ‘arxḗ’, comumente traduzido por ‘princípio’, não foi empregado em função de uma referência temporal, no sentido de primeiro, partida, início, mas, no seu sentido figurado, apontando a condição de Cristo como o que tem a supremacia, o primado, a preeminência, etc.

Para compreender essa apresentação de Cristo, faz-se necessário compreender o propósito eterno de Deus, conforme fez referência o apóstolo Paulo aos cristãos em Colossos:

“E ele é a cabeça do corpo, da igreja; é o princípio e o primogênito dentre os mortos, para que em tudo tenha a preeminência” (Colossenses 1:18).

Jesus se apresenta ao anjo da igreja de Laodiceia como aquele que, na ordem hierárquica de toda criação, tem a preeminência, pois foi constituído a cabeça da igreja, o primogênito (o que tem a preeminência) dentre os mortos, conforme o que consta na apresentação do apóstolo João, no início do Livro do Apocalipse:

“E da parte de Jesus Cristo, que é a fiel testemunha, o primogênito dentre os mortos e o príncipe dos reis da terra” (Apocalipse 1:5).

Cristo, como cabeça da igreja, é o princípio, no sentido de ter a preeminência, o líder. Vale destacar que, o Verbo de Deus foi introduzido no mundo como o Unigênito de Deus, mas, ao retornar à gloria, alçou a condição de Primogênito entre muitos irmãos. Cristo é o primogênito de Deus dentre os mortos e os que ressurgem com Cristo, são semelhantes a Ele (Romanos 8:28).

Quando ressurgiu dentre os mortos, Cristo foi posto à direita de Deus, posição superior a todo o principado, poder, potestade, domínio e lhe foi dado um nome que o nomeia para sempre e todas as coisas foram sujeitas a seus pés (Hebreus 2:7-8; Salmo 8:5-6). E acima de tudo o que foi enumerado acima, sobre todas elas Cristo é a cabeça da igreja (Efésios 1:20-22).

Acima da igreja está Cristo, a cabeça, e abaixo de Cristo, mas, acima de todas as coisas, está a igreja, o corpo de Cristo. Poucos conseguem visualizar a condição da igreja: abaixo de Cristo e acima de todas as coisas na hierarquia celestial. Se compreendessem a posição da igreja, teriam noção da posição que foi concedida a Cristo: princípio (ἀρχὴ) de toda criação.

Como Cristo está acima de todas as coisas e o seu corpo é constituído de inúmeros homens, que ressurgiram com Ele para a gloria de Deus Pai, e assumiram uma posição hierárquica acima de todas as criaturas de Deus, visto que a igreja julgará até os anjos. Por Cristo ser a cabeça da igreja, Ele alcançou a preeminência (primazia) em tudo.

O corpo de Cristo (a igreja) é superior aos homens, anjos, potestades, principados, etc., quer neste presente século ou, por vir, e Cristo, acima de tudo, foi constituído a cabeça da Igreja.

“E ele é a cabeça do corpo, da igreja; é o princípio e o primogênito dentre os mortos, para que em tudo tenha a preeminência” (Colossenses 1:18).

Cristo se identificou ao ministro de Laodiceia, segundo a posição que o Pai lhe outorgou, quando da glorificação, visto que, ao ressurgir dentre os mortos, Cristo herdou um nome acima de todo o nome que se nomeia no presente século e no vindouro (Efésios 1:21).

O que está em tela não é o fato de, na eternidade, o Verbo eterno ter criado todas as coisas pela palavra do seu poder. Na apresentação na carta ao anjo de Laodiceia foi destacado o fato de a igreja estar acima de todas as coisas, e sobre todas as coisas Cristo foi constituído a cabeça da igreja. Ser a cabeça é o mesmo que ter a preeminência no corpo, o ἀρχὴ (arxḗ) da criação de Deus.

 

A vontade de Deus

“Conheço as tuas obras, que nem és frio nem quente; quem dera foras frio ou quente!” (Apocalipse 3:15)

Muitos fazem uma contemporização equivocada da carta ao anjo de Laodiceia, em função da concepção que idealizaram, acerca do que deve ser uma comunidade cristã nos dias atuais.

Um exemplo de equívocos à margem das Escrituras se vê na teologia da libertação, concepção teológica moderna, que defende que o evangelho é uma bandeira que prega a libertação das classes oprimidas frente às injustiças sociais causadas pela opressão, proveniente de questões de ordem econômica e política.

Qualquer leitura dessa passagem bíblica, sob o prisma da teologia da libertação, em função do anúncio: ‘conheço as tuas obras’, produzirá inferências de ordem econômica, política e social, que não é a mensagem dada por Cristo. Será uma hermenêutica, com bases em conceitos fomentados pelas ciências sociais, como sociologia, filosofia, antropologia, etc., e não segundo o evangelho de Jesus.

No outro estremo há o risco da ‘espiritualização’, uma visão contemporânea decorrente da repreensão: “…és morno”, que leva à má leitura de que a comunidade cristã em Laodiceia não era de oração, voltada para os jejuns e sacrifícios. Que se ‘buscassem’ a vontade de Deus, os cristãos se aplicariam às ações de caridade, etc.

Em nossos dias, cada segmento cristão dá uma conotação diferente à condição descrita como ‘morno’. A abordagem do texto pelos preletores, geralmente, não visam os líderes das comunidades, ante, tem por alvo os membros dessas comunidades.

Se a exposição do texto for em uma comunidade pentecostal, ‘morno’ é alcunha que as dá ao membro que não participa de vigílias, orações nos montes e madrugadas, jejuns, etc. Para os neopentecostais, ‘morno’ é aquele que não contribui massivamente, não participa assiduamente das campanhas, dos votos, etc. Os tradicionais veem aquele que não se adequa às regras das convenções e não se mantém firme aos dogmas da organização eclesiástica, etc., como sendo morno.

Para os católicos, espíritas e outros, a mornidão se revela quando a comunidade não se aplica às causas sociais, como visitas aos doentes, presos, etc., assistência aos pobres, enfermos, etc.

Durante as reuniões, a ênfase de muitos preletores é a vontade de Deus, porém, negam-lhe o verdadeiro significado, pois a vontade de Deus para eles geralmente tem em voga questões desta vida, como assistencialismo aos velhos, crianças, idosos, mendigos, etc.

Em vez de buscarem compreender qual é a vontade de Deus segundo as Escrituras, apelam para o emocional das pessoas, que invariavelmente, possuem uma carnal compreensão do que é a vontade de Deus. Sob o argumento: – “Dê o seu melhor para Deus”, líderes religiosos escravizam pessoas ao seu bel prazer e apontam o veredito de Cristo: ‘És morno, vomitar-te-ei!’.

As pessoas, temerosas por não saberem qual é a vontade de Deus, sobem monte e descem os vales, passam noites em claro, em prolongadas orações, etc., por entenderem que estão realizando a vontade de Deus. Outros segmentos entendem que a vontade de Deus está no celibato, na clausura, na meditação, nas penitências, etc.

Sobre a vontade de Deus, escreveu o apóstolo Paulo: “Que quer que todos os homens se salvem e venham ao ‘conhecimento’ da verdade” (1 Timóteo 2:4), e ‘conhecer’ a verdade só é possível quando se crê que Jesus é o Cristo.

“Porquanto a vontade daquele que me enviou é esta: Que todo aquele que vê o Filho, e crê nele, tenha a vida eterna; e eu o ressuscitarei no último dia” (João 6:40; João 20:31; João 6:29).

 

Obras

“Conheço as tuas obras, que nem és frio nem quente; quem dera foras frio ou quente!” (Apocalipse 3:15)

No que consiste as ‘obras’ do anjo da igreja em Laodiceia?

Jesus noticia ao ministro de Laodiceia que conhecia as obras dele e que elas o classificavam como morno, condição que é própria ao ministro, não à comunidade cristã daquela cidade.

O que fazer para não ser tido por morno? Qual a obra que Jesus ‘conhece’ e que determina se o ministro é morno? Seriam ações sociais? Doações caridosas? Defesa de alguma ideologia? Construção de um templo? Fazer missões?

O apóstolo Paulo ao escrever a Timóteo utilizou o termo grego ἔργα (erga), comumente traduzido por ‘obra’, ‘trabalho’: “Mas tu, sê sóbrio em tudo, sofre as aflições, faze a obra de um evangelista, cumpre o teu ministério” (2 Timóteo 4:5) e Jesus, ao fazer referência à necessidade de crer em Cristo para a salvação, utilizou o mesmo termo: – “A obra de Deus é esta: que creiais naquele que ele enviou” (João 6:29).

Jesus utilizou o termo grego ἔργα na resposta que deu à multidão, que questionou qual seria a obra de Deus (João 6:28). Através da pergunta da multidão e da resposta de Jesus, claro está que confessar o nome de Cristo como salvador é realizar a obra de Deus.

Quando o apóstolo Paulo ordena a Timóteo que cumprisse a obra de um evangelista, Timóteo já havia feito a obra de Deus, ou seja, ele já cria que Jesus é o Cristo. É impossível cumprir o ministério de um evangelista, sem antes ter crido em Cristo.

Analisando a temática bíblica e como o termo ἔργα é utilizado em função do contexto, percebe-se que o termo ἔργα é utilizado como resultado da obediência a um mandamento. Obra é consequência da obediência a um mandamento, de modo que, primeiro se faz necessária a existência de um mandamento e, em segundo lugar, quem obedeça e, por fim, resultará em uma obra.

Neste sentido, quando Jesus declarou: “A minha comida é fazer a vontade daquele que me enviou, e realizar a sua obra” (João 4:34), realizar a obra do Pai implicava em obedece-Lo.

A obra só é possível em função de um mandamento. A ideia de obra emerge de uma sociedade aristocrática, em função da relação senhor e servo. A ‘obra’ pertence ao senhor que, ao implementá-la, dá ordem aos seus servos. Os servos, por sua vez, devem obedecer ao seu senhor, o que resultará na obra.

Sem o mandamento dado pelo Pai ao Seu Filho, não haveria como Cristo obedecer, consequentemente, não haveria uma obra.

“Porque eu não tenho falado de mim mesmo; mas o Pai, que me enviou, ele me deu mandamento sobre o que hei de dizer e sobre o que hei de falar.”  (João 12:49).

Qual a obra que Deus deu ao Filho realizar? A resposta está patente no livro do profeta Isaías:

“O ESPÍRITO do Senhor DEUS está sobre mim; porque o SENHOR me ungiu, para pregar boas novas aos mansos; enviou-me a restaurar os contritos de coração, a proclamar liberdade aos cativos, e a abertura de prisão aos presos; a apregoar o ano aceitável do SENHOR e o dia da vingança do nosso Deus; a consolar todos os tristes” (Isaías 61:1 -2).

O ministério de Cristo esteve atrelado ao evangelho, visto que Ele foi ungido para pregar boas novas, proclamar liberdade, apregoar o tempo aceitável de Deus, etc.

E o que Jesus anunciava como evangelista? A resposta vem a seguir:

“Quem crê em mim, como diz a Escritura, rios de água viva correrão do seu ventre” (João 7:38).

Em suma, quem crê em Cristo, crê no Pai, que enviou a Cristo.

“E Jesus clamou, e disse: Quem crê em mim, crê, não em mim, mas naquele que me enviou” (João 12:44);

“Para que todos honrem o Filho, como honram o Pai. Quem não honra o Filho, não honra o Pai que o enviou” (João 5:23).

À época de Cristo os judeus diziam crer em Deus e que eram seus servos, porém, tal crença era só de boca e não executavam a obra que Deus determinou, que é crer em Cristo.

“E ele, respondendo, disse-lhes: Bem profetizou Isaías acerca de vós, hipócritas, como está escrito: Este povo honra-me com os lábios, mas o seu coração está longe de mim; em vão, porém, me honram, ensinando doutrinas que são mandamentos de homens” (Marcos 7:6 -7).

Ciente desse entrave, Tiago desafiou os judeus a executarem a obra de Deus (crer em Cristo), em lugar de somente dizerem que tinham fé em Deus, pois a crença (fé) deles em Deus, sem crer em Cristo (obras), era morta, visto que até o diabo crê e estremece (Tiago 2:18-20).

“Meus filhinhos, não amemos de palavra, nem de língua, mas por obra e em verdade” (1 João 3:18);

“Confessam que conhecem a Deus, mas negam-no com as obras, sendo abomináveis, e desobedientes, e reprovados para toda a boa obra” (Tito 1:16);

“E eles vêm a ti, como o povo costumava vir, e se assentam diante de ti, como meu povo, e ouvem as tuas palavras, mas não as põem por obra; pois lisonjeiam com a sua boca, mas o seu coração segue a sua avareza. E eis que tu és para eles como uma canção de amores, de quem tem voz suave, e que bem tange; porque ouvem as tuas palavras, mas não as põem por obra.” (Ezequiel 33:31 -32).

A obra de Deus está vinculada a Cristo, pois o mandamento de Deus é que os homens creiam em Cristo para serem salvos e, ao crer, Deus salva o homem. Ora, a obra não diz de ações sociais ou, de práticas religiosas, antes, a obra de Deus é: a) crer que Jesus, o Cristo, é o Filho de Deus e a obra de um evangelista é; b) anunciar a todas as nações, que Cristo é o Filho de Deus.

Da relação mandamento e obediência, senhor e servo, temos uma obra, no entanto, o termo ‘obra’ pode ser empregado para destacar o que o homem professa, evidenciando, assim, a quem ele é sujeito.

“Por isso, se eu for, trarei à memória as obras que ele faz, proferindo contra nós palavras maliciosas; e, não contente com isto, não recebe os irmãos, e impede os que querem recebê-los, e os lança fora da igreja” (3 João 1:10).

O apóstolo João, ao escrever a Gaio, enfatizou que Diótrefes gostava de exercer a liderança na comunidade cristã e que não recebia o apóstolo João e, não somente isto, também, não recebia os irmãos e, ainda, impedia que outros cristãos acolhessem o apóstolo João e os irmãos, expulsando da comunidade aqueles que se predispunham a recebê-los (3 João 1:9-10).

Em especial destaque, o evangelista sublinha a ‘obra’ de Diótrefes: proferia palavras maliciosas contra os apóstolos. Percebe-se que Diótrefes não recebia os apóstolos, com medo de perder a primazia naquela comunidade e o subterfúgio que utilizava era falar mal dos apóstolos.

Ora, as obras de Diótrefes, com relação aos membros do corpo de Cristo, evidencia que ele não era sujeito a Cristo, a cabeça do corpo. Isso porque, todo que faz o mal é porque odeia a luz, ou seja, não obedece a Cristo.

“Porque todo aquele que faz o mal odeia a luz, e não vem para a luz, para que as suas obras não sejam reprovadas.” (João 3:20);

“Nenhum servo pode servir dois senhores; porque, ou há de odiar um e amar o outro, ou se há de chegar a um e desprezar o outro. Não podeis servir a Deus e a Mamom.” (Lucas 16:13).

O termo ‘odiar’ é contraponto ao termo ‘amar’, no sentido de obediência e desobediência. Quem não obedece a Cristo odeia a luz ou, seja, não serve a Cristo, consequentemente, faz o mal. Não vem para Cristo, para que as suas obras não sejam reprovadas.

“Confessam que conhecem a Deus, mas negam-no com as obras, sendo abomináveis, e desobedientes, e reprovados para toda a boa obra.” (Tito 1:16).

Essa era a condição dos escribas e fariseus: diziam obedecer a Deus, mas, as suas obras negavam o que diziam, pois, obedeciam a mandamentos de homens.

Embora Jesus soubesse de tudo o que o anjo da igreja de Laodiceia fazia, por meio do corpo ou, bem ou, mal (2 Coríntios 5:10), vale destacar novamente que, a obra em vista diz do que aquele ministro obedecia e proferia acerca de Cristo.

Apresentadas as observações acima, a constatação ‘nem és frio, nem quente’ não é um veredito próprio ao Tribunal de Cristo, visto que o tribunal de Cristo só será estabelecido quando a igreja estiver com Cristo.

O veredito dado por Cristo, evidencia que, por não obedecer de fato a Cristo, portanto, a sua confissão estava comprometida, aquele ‘anjo’ não servia para ser ministro do rebanho de Deus.

 

O dever de um ministro

Com relação à confissão, não há meio termo: admite-se que o Senhor Jesus é o Cristo ou, não. Qualquer outro evangelho que não é fundamentado nos profetas e na doutrina dos apóstolos, é anátema (Efésios 2:20; Gálatas 1:8-9).

Além de crer e confessar que Jesus é o Cristo (Romanos 10:9), um obreiro deve manejar bem a palavra da verdade, pois, só quando maneja bem a palavra de Deus, não tem do que se envergonhar.

“Procura apresentar-te a Deus aprovado, como obreiro que não tem de que se envergonhar, que maneja bem a palavra da verdade” (2 Timóteo 2:15).

Apesar de todos os cristãos serem passíveis de erros, na doutrina, o obreiro deve mostrar incorrupção, gravidade e sinceridade ou, seja, na palavra da verdade tem de ser perfeito.

“Em tudo te dá por exemplo de boas obras; na doutrina, mostra incorrupção, gravidade, sinceridade” (Tito 2:7);

“Porque todos tropeçamos em muitas coisas. Se alguém não tropeça em palavra, o tal é perfeito e poderoso para, também, refrear todo o corpo” (Tiago 3:2).

A missão de um obreiro, é ter cuidado do rebanho de Deus e o cuidado dispensado pelo ministro para o rebanho, é comparável ao cuidado de preparar uma noiva, como uma virgem pura, para o seu marido (2 Coríntios 11:2).

Um exemplo de cuidado, encontramos no apóstolo Paulo, que chamou os anciãos da igreja, que estava na cidade de Éfeso, e, antes de partir, no seu discurso de despedida, demonstrou que, desde o primeiro dia que anunciou o evangelho naquela região, portou-se, exemplarmente, servindo ao Senhor, humildemente, e suportou a oposição ferrenha dos judeus (Atos 20:18-19).

Ele enfatizou aos líderes daquela igreja local que, por causa das ciladas que os judeus armavam, serviu ao Senhor com muitas lágrimas e tentações, porém, sobressai da abordagem paulina o fato dele sempre declarar, tanto a judeus, quanto a gregos, que todos os povos devem se converter a Deus. Como? Arrependendo-se ou, seja, abandonando as suas concepções próprias de como se salvarem e crerem em Cristo (At 20:21).

Ora, um obreiro deve mostrar incorrupção na palavra do evangelho, cuidando de si mesmo e do rebanho sobre o qual foi constituído pelo Espírito Santo ‘bispo’ (Atos 20:28). Esse cuidado deve ser efetivo, pois, sempre surgirão ‘lobos cruéis’ que não poupam o ‘rebanho’ e, principalmente, porque, dentre os cristãos, surgem homens com mensagens que atraem os discípulos com discursos vãos (Atos 20:29-30).

A recomendação do apóstolo Paulo a Timóteo era para que ele conservasse o modelo das santas palavras que foram anunciadas: “Conserva o modelo das sãs palavras, que de mim tens ouvido, na fé e no amor que há em Cristo Jesus” (2 Timóteo 1:13).

Se o próprio Cristo não mudou o que foi anunciado pelo Pai, antes, falou segundo o que o Pai disse, não cabe ao ministro adaptar ou, mudar a mensagem do evangelho a seu bel prazer: “E sei que o seu mandamento é a vida eterna. Portanto, o que eu falo, falo-o como o Pai me tem dito” (João 12:50).

 

Tribunal de Cristo

O apóstolo Paulo deixou registrado que Deus julgará todos os homens, com relação às suas obras (Romanos 2:6) e que o julgamento, com relação às obras dos salvos em Cristo, se dará no tribunal de Cristo.

“E, se invocais por Pai aquele que, sem acepção de pessoas, julga segundo a obra de cada um, andai em temor, durante o tempo da vossa peregrinação” (1 Pedro 1:17);

“Porque todos devemos comparecer ante o tribunal de Cristo, para que cada um receba segundo o que tiver feito por meio do corpo, ou bem, ou mal” (2 Coríntios 5:10; Romanos 14:10).

O apóstolo Paulo tinha ciência de que, se fizesse a obra do ministério por obrigação, não seria recompensado, mas, se de boa vontade, seria premiado no Tribunal de Cristo.

“E por isso, se o faço de boa mente, terei prêmio; mas, se de má vontade, apenas uma dispensação me é confiada” (1 Coríntios 9:17).

O julgamento no Tribunal de Cristo trará a lume as intenções dos corações dos cristãos, quando no desempenho de suas ações quanto à divulgação do nome de Cristo, quando cada qual receberá o louvor de Deus, pois há quem anuncia o evangelho de boa mente e quem julga acrescentar dor a seu irmão (Filipenses 1:15-16).

“Portanto, nada julgueis antes de tempo, até que o Senhor venha, o qual também trará à luz as coisas ocultas das trevas, e manifestará os desígnios dos corações; e então cada um receberá de Deus o louvor” (1 Coríntios 4:5).

O irmão Tiago, por sua vez, alerta os cristãos convertidos, dentre os judeus, a não desejarem ser mestres, pelo seguinte motivo: os mestres receberão juízo mais severo, pois ao que é dado muito, muito se cobrará (Tiago 3:1).

“Mas o que a não soube, e fez coisas dignas de açoites, com poucos açoites será castigado. E, a qualquer que muito for dado, muito se lhe pedirá, e ao que muito se lhe confiou, muito mais se lhe pedirá” (Lucas 12:48).

O juízo do Tribunal de Cristo não é um juízo de condenação, visto que a condenação da humanidade se deu em Adão e a salvação se dá em Cristo. No Tribunal de Cristo, o julgamento é de mérito e visa recompensar cada salvo, segundo o que fizeram por meio do corpo, bem ou, mal.

“E se alguém ouvir as minhas palavras, e não crer, eu não o julgo; porque eu vim, não para julgar o mundo, mas para salvar o mundo” (João 12:47; 1 João 4:14).

 

Ministro reprovado

“Conheço as tuas obras, que nem és frio nem quente; quem dera foras frio ou quente!” (Apocalipse 3:15)

O evangelista João foi comissionado por Jesus a escrever às sete igrejas situadas nas regiões da Ásia menor: Éfeso, Esmirna, Pérgamo, Tiatira, Sardes, Filadélfia e Laodiceia (Apocalipse 1:4 e 11). O Livro do Apocalipse deveria ser remetido às sete igrejas, mas, no bojo do livro, continha uma nota dedicada a cada ministro das igrejas, nota essa que todas as igrejas tomaram conhecimento.

A repreensão contida nas cartas aos anjos das igrejas segue o mesmo princípio que consta da carta do apóstolo Paulo a Timóteo:

“Não aceites acusação contra o presbítero, senão com duas ou três testemunhas. Aos que pecarem, repreende-os na presença de todos, para que também os outros tenham temor” (1 Timóteo 5:20).

A recomendação do apóstolo Paulo dada a Timóteo foi seguida à risca, quando o apóstolo e presbítero Pedro adotou um comportamento repreensível, e foi repreendido, na presença de todos (1 Pedro 5:1; Gálatas 2:11-17).

Através das cartas, fica evidente que, caso o ministro não mudasse de concepção (metanoia), após a repreensão, que o seu ‘candeeiro’ (Apocalipse 1:20) seria removido (Apocalipse 2:5; Apocalipse 2:16 e Apocalipse 3:3).

O alerta: ‘Conheço as tuas obras’, dada ao ministro de Laodiceia, destaca que nada escapa aos olhos do Filho de Deus, pois, são olhos como de fogo: “E não há criatura alguma encoberta diante dele; antes, todas as coisas estão nuas e patentes aos olhos daquele com quem temos de tratar” (Hebreus 4:13; Apocalipse 1:14).

O diagnóstico emitido é terrível: ‘nem és frio, nem quente’. A obra produzida pelo anjo da igreja de Laodiceia o expunha como inócuo, alguém que não se posicionava com relação à verdade do evangelho. No evangelho, não se admite neutralidade: nem na confissão, nem no labor.

“Este era instruído no caminho do Senhor e, fervoroso de espírito, falava e ensinava diligentemente as coisas do SENHOR, conhecendo somente o batismo de João” (Atos 18:25);

“Não sejais vagarosos no cuidado; sede fervorosos no espírito, servindo ao Senhor” (Romanos 12:11).

Os termos ‘quente’, ‘frio’ e ‘morno’ são figurativos, demonstrando que aquele ministro foi ‘provado’ e achado em falta diante de Deus. Seria melhor que Ele fosse uma coisa ou, outra. Como cristão deveria batalhar pela doutrina do evangelho (quente) ou, que fosse descrente (frio), o que não podia era ficar coxeando entre dois pensamentos (1 Reis 18:21).

Ora, se fosse ‘quente’, aquele ministro estaria aprovado e se fosse ‘frio’, a mensagem seria de mudança de concepção (arrependimento=metanoia). No entanto, conforme o apelo, ao final da carta: “Sê, pois, zeloso e arrepende-te”, vê-se que a repreensão estipula a necessidade de zelo e que o arrependimento é com relação à letargia.

Ora, convencer judeu ao evangelho é mais fácil do que convencer um judaizante ou, seja, aquele que se diz cristão, mas, que deita fermento à massa (Mateus 16:12). Semelhantemente, é mais fácil converter um gentio do que um prosélito, pois, o estado deste é pior do que o daquele: “Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas! pois, que percorreis o mar e a terra para fazer um prosélito; e, depois de o terdes feito, o fazeis filho do inferno, duas vezes mais do que vós” (Mateus 23:15).

Após o anjo de Laodiceia ter sido ‘provado’, o veredito foi: ‘És morno’ ou, seja, nem quente, nem frio, consequentemente, seria rejeitado, caso não se arrependesse. A abordagem de Cristo ao anjo da igreja não foi de imposição, mas na base do apelo, e, até mesmo, expressa desejo:

“Quem dera fosses frio ou quente” (Apocalipse 3:15).

A apatia ministerial no cuidado para com a igreja denunciava algo grave naquele ministro: estava se demovendo da fé! A displicência no cuidado, a falta de vigor na defesa do rebanho, a letargia na instrução dos membros do corpo de Cristo, denunciam a quantas está a base do ministro.

“Vós, portanto, amados, sabendo isto de antemão, guardai-vos de que, pelo engano dos homens abomináveis, sejais juntamente arrebatados, e descaiais da vossa firmeza” (2 Pedro 3:17).

Ao escrever a Tito, o apóstolo Paulo reitera que Jesus entregou-se para remir os homens, tomando para si um povo especial, um povo que é zeloso de boas obras “O qual se deu a si mesmo por nós, para nos remir de toda a iniquidade e purificar para si um povo seu, especial, zeloso de boas obras” (Tito 2:14).

Os ministros foram comissionados a cuidarem do rebanho e, só é possível cuidar do rebanho quando o ministro olha por si mesmo e cuida da doutrina.

“Olhai, pois, por vós, e por todo o rebanho sobre que o Espírito Santo vos constituiu bispos, para apascentardes a igreja de Deus, que ele resgatou com seu próprio sangue” (Atos 20:28);

“Tem cuidado de ti mesmo e da doutrina. Persevera nestas coisas; porque, fazendo isto, te salvarás, tanto a ti mesmo como aos que te ouvem” (1 Timóteo 4:16).

‘Boas obras’ não diz de boas ações, ações de caridade, ações humanitárias, obras sociais, etc., antes diz da boa confissão, a obra de Deus, que é crer em Cristo. A igreja de Deus é um povo especial, zeloso da doutrina, pois, por meio do evangelho, o crente se salva e leva à salvação os que ouvem.

 

A confissão

Mas, por que aquele ministro foi classificado como ‘morno’? Por que ele era inútil a ponto ser rejeitado?

O motivo está no verso 17:

“Como dizes: Rico sou, e estou enriquecido, e de nada tenho falta; e não sabes que és um desgraçado, e miserável, e pobre, e cego, e nu”.

Através daquilo que o ministro de Laodiceia dizia tem-se um diagnóstico preciso do que estava ocorrendo, pois o ‘fruto dos lábios’ dele denuncia qual doutrina que ele tinha abraçado, em detrimento da verdade do evangelho.  A essência da ‘mornidão’ está na seguinte confissão: “Rico sou, estou enriquecido e de nada tenho falta” (Apocalipse 3:17).

O evangelista João ordena aos cristãos que provem os espíritos (palavras, mensagem), se eles são de Deus ou, não.

“AMADOS, não creiais a todo o espírito, mas provai se os espíritos são de Deus, porque já muitos falsos profetas se têm levantado no mundo. Nisto conhecereis o Espírito de Deus: Todo o espírito que confessa que Jesus Cristo veio em carne é de Deus; E todo o espírito que não confessa que Jesus Cristo veio em carne não é de Deus; mas este é o espírito do anticristo, do qual já ouvistes que há de vir, e eis que já está no mundo” (1 João 4:1 -3).

É através da confissão que se verifica se alguém é mensageiro de Deus ou, se é falso profeta. Jesus mesmo disse que um falso profeta se identifica pelo fruto e não pela aparência exterior (Mateus 7:15-16).

Qual é o ‘fruto’ produzido por um falso profeta? Como o ouvido prova as palavras, assim, como o paladar prova a comida, certo é que o fruto de um falso profeta é aquilo que ele professa: “Porque o ouvido prova as palavras, como o paladar experimenta a comida” (Jó 34:3). Por exemplo: se um espírito ‘professa’ que Jesus não veio em carne, esse espírito não é de Deus.

A origem da reprovação do anjo de Laodiceia possui relação intima com o que ele dizia: “Rico sou!”. Quando em carne, Jesus havia dito: “Como ouço, assim julgo; e o meu juízo é justo, porque não busco a minha vontade, mas a vontade do Pai que me enviou” (João 5:30). Enquanto os homens julgavam segundo a aparência, Cristo julgava segundo a reta justiça, segundo a palavra de Deus (João 7:24).

Cristo julgava segundo o que ouvia porque a boca fala do que o coração está cheio: “O homem bom, do bom tesouro do seu coração tira o bem e o homem mau, do mau tesouro do seu coração tira o mal, porque da abundância do seu coração fala a boca” (Lucas 6:45) e, através, dos frutos dos lábios, ele determinava se o homem era uma árvore boa ou, má: “Raça de víboras, como podeis vós dizer boas coisas, sendo maus? Pois do que há em abundância no coração, disso fala a boca” (Mateus 12:34).

 

O fruto

O fruto, como figura, faz referência à confissão do homem, conforme exposição do escritor aos Hebreus:

“Portanto, ofereçamos sempre por ele a Deus sacrifício de louvor, isto é, o fruto dos lábios que confessam o seu nome” (Hebreus 13:15).

Jesus disse que quem está ligado à videira produz fruto (João 15:5) e um fruto que glorifica a Deus (João 15:8). Ora, para ser um ramo que produz fruto que glorifica a Deus, primeiro o homem tem que estar ligado à videira.

Outra figura que representa o homem é a ‘árvore’, para demonstrar que o homem professa uma doutrina, segundo a semente que lhe deu origem, vez que as árvores produzem fruto, segundo a sua espécie.

Os que são ‘plantados pelo Pai’ professam que Jesus é o Cristo (Mateus 15:13), ou seja, produzem o fruto dos lábios que Deus criou: paz, paz, tanto para os que estão longe (gentios), quanto para os que estão perto (judeus): Jesus, o príncipe da paz (Isaías 57:19). O homem é plantação de Deus, quando é nascido da semente incorruptível, que é a palavra de Deus (Isaías 60:21; Salmo 103:15; Isaías 40:6).

Para os que creem em Cristo há paz, pois são renovos plantados pelo Senhor e permanecerão para sempre. Os ímpios, por sua vez, desde a madre, se desviaram e proferem mentiras, portanto, para eles não há paz, antes o machado já está posto sobre a sua raiz (Mateus 3:10).

Quando crê em Cristo Jesus como Senhor, o homem passa a estar ligado à videira e quando confessa a Cristo produz o fruto que glorifica a Deus: Jesus de Nazaré é o Cristo.

“A saber: Se com a tua boca confessares ao Senhor Jesus, e em teu coração creres que Deus o ressuscitou dentre os mortos, serás salvo” (Romanos 10:9; Isaías 61:3).

E como se classifica quem produz uma confissão (fruto) dessa espécie: “Rico sou, estou enriquecido e de nada tenho falta”?

Somente um ‘louco’! Quem são os ‘loucos’, ou os ‘néscios’? Os loucos são os religiosos judeus que desprezavam a palavra de Deus e seguiam mandamentos de homens. A ‘loucura’, ‘o desvario’ é um modo de fazer referência aos judaizantes, através de uma figura utilizada pelos profetas.

Os profetas, por diversas vezes, chamaram o povo de Israel de loucos:

“Eu, porém, disse: Deveras estes são pobres; são loucos, pois não sabem o caminho do SENHOR, nem o juízo do seu Deus” (Jeremias 5:4);

“Assim diz o Senhor DEUS: Ai dos profetas loucos, que seguem o seu próprio espírito e que nada viram!” (Ezequiel 13:3).

O profeta Moisés já havia conferido essa alcunha ao povo de Israel, termo que foi amplamente utilizado como figura para fazer referência ao povo de Israel.

“Recompensais assim ao SENHOR, povo louco e ignorante? Não é ele teu pai que te adquiriu, te fez e te estabeleceu?” (Deuteronômio 32:6).

Ao repreender os dois discípulos, no caminho de Emaus, Jesus os chamou de néscios, pois não compreendiam as palavras dos profetas:

“E ele lhes disse: Ó néscios, e tardos de coração para crer tudo o que os profetas disseram!” (Lucas 24:25).

O apóstolo Paulo fez referência aos líderes judaicos, como instrutor dos néscios.

“Instrutor dos néscios, mestre de crianças, que tens a forma da ciência e da verdade na lei” (Romanos 2:20).

Na parábola do homem rico há um veredito: – ‘Louco!’. Entende-se, através, da figura ‘louco’, que o homem que possuía uma herdade e que produziu muito, era judeu. Observe:

“E propôs-lhe uma parábola, dizendo: A herdade de um homem rico tinha produzido com abundância; E ele arrazoava consigo mesmo, dizendo: Que farei? Não tenho onde recolher os meus frutos. E disse: Farei isto: Derrubarei os meus celeiros, e edificarei outros maiores, e ali recolherei todas as minhas novidades e os meus bens; E direi a minha alma: Alma, tens em depósito muitos bens para muitos anos; descansa, come, bebe e folga. Mas Deus lhe disse: Louco! esta noite te pedirão a tua alma; e o que tens preparado, para quem será? Assim é aquele que para si ajunta tesouros, e não é rico para com Deus” (Lucas 12:16 -21).

A conclusão da parábola do rico louco remete à ideia de que, quem confia em si mesmo, ou, na multidão de suas riquezas, mas, não é rico para com Deus, é um louco.  A questão abordada pela parábola não diz de riquezas materiais, antes, evidencia em quem o homem confia, como se lê em Deuteronômio:

“E digas no teu coração: A minha força, e a fortaleza da minha mão, me adquiriu este poder. Antes te lembrarás do SENHOR teu Deus, que ele é o que te dá força para adquirires riqueza; para confirmar a sua aliança, que jurou a teus pais, como se vê neste dia” (Deuteronômio 8:17 -18).

O profeta Jeremias faz uma releitura do exposto pelo profeta Moisés, quando diz:

“Ó meu monte no campo! a tua riqueza e todos os teus tesouros darei por presa, como também os teus altos, por causa do pecado, em todos os teus termos. Assim por ti mesmo te privarás da tua herança que te dei, e far-te-ei servir os teus inimigos, na terra que não conheces; porque o fogo que acendeste na minha ira arderá para sempre. Assim diz o SENHOR: Maldito o homem que confia no homem, e faz da carne o seu braço, e aparta o seu coração do SENHOR!” (Jeremias 17:3 -5).

A parábola que Jesus contou, tem por base essas duas passagens bíblicas e a conclusão da parábola decorre do seguinte verso:

“Como a perdiz, que choca ovos que não pôs, assim é aquele que ajunta riquezas, mas não retamente; no meio de seus dias as deixará, e no seu fim será um insensato” (Jeremias 17:11).

Daí o alerta:

“Assim diz o SENHOR: Não se glorie o sábio na sua sabedoria, nem se glorie o forte na sua força; não se glorie o rico nas suas riquezas, Mas o que se gloriar, glorie-se nisto: em me entender e me conhecer, que eu sou o SENHOR, que faço beneficência, juízo e justiça na terra; porque destas coisas me agrado, diz o SENHOR” (Jeremias 9:23 -24).

A loucura do povo de Israel decorria da ignorância, acerca das coisas de Deus (Romanos 10:2). Só é possível ao homem ser rico diante de Deus, quando herda bens de Deus. Mas, como o povo de Israel poderia herdar algo de Deus, se era uma geração perversa e distorcida? Como não eram filhos, antes uma mancha, nada herdariam de Deus (Deuteronômio 32:5).

É por isso que Jesus se referia aos escribas e fariseus como geração perversa, má e adúltera. Por serem maus, o fruto que produziam era mau, segundo o coração mentiroso que herdaram de Adão (Mateus 12:34).

Quando o apóstolo Paulo diz: “Mas os homens maus e enganadores irão de mal para pior, enganando e sendo enganados” (2 Timóteo 3:13), estava fazendo alusão aos judaizantes, pois eram maus, segundo a natureza herdada de Adão e destilavam o engano, segundo o coração que possuíam, pois a boca fala do que o coração está cheio (Isaías 58:3).

É possível um homem que exerce o ministério falar como um louco? O que estava acontecendo com o anjo da igreja de Laudiceia? O anjo da igreja de Laodiceia estava se tornando ‘néscio’, pois se vangloriava da sua condição e não em saber que Deus faz beneficência, juízo e justiça na terra (Jeremias 9:23-24).

O Pregador diz: “Do fruto da boca de cada um se fartará o seu ventre; dos renovos dos seus lábios ficará satisfeito” (Provérbios 18:20), uma característica que depreendemos da confissão do ministro de Laodiceia. Por causa da abundância do que estava no seu coração, ele confessou que estava rico e abastado. Ele era alguém que fez do seu ventre o seu deus e estava satisfeito em servir a si mesmo, de modo que os seus lábios produziam os seus renovos, não o fruto próprio de quem está ligado à videira.

Da colheita dos lábios de um louco, se verifica que ele está satisfeito, pois, diz: “Rico sou!”, ou: “Alma, tens em depósito muitos bens, para muitos anos; descansa, come, bebe e folga”, mas, é alguém que não é rico para com Deus.

Como ajuntar tesouro no céu? (Mateus 6:20) Jesus explica que quem for injuriado e perseguido e, mentindo, disserem todo mal contra tal pessoa, por causa do Seu nome, terá grande galardão nos céus. Confessar a Cristo é meio para alcançar salvação e sofrer perseguição, por causa do evangelho, é o que confere tesouro nos céus!

“Bem-aventurados sois vós, quando vos injuriarem e perseguirem e, mentindo, disserem todo o mal contra vós por minha causa. Exultai e alegrai-vos, porque é grande o vosso galardão nos céus; porque assim perseguiram os profetas que foram antes de vós.” (Mateus 5:11 -12).

Há um alerta no Livro dos Provérbios que, se for obedecido, evita que o cristão tropece, à semelhança do ministro de Laodiceia:

“QUANDO te assentares a comer com um governador, atenta bem para o que é posto diante de ti, E se és homem de grande apetite, põe uma faca à tua garganta. Não cobices as suas iguarias porque são comidas enganosas. Não te fatigues para enriqueceres; e não apliques nisso a tua sabedoria. Porventura fixarás os teus olhos naquilo que não é nada? porque certamente criará asas e voará ao céu como a águia. Não comas o pão daquele que tem o olhar maligno, nem cobices as suas iguarias gostosas. Porque, como imaginou no seu coração, assim é ele. Come e bebe, te disse ele; porém o seu coração não está contigo. Vomitarás o bocado que comeste, e perderás as tuas suaves palavras. Não fales ao ouvido do tolo, porque desprezará a sabedoria das tuas palavras. Não removas os limites antigos nem entres nos campos dos órfãos, porque o seu redentor é poderoso; e pleiteará a causa deles contra ti” (Provérbios 23:1 -11).

É recomendado no livro dos Provérbios atentar para o alimento que é servido, não para a posição da pessoa que se assenta em lugar de destaque. As pessoas se deslumbram com a posição daqueles que estão em destaque, mas, se esquecem de julgar o que eles põem à mesa e servem aos convidados.

O alimento servido não diz de comida, antes de palavras, espírito, pois o que contamina o homem não é o que entra, mas, o que sai.

“Mas, o que sai da boca, procede do coração, e isso contamina o homem” (Mateus 15:18).

O alimento na Bíblia, dependendo do contexto, é uma figura que remete a uma doutrina e, por isso, deve ser analisada segundo os símiles e parábolas contidas nas Escrituras. As determinações contidas na lei, através de figuras, eram interpretadas de modo literal e não consideravam que: “Os alimentos são para o estômago e o estômago para os alimentos; Deus, porém, aniquilará tanto um como os outros” (1 Coríntios 6:13).

A figura tornou-se mais importante que a realidade para os judeus, de modo que cuidavam da limpeza de utensílios, mas, o que contaminava era a doutrina (fermento) dos fariseus.

Por causa das prescrições da lei, acerca dos alimentos, os judeus ficavam alertas com o que era posto à mesa e com o lavar dos utensílios e as mãos, porém, quando assentavam com as pessoas de destaque, não atentavam para o que ensinavam. Jesus corrigiu essa distorção, demonstrando que o que sai da boca do homem é o que, realmente, contamina o homem e, nesse quesito, não deveriam confiar no companheiro e nem nos príncipes, em Israel (Miqueias 7:5; Salmo 146:3; Salmo 62:10).

Se alguém é voraz no ‘apetite’, é melhor o suicídio, pois, não analisará o que é dito, e se alimentará das iguarias do governador. A pessoa assentada com alguém de destaque (chefe, governador, grande, líder) se encanta com a posição de quem está à mesa e se esquece de considerar, segundo as Escrituras, que o que procede do coração do ‘governador’ é o que o contamina.

Se alguém não possui domínio próprio e deseja as iguarias deste mundo, jamais fará como Moisés, que desprezou ser chamado de filho da filha de Faraó (Hebreus 11:24).

A ordem é clara: não cobices os seus manjares, pois são alimentos de engano, mentira. É impossível provar através do paladar a comida, em análise, pois, em se tratando de engano, tal alimento é absorvido pelo ouvido e contamina o coração.

O ministro de Laodiceia alcançou a posição de liderança na igreja, por ser um discípulo de Cristo, mas, provavelmente, caiu da graça, por não provar os espíritos (1 João 4:1; Gálatas 5:4). É a típica terra semeada, cuja semente caiu em meio aos espinhos, vez que os cuidados deste mundo e a sedução das riquezas sufocaram a palavra, tornando-se infrutífera. Se alguém é infrutífero, o veredito está estabelecido: corta e lança no fogo!

“E o que foi semeado entre espinhos é o que ouve a palavra, mas os cuidados deste mundo, e a sedução das riquezas sufocam a palavra, e fica infrutífera” (Mateus 13:22);

“Toda a vara em mim, que não dá fruto, a tira” (João 15:2).

O ministro de Laodiceia deixou de ser servo de Cristo e passou a servir a si mesmo, o que é impossível (Mateus 6:24). É tênue a linha entre servir ao Senhor e servir a si mesmo, buscando riquezas, para o seu próprio ventre. Basta fixar os olhos naquilo que não é nada, ou seja, nas coisas que se veem, que deixará de olhar para Cristo e deixará escapar as coisas que não se veem (Hebreus 12:2).

“Não atentando nós nas coisas que se veem, mas nas que se não veem; porque as que se veem são temporais, e as que se não veem são eternas” (2 Coríntios 4:18).

O ministro de Laodiceia portou-se como a perdiz, consequentemente, chocou ovos que não botou:

“Como a perdiz, que choca ovos que não pôs, assim é aquele que ajunta riquezas, mas não retamente; no meio de seus dias as deixará, e no seu fim será um insensato.” (Jeremias 17:11).

A recomendação é para não comer o pão de quem tem o olhar maligno e nem cobiçar as suas iguarias. O homem maligno é conforme a imaginação do seu próprio coração e, como o coração do homem é maligno, será maligno, continuamente. Se o coração é enganoso, a boca só destilará o engano e maldito será quem sorver as suas iguarias.

“Como o caco de vaso coberto de escórias de prata, assim são os lábios ardentes com o coração maligno” (Provérbios 26:23);

“Enganoso é o coração, mais do que todas as coisas, e perverso; quem o conhecerá?” (Jeremias 17:9).

A má leitura da carta ao ministro de Laodiceia fomenta inúmeros discursos vãos, como: “Deus, que conhece todas as nossas obras, requer de nós uma vida cristã bem definida”; ou: “Deus não quer uma igreja composta de crentes mais ou, menos”; ou, “O cristianismo ficou barato e promocional”, que nada informa ou acrescenta segundo o evangelho.

Enquanto o conteúdo da carta aponta para quem exerce o ministério sem conhecer a palavra da verdade, visto que não maneja bem a palavra da verdade ou, que se obscureceu, seguindo vãs filosofias e discursos vãos, os discursos dos pregadores, em nossos, dias visam somente a membresia das comunidades.

 

Riquezas apodrecidas

A linguagem da carta de Tiago é a mesma da carta escrita pelo apóstolo João ao anjo de Laodiceia, e o motivo é a nacionalidade, tanto dos remetentes, quanto dos destinatários das cartas. Tiago escreveu a cristãos judeus e o ministro da igreja em Laodiceia era um cristão de origem judaica.

Ao escrever às doze tribos da dispersão, Tiago destaca algumas questões:

  1. O homem de coração ‘dobre’ é inconstante em seus caminhos Tiago 1:8);
  2. Questões sociais não são relevantes em Cristo, pois o homem de condição humilde deve gloriar-se da sua posição em Cristo e o rico deve gloriar-se na sua insignificância, porque passará como a flor da erva (Tiago 1:9-10; Ezequiel 21:26);
  3. O dever de perseverar crendo em Cristo (Tiago 1:25);
  4. Aos que ainda se diziam religiosos, mas, que não possuem domínio sobre a língua, vez que acusam Deus de tentá-lo (Tiago 1:13), em lugar de ouvir, é precipitado a votar (Eclesiastes 5:1) e segue discursos vãos (Tiago 1:22), engana-se a si mesmo, pois, a sua religião é vã (Tiago 1:26);
  5. Não podiam fazer acepção de pessoas, desprezando os gentios e acolhendo somente os judeus (Tiago 2:1); o homem maltrapilho ou, o homem com anel, são exemplos para contrapor à recepção dada aos judeus e aos não judeus, nas comunidades de cristãos, entre os judeus;
  6. Os ‘ricos’, no contexto, ganha ressignificação e torna-se uma alcunha para aqueles que mataram o Cristo (Tiago 5:6) e os pobres, por sua vez, os que creram em Cristo, que fossem os cristãos dentre os gentios ou, os cristãos dentre os judeus: “Mas, vós desonrastes o pobre. Porventura, não vos oprimem os ricos e não vos arrastam aos tribunais?” (Tiago 2:6; Lucas 6:20-26);
  7. Muitos judeus diziam ter fé em Deus, porém, não executaram o mandamento que resulta em Sua obra: crer em Cristo;
  8. Muitos cristãos judeus queriam ser mestres, porque possuíam no judaísmo tal posição, porém, ainda tropeçavam na palavra da verdade, o que os tornava inaptos para tal ministério (Tiago 3:2);
  9. Todas essas questões fariam com que jorrasse dois tipos de água de uma mesma fonte (Tiago 3:11), de modo que o sábio e entendido deveria ter um bom trato com todos os homens e não um sentimento faccioso, fomentando divisão entre judeus e gentios (Tiago 3:14);
  10. Por terem um coração de duplo ânimo, deveriam se purificar, deixando as questões judaizantes para alcançar a verdade em Cristo (Tiago 4:8);
  11. Deveriam sentir as suas misérias, lamentar e chorar e não se gloriarem em suas presunções (Tiago 4:16);
  12. Através de uma parábola, Tiago descreve a condição dos Judeus que condenaram e mataram o Cristo: “EIA, pois, agora vós, ricos, chorai e pranteai, por vossas misérias, que sobre vós hão de vir. As vossas riquezas estão apodrecidas e as vossas vestes estão comidas de traça. O vosso ouro e a vossa prata se enferrujaram; e a sua ferrugem dará testemunho contra vós, e comerá como fogo a vossa carne. Entesourastes para os últimos dias. Eis que o jornal dos trabalhadores que ceifaram as vossas terras e que por vós foi diminuído, clama; e os clamores dos que ceifaram entraram nos ouvidos do Senhor dos exércitos. Deliciosamente, vivestes sobre a terra e vos deleitastes; cevastes os vossos corações, como num dia de matança. Condenastes e matastes o justo; ele não vos resistiu” (Tiago 5:1-6);

13. Ao final da epístola, Tiago complementa: “Irmãos, se algum dentre vós se tem desviado da verdade e alguém o converter, saiba que aquele que fizer converter do erro do seu caminho um pecador, salvará da morte uma alma, e cobrirá uma multidão de pecados” (Tiago 5:19-20).

Jesus deu aviso que, se a palavra de Deus é semeada e cai entre espinhos, não dá fruto com perfeição, ou seja, surge um fruto imperfeito, que é o mesmo que pecar:

“E a que caiu entre espinhos, esses são os que ouviram e, indo por diante, são sufocados com os cuidados e riquezas e deleites da vida, e não dão fruto com perfeição” (Lucas 8:14).

Que relação há entre a figura dos ‘espinhos’ e os ‘cuidados e riquezas da vida’? Ora, o espinho é uma figura utilizada pelo profeta Miqueias para ilustrar os homens que se dizem justos.

“O melhor deles é como um espinho; o mais reto é pior do que a sebe de espinhos; veio o dia dos teus vigias, veio o dia da tua punição; agora será a sua confusão” (Miqueias 7:4);

“E tu, ó filho do homem, não os temas, nem temas as suas palavras; ainda que estejam contigo sarças e espinhos, e tu habites entre escorpiões, não temas as suas palavras, nem te assustes com os seus semblantes, porque são casa rebelde” (Ezequiel 2:6).

O melhor dos homens é comparável a um espinho, mas o mais reto dos homens compara-se a uma sebe de espinhos. O que isso significa? Que há homens que se consideram justos aos seus próprios olhos, mas, que diante de Deus, são como ‘espinhos’. Acerca desses homens, Jesus contou uma parábola, a do escriba e do fariseu:

“E disse também esta parábola a uns que confiavam em si mesmos, crendo que eram justos, e desprezavam os outros” (Lucas 18:9; Lucas 7:30).

Ora, semear o evangelho em meio aos religiosos judeus, homens justos aos seus próprios olhos, faz com que o convertido a Cristo não dê fruto com perfeição. Semear entre os judeus e/ou judaizantes é o mesmo que semear entre ‘espinhos’.

Sobre esse aspecto, já havia alertado o profeta Jeremias: Não semeiem entre espinhos!

“SE voltares, ó Israel, diz o SENHOR, volta para mim; e se tirares as tuas abominações de diante de mim, não andarás mais vagueando, E jurarás: Vive o SENHOR na verdade, no juízo e na justiça; e nele se bendirão as nações, e nele se gloriarão. Porque assim diz o SENHOR aos homens de Judá e a Jerusalém: Preparai para vós o campo de lavoura, e não semeeis entre espinhos. Circuncidai-vos ao SENHOR, e tirai os prepúcios do vosso coração, ó homens de Judá e habitantes de Jerusalém, para que o meu furor não venha a sair como fogo, e arda de modo que não haja quem o apague, por causa da malícia das vossas obras” (Jeremias 4:1 -4).

Os falsos ‘justos’ em Israel, quando percebiam que a semente lançada estava germinando no coração de alguém, desviavam a atenção do convertido a Cristo para os cuidados deste mundo, que ao ser seduzido pelas riquezas, sufocava a palavra e tornava-se infrutífero (Mateus 13:22). Se a vara fica infrutífera é arrancada e lançada no fogo (João 15:2).

Ora, a parábola trabalha com figuras, de modo que os ‘cuidados deste mundo’ e a ‘sedução das riquezas’ não significa que as pessoas se perdem porque cuidam dos seus afazeres diários, antes, que os seduzidos pela religiosidade dos judaizantes (riqueza) passam a cuidar de dias de festas, luas novas, sábados, ordenanças, etc. (Colossenses 2:16-23).

Quando escreveu aos cristãos da cidade de Colossos, vemos a preocupação do apóstolo Paulo com os cristãos de Colossos e de Laodiceia (Colossenses 2:1), pois o apóstolo não teve um contato pessoal com eles. O contato só foi por cartas e por intermédio de Epafras.

O apóstolo Paulo elogia o líder da igreja local, Epafras, demonstrando que ambos eram servos de Cristo e que, com relação aos cristãos de Colossos, Epafras era um fiel ministro de Cristo (Colossenses 1:7). Ao que parece, Epafras cuidava de três comunidades: Colossos, Laodiceia e Hierápolis (Colossenses 4:13).

É significativo o fato de o apóstolo Paulo lembrar que, em Cristo estão escondidos todos os tesouros da sabedoria e da ciência, de modo que quem está em Cristo é enriquecido com a plenitude da inteligência (Colossenses 2:2-3) e, em seguida, alertar para que ninguém se deixasse levar por palavras persuasivas (Colossenses 2:4).

Perigos mil rondavam os cristãos de Colossos, portanto, rondavam, também, os de Laodiceia. Que tipo de perigo? Filosofias e vãs sutilizas, decorrentes da tradição dos homens, com base nos princípios do mundo (Colossenses 2:8 e 22).

Ora, inicialmente o ministro da igreja de Laodiceia foi comissionado como líder daquela igreja por professar o evangelho de Cristo, porém, com o passar do tempo, é bem provável que se deixou seduzir pelas concupiscências loucas e nocivas e acabou submergindo na ruína e na perdição.

Acerca dos que caem em ruína, disse o apóstolo Paulo:

“Porque muitos há, dos quais muitas vezes vos disse, e agora também digo, chorando, que são inimigos da cruz de Cristo, cujo fim é a perdição; cujo Deus é o ventre, e cuja glória é para confusão deles, que só pensam nas coisas terrenas” (Filipenses 3:18 -19).

O alerta que foi dado a Arquipo, talvez, não tenha sido levado com seriedade pelo anjo de Laodiceia, visto que a carta endereçada aos Colossenses foi lida entre os de Laodiceia e Filipos.

“E dizei a Arquipo: Atenta para o ministério que recebeste no Senhor, para que o cumpras” (Colossenses 4:17).

Ao escrever aos de Filipos, o apóstolo Paulo indica o perigo que os rondava: a doutrina dos judaizantes, através de figuras contidas nos profetas:

“Guardai-vos dos cães, guardai-vos dos maus obreiros, guardai-vos da circuncisão” (Filipenses 3:2).

Quem são os ‘cães’? O termo empregado pelo apóstolo dos gentios não era um xingamento, antes, um termo empregado pelo profeta Isaías:

“Todos os seus atalaias são cegos, nada sabem; todos são cães mudos, não podem ladrar; andam adormecidos, estão deitados, e gostam do sono. E estes cães são gulosos, não se podem fartar; e eles são pastores que nada compreendem; todos eles se tornam para o seu caminho, cada um para a sua ganância, cada um por sua parte” (Isaías 56:10 -11; Salmo 58:4 -5).

Os vigias de Israel não passavam de homens cegos, pois nada sabiam. Uma testemunha em Israel só podia testemunhar do que viu e ouviu e, como os ‘vigias’ nada sabiam, por certo eram cegos, ou seja, não eram testemunhas de Deus.

“Por boca de duas testemunhas, ou três testemunhas, será morto o que houver de morrer; por boca de uma só testemunha não morrerá” (Deuteronômio 17:6).

Além de cegos, eram mudos, portanto, cães que não latiam, ou seja, que não davam o aviso diante do perigo. A figura não ilustra tão somente isso, mas, indica que os líderes de Israel eram cães gulosos, ou seja, que não se fartavam. Em seguida é apontado quem são os cães: os pastores, que nada compreendem, pois, cada qual segue o seu próprio caminho, ou seja, serve à sua própria ganância e não segue o caminho da paz.

Era imprescindível que a igreja se guardasse dos falsos pastores, que nada compreendiam, dos maus obreiros e dos da circuncisão ou, seja, dos judaizantes.

 

Ouro provado, roupas brancas e colírio

“Aconselho-te que de mim compres ouro provado no fogo, para que te enriqueças; e roupas brancas, para que te vistas, não apareça a vergonha da tua nudez; e que unjas os teus olhos com colírio, para que vejas” (Apocalipse 3:18).

O aconselhamento que consta do Apocalipse, também, consta dos profetas, como se lê:

“Ó VÓS, todos os que tendes sede, vinde às águas, e os que não tendes dinheiro, vinde, comprai, e comei; sim, vinde, comprai, sem dinheiro e sem preço, vinho e leite. Por que gastais o dinheiro naquilo que não é pão? E o produto do vosso trabalho naquilo que não pode satisfazer? Ouvi-me atentamente, e comei o que é bom, e a vossa alma se deleite com a gordura” (Isaías 55:2).

Aos que tem ‘fome’ e ‘sede’ e não tem recursos para saciar a sua fome e a sua sede, é feito um convite solene: ‘Vinde às águas, vinde, comprai sem dinheiro e sem preço!’ Mas, apesar do convite, muitos em Israel gastavam o ganho com o seu trabalho, com o que não era pão.

Ora, é evidente que as figuras ‘fome’, ‘sede’, ‘pão’ e ‘trabalho’, não se referem ao processo de produção, comércio e alimentação cotidiano, pois, Cristo se apresenta como o pão que satisfaz a necessidade do homem.

Os filhos de Israel ‘trabalhavam’, arduamente, a serviço deles mesmos, quando seguiam mandamentos de homens, a serviço de seus próprios ventres, por isso, a ilustração: gastais com o que não podia satisfazer.

“E eles vêm a ti, como o povo costumava vir, e se assentam diante de ti, como meu povo, e ouvem as tuas palavras, mas não as põem por obra; pois lisonjeiam com a sua boca, mas o seu coração segue a sua avareza.” (Ezequiel 33:31).

Ser tão somente ouvinte da palavra é um trabalho que não pode satisfazer (Romanos 2:13; Tiago 1:22), mas, por obra, o mandamento de Deus é atender o convite para comer sem dinheiro e sem preço o que é ofertado, gratuitamente, por Deus.

Logo após a multiplicação dos pães, uma multidão seguiu a Jesus para o outro lado do rio. Quando Jesus se deparou com a multidão, disse:

“Trabalhai, não pela comida que perece, mas pela comida que permanece para a vida eterna, a qual o Filho do homem vos dará; porque a este o Pai, Deus, o selou” (João 6:27).

Jesus viu o esforço que aquelas pessoas fizeram para alcançá-Lo, porém, o interesse deles era escuso: o pão cotidiano, o pão que perece. Por terem comido pão a sobejar, os filhos de Israel acreditaram que Jesus era o profeta que deveria vir ao mundo e quiseram fazê-Lo rei (João 6:14).

Mas, esse não era o foco do ministério de Cristo: ser rei neste mundo. Jesus, também, não queria ser reconhecido como profeta, antes, queria que o reconhecessem, segundo o testemunho de Deus, contido nas Escrituras: o messias prometido, o Filho de Deus, o Filho de Davi.

“E aconteceu que, estando ele só, orando, estavam com ele os discípulos; e perguntou-lhes, dizendo: Quem diz a multidão que eu sou? E, respondendo eles, disseram: João o Batista; outros, Elias, e outros que um dos antigos profetas ressuscitou. E disse-lhes: E vós, quem dizeis que eu sou? E, respondendo Pedro, disse: O Cristo de Deus” (Lucas 9:18 -20).

A coroação de Cristo, como rei, foi estabelecida por decreto divino (Salmo 2:6-7) e não seriam os homens que haveriam de entronizá-Lo. Cristo deveria resignar-se a esperar o tempo estabelecido pelo Pai (Salmo 110:1), portanto, a proposta dos filhos de Israel era escusa e por isso Jesus se retirou do meio deles.

As pessoas reconheciam Cristo como profeta, porém, negavam o testemunho que Deus deu acerca do seu Filho, que constava das Escrituras. Nenhum deles havia aprendido de Deus, conforme predisseram os profetas:

“Está escrito nos profetas: E serão todos ensinados por Deus. Portanto, todo aquele que do Pai ouviu e aprendeu vem a mim” (João 6:45);

“Disseram-lhe, pois, os judeus: Ainda não tens cinquenta anos, e viste Abraão? Disse-lhes Jesus: Em verdade, em verdade vos digo que antes que Abraão existisse, eu sou. Então pegaram em pedras para lhe atirarem; mas Jesus ocultou-se, e saiu do templo, passando pelo meio deles, e assim se retirou” (João 8:57 -59).

Bastava ouvirem, atentamente, ao Senhor Jesus, que comeriam o que era bom, pois a alma que obedece ao Senhor se deleita com o melhor. Mas, para alcançar do Senhor o que é bom, os judeus precisavam deixar os seus maus caminhos e maus pensamentos e se converterem ao Senhor.

“Deixe o ímpio o seu caminho, e o homem maligno os seus pensamentos, e se converta ao SENHOR, que se compadecerá dele; torne para o nosso Deus, porque grandioso é em perdoar” (Isaías 52:7).

Mas, não ocorreu conforme a ordem de Deus, antes, os filhos de Israel confiavam em suas próprias ‘riquezas’, como: descendência da carne de Abraão, circuncisão, sacrifícios, genealogias, mandamentos de homens, etc. Daí o alerta de Jesus:

“E os discípulos se admiraram destas suas palavras; mas Jesus, tornando a falar, disse-lhes: Filhos, quão difícil é, para os que confiam nas riquezas, entrar no reino de Deus!” (Marcos 10:24).

Ao instruir os judeus acerca das suas riquezas, Jesus disse:

“Não ajunteis tesouros na terra, onde a traça e a ferrugem tudo consomem, e onde os ladrões minam e roubam; mas, ajuntai tesouros no céu, onde nem a traça nem a ferrugem consomem, e onde os ladrões não minam nem roubam. Porque onde estiver o vosso tesouro, aí estará também o vosso coração” (Mateus 6:19 -21).

A riqueza do povo de Israel estava na nacionalidade, que tanto prezava, no sangue herdado de Abraão e na ordenança da circuncisão. Mas, para adquirir tesouro nos céus, primeiro é necessário ao homem vender (abrir mão, dispor) tudo o que tem.

“Também o reino dos céus é semelhante a um tesouro escondido num campo, que um homem achou e escondeu; e, pelo gozo dele, vai, vende tudo quanto tem, e compra aquele campo” (Mateus 13:44);

“Disse-lhe Jesus: Se queres ser perfeito, vai, vende tudo o que tens e dá-o aos pobres, e terás um tesouro no céu; e vem, e segue-me” (Mateus 19:21).

Ora, o apóstolo Paulo deu testemunho que desprezou tudo o que tinha para poder ganhar a Cristo:

“E, na verdade, tenho também por perda todas as coisas, pela excelência do conhecimento de Cristo Jesus, meu Senhor; pelo qual sofri a perda de todas estas coisas, e as considero como escória, para que possa ganhar a Cristo” (Filipenses 3:8).

De quais coisas o apóstolo Paulo se desfez? Ele havia elencado, anteriormente:

“Circuncidado ao oitavo dia, da linhagem de Israel, da tribo de Benjamim, hebreu de hebreus; segundo a lei, fui fariseu; segundo o zelo, perseguidor da igreja, segundo a justiça que há na lei, irrepreensível. Mas o que para mim era ganho reputei-o perda por Cristo” (Filipenses 3:5 -7).

Observe que é imprescindível ao homem abrir mão do que possui, para poder ganhar a Cristo. O apóstolo Paulo possuía uma justiça própria, segundo a lei, e sem abrir mão da justiça própria, jamais teria a justiça, que vem de Deus, por meio de Cristo Jesus.

“E seja achado nele, não tendo a minha justiça que vem da lei, mas a que vem pela fé em Cristo, a saber, a justiça que vem de Deus pela fé” (Filipenses 3:9).

A tradição recebida dos pais era uma riqueza que os judeus deveriam abrir mão para ganhar a Cristo.

“Sabendo que não foi com coisas corruptíveis, como prata ou ouro, que fostes resgatados da vossa vã maneira de viver que por tradição recebestes dos vossos pais” (1 Pedro 1:18).

Quando Jesus convocou os discípulos, logo após a pesca maravilhosa, eles abandonaram o barco, as redes e a grande quantidade de peixes, para seguir a Cristo (Lucas 5:11).

Como adquirir de Deus ouro refinado, para ser rico para com Deus? Ora, o apóstolo Pedro diz que a prova da fé é muito mais preciosa do que o ouro provado pelo fogo.

“Para que a prova da vossa fé, muito mais preciosa do que o ouro que perece e é provado pelo fogo, se ache em louvor, honra, e glória, na revelação de Jesus Cristo” (1 Pedro 1:7).

Tendo Cristo, a ‘fé’ manifesta, que trouxe salvação a todos os homens, o homem torna-se rico para com Deus, pois é coherdeiro com Cristo, de todas as coisas.

“E, se nós somos filhos, somos logo herdeiros também, herdeiros de Deus, e coerdeiros de Cristo: se é certo que com ele padecemos, para que também com ele sejamos glorificados” (Romanos 8:17; Gálatas 3:23).

Quem tem a Cristo como Senhor, o coração não repousa nas coisas deste mundo, visto que já ressuscitou com Cristo e pensa nas coisas que são de cima (Colossenses 3:1).

A confissão do líder da igreja de Laodiceia demonstra que ele naufragou da fé (1 Timóteo 1:19), em decorrência da sua cobiça (1 Timóteo 6:10). Há os que se desviam da fé por cobiçar bens materiais, por pensar que o evangelho é fonte de lucro (1 Timóteo 6:9; Mateus 13:22), e outros até por cobiçarem algo bom: o episcopado. Mas, se não estiver alicerçado no fundamento, que é Cristo, e não souber manejar bem a palavra da verdade (2 Timóteo 2:17-19), correm o risco de cair no engano do diabo (1 Timóteo 3:6).

O apóstolo Paulo deixou registrado que, de tudo o que consta do Antigo Testamento, fica o alerta para que os cristãos não cobicem as coisas más, como os filhos de Israel.

“E estas coisas foram-nos feitas em figura, para que não cobicemos as coisas más, como eles cobiçaram” (1 Coríntios 10:6).

O apóstolo dos gentios exortou e deu exemplo, em tudo:

“E todo aquele que luta de tudo se abstém; eles o fazem para alcançar uma coroa corruptível; nós, porém, uma incorruptível. Pois eu assim corro, não como a coisa incerta; assim combato, não como batendo no ar. Antes subjugo o meu corpo, e o reduzo à servidão, para que, pregando aos outros, eu mesmo não venha de alguma maneira a ficar reprovado” (1 Coríntios 9:25 -27).

É equivocada a interpretação que aponta as ‘vestes brancas’, recomendadas por Cristo, como sendo decorrente de questões comportamentais, como caráter, moral, leis, etc.

‘Vestes brancas’ é figura que remete à ideia de justiça, proveniente de Deus. Quando o pecado do homem é coberto (Salmo 32:1), segue-se que tal pessoa, simbolicamente, recebe de Deus uma indumentária, que reflete a nova condição de quem foi justificado.

“Então respondeu, aos que estavam diante dele, dizendo: Tirai-lhe estas vestes sujas. E a Josué disse: Eis que tenho feito com que passe de ti a tua iniquidade, e te vestirei de vestes finas” (Zacarias 3:4).

Se for justiça própria, a veste do homem é comparável a trapos de imundície, como os utilizados na antiguidade para cobrir os ferimentos ou, para estancar o fluxo menstrual, mas, se forem as vestes fornecidas por Deus, são vestes finas, vestes de louvor.

“A ordenar acerca dos tristes de Sião que se lhes dê glória em vez de cinza, óleo de gozo em vez de tristeza, vestes de louvor em vez de espírito angustiado; a fim de que se chamem árvores de justiça, plantações do SENHOR, para que ele seja glorificado” (Isaías 61:3).

A justiça própria é comparável a teias de aranha, pois decorre de mandamentos de homens e não serve para o homem se cobrir diante de Deus.

“Chocam ovos de basilisco, e tecem teias de aranha; o que comer dos ovos deles, morrerá; e, quebrando-os, sairá uma víbora. As suas teias não prestam para vestes nem se poderão cobrir com as suas obras; as suas obras são obras de iniquidade, e obra de violência há nas suas mãos” (Isaías 59:5 -6).

O ‘colírio’ que abre os olhos é o mesmo que ‘circuncidar o coração’ endurecido, ou seja, é ouvir e atender à Palavra do Senhor.

“Porque o coração deste povo está endurecido, e ouviram de mau grado com seus ouvidos, e fecharam seus olhos; para que não vejam com os olhos, e ouçam com os ouvidos, e compreendam com o coração, e se convertam, e eu os cure” (Mateus 13:15).

Todos os homens, por serem descendentes de Adão, desviaram-se de Deus, desde o nascimento, e andam errados, desde que nascem e por isso são mentirosos (Salmo 58:3; Romanos 3:4), portanto, seguir uma concepção própria, acerca de como se salvar, é ser cego.

“Por isso o juízo está longe de nós, e a justiça não nos alcança; esperamos pela luz, e eis que só há trevas; pelo resplendor, mas andamos em escuridão. Apalpamos as paredes como cegos, e como os que não têm olhos andamos apalpando; tropeçamos ao meio-dia como nas trevas, e nos lugares escuros como mortos (…) Como o prevaricar, e mentir contra o SENHOR, e o desviarmo-nos do nosso Deus, o falar de opressão e rebelião, o conceber e proferir do coração palavras de falsidade” (Isaías 59:9 -10 e 13).

Aquele que crê em Cristo fez uso do colírio para ver o invisível, pois tem a mesma fé que o crente Moisés, que teve por maiores riquezas o vitupério de Cristo, do que os tesouros do Egito.

“Pela fé deixou o Egito, não temendo a ira do rei; porque ficou firme, como vendo o invisível” (Hebreus 11:27; 2 Coríntios 4:18).

Como o anjo de Laodiceia não sabia que era desgraçado, miserável, pobre, cego e nu, o verso 18 de Apocalipse 3 é uma exortação para que ele reconhecesse a sua real condição e mudasse de concepção (arrependimento).

 

Enriquecidos n’Ele

A riqueza do cristão está em Cristo, a palavra e o conhecimento de Deus (1 Coríntios 1:5) e, quanto mais sofrer perseguições e injúrias, por causa do evangelho, maior será a recompensa nos céus (Mateus 5:11-12). Sem a revelação de Deus contida nas Escrituras, o homem não passa de miserável, pobre, cego e nu.

“Em quem estão escondidos todos os tesouros da sabedoria e da ciência.” (Colossenses 2:3).

Ao ouvir a palavra da verdade e crer, o crente recebeu de Deus poder para ser feito filho de Deus (João 1:12). Para ser feito filho de Deus, o homem precisa morrer com Cristo e, então, ressurgirá dentre os mortos uma nova criatura. O fato de ser uma nova criatura é o que caracteriza o cristão, como ‘unido’ a Cristo.

“Assim que, se alguém está em Cristo, nova criatura é; as coisas velhas já passaram; eis que tudo se fez novo” (2 Coríntios 5:17).

‘Estar em Cristo’ é ‘ser uma nova criatura’. ‘Estar em Cristo’ é ter comunhão íntima, pois, é participante do corpo de Cristo. Quando o apóstolo Paulo diz: “Porque em tudo fostes enriquecidos nele, em toda a palavra e em todo o conhecimento” (1 Coríntios 1:5), demonstra que, em Cristo o homem é enriquecido.

A plenitude da inteligência, com relação ao mistério de Deus, é o que torna o homem rico para com Deus.

“Para que os seus corações sejam consolados, e estejam unidos em amor, e enriquecidos da plenitude da inteligência, para conhecimento do mistério de Deus e Pai, e de Cristo” (Colossenses 2:2).

O anjo de Laodiceia já não dispunha do discernimento necessário para perceber o seu real estado: desgraçado, miserável, pobre, cego e nu!

“Como dizes: Rico sou, e estou enriquecido, e de nada tenho falta; e não sabes que és um desgraçado, e miserável, e pobre, e cego, e nu” (Apocalipse 3:17).

Só é possível discernir (οἶδα), quando se tem o conhecimento necessário. Ora, quando está em Cristo, o cristão possui abundancia de fé, palavra, ciência e zelo (diligência), pois, a graça é abundante, sabendo que Cristo se fez pobre para que n’Ele, o crente esteja enriquecido (2 Coríntios 8:9).

O serviço do ministro de Laodiceia era inócuo, pois, recebeu a palavra de Deus em vão (2 Coríntios 5:1). Só é possível enriquecer os que estão sob o seu cuidado, quando se está na palavra da verdade, ou seja, no evangelho (poder de Deus) (2 Coríntios 5:7 e 10).

O obreiro deve ser zeloso do que é honesto: não só para com Deus, mas, também, para com o que é concernente aos homens (2 Coríntios 8:21). O honesto para com Deus é crer em Cristo, conforme as Escrituras, e o honesto para com os homens é portar-se de modo digno: não dando escândalo a judeus, nem a gregos e nem à igreja de Deus (1 Coríntios 10:32; 2 Coríntios 6:3).

Há dois tipos de escândalo:

1) aquele que atenta contra a verdade do evangelho. Esse tipo de escândalo é produzido por homens levianos, que introduzem, encobertamente, heresias de perdição, através de palavras e lisonjas.

2) os decorrentes de questões comportamentais, pois a liberdade de quem está em Cristo, pode ser censurada pelos fracos (1 Coríntios 8:9). Nesse sentido, o crente em Cristo deve ter o cuidado de não destruir o seu irmão em Cristo, por questões vãs (Romanos 14:20).

“E rogo-vos, irmãos, que noteis os que promovem dissensões e escândalos contra a doutrina que aprendestes; desviai-vos deles. Porque os tais não servem a nosso Senhor Jesus Cristo, mas ao seu ventre; e com suaves palavras e lisonjas enganam os corações dos simples” (Romanos 16:17 -18).

 

Amor

“Eu repreendo e castigo a todos quantos amo; sê, pois, zeloso e arrepende-te” (Apocalipse 3:19).

O alerta final ao anjo da igreja, demonstra o cuidado de Deus para com os que creram em Cristo, para que não se desviem, conforme exortou o escritor aos Hebreus:

“E já vos esquecestes da exortação que vos admoesta como filhos: Filho meu, não desprezes a correção do Senhor, nem te desanimes quando por ele és repreendido; pois o Senhor corrige ao que ama, e açoita a todo o que recebe por filho. É para disciplina que sofreis; Deus vos trata como a filhos; pois qual é o filho a quem o pai não corrija? Mas, se estais sem disciplina, da qual todos se têm tornado participantes, sois então bastardos, e não filhos” (Hebreus 12:5 -8).

A todos quanto Deus ama, Ele repreende, ou seja, reitera o seu mandamento, pois no mandamento de Deus está o seu cuidado (amor) para com o homem.

“Porque este é o amor de Deus: que guardemos os seus mandamentos; e os seus mandamentos não são pesados” (1 João 5:3; 2 João 1:6).

O escritor aos Hebreus fez esse alerta à igreja, já no Apocalipse, o alerta é dado ao anjo da igreja.

O escritor aos Hebreus buscou a base da exortação, que fez à igreja, no Livro dos Provérbios:

“Filho meu, não rejeites a correção do SENHOR, nem te enojes da sua repreensão. Porque o SENHOR repreende aquele a quem ama, assim como o pai ao filho a quem quer bem” (Provérbios 3:11 -12).

Ora, Deus quer que todos os homens se salvem e venham ao conhecimento da verdade (1 Timóteo 2:4), de modo que Ele, em sua infinita misericórdia, deu o seu Filho unigênito, para que todo aquele que n’Ele crer, não pereça, mas tenha a vida eterna (João 3:16). O amor de Deus está implícito no ato de conceder o Seu Filho, e está explícito no mandamento: que creiam naquele que Ele enviou, pois Cristo é a benignidade e o amor de Deus manifesto aos homens.

“Mas quando apareceu a benignidade e amor de Deus, nosso Salvador, para com os homens” (Tito 3:4).

Tudo o que está registrado nas Escrituras, com relação ao povo de Israel, nos serve de exemplo, uma vez que foram castigados inúmeras vezes por Deus por serem desobedientes.

“Ora, tudo isto lhes sobreveio como figuras, e estão escritas para aviso nosso, para quem já são chegados os fins dos séculos” (1 Coríntios 10:11);

“A tua malícia te castigará, e as tuas apostasias te repreenderão; sabe, pois, e vê, que mal e quão amargo é deixares ao SENHOR teu Deus, e não teres em ti o meu temor, diz o Senhor DEUS dos Exércitos” (Jeremias 2:19);

“Não obedeceu à sua voz, não aceitou o castigo; não confiou no SENHOR; nem se aproximou do seu Deus” (Sofonias 3:2).

Mas, porque os castigos aplicados aos filhos de Israel foram postos por figuras para os que creem em Cristo? A resposta está neste Provérbio:

“Quando o escarnecedor é castigado, o simples torna-se sábio; e o sábio quando é instruído recebe o conhecimento” (Provérbios 21:11).

Os líderes do povo de Israel são como o ‘escarnecedor’ que foi castigado e os que creem em Cristo são os ‘simples’, que se tornaram sábios. O sábio, por sua vez, é receptivo ao conhecimento de Deus, diferente do escarnecedor, que não considera o mandamento de Deus.

“Ouvi, pois, a palavra do SENHOR, homens escarnecedores, que dominais este povo que está em Jerusalém” (Isaías 28:14);

“O escarnecedor busca sabedoria e não acha nenhuma, para o prudente, porém, o conhecimento é fácil” (Provérbios 14:6).

 

Sê zeloso

Caso o ministro de Laodiceia mudasse de concepção (arrepende-se), em função da exortação, que fosse zeloso de si mesmo e da doutrina, consequentemente, seria zeloso da igreja de Deus.

“Tem cuidado de ti mesmo e da doutrina. Persevera nestas coisas; porque, fazendo isto, te salvarás, tanto a ti mesmo como aos que te ouvem.” (1 Timóteo 4:16).

O apóstolo Paulo é um exemplo de zelo:

“Porque estou zeloso de vós com zelo de Deus; porque vos tenho preparado para vos apresentar como uma virgem pura a um marido, a saber, a Cristo” (2 Coríntios 11:2).

O zelo do apóstolo Paulo se verifica na repreensão que fez ao apóstolo Pedro, visto que, diante de uma atitude escusa do apóstolo Pedro, com relação à verdade do evangelho, que comia com os gentios, mas, quando viu chegarem alguns judeus da parte de Tiago, se apartou dos gentios, com receio do judeus (Gálatas 2:12), defendeu a essência do evangelho: em Cristo não já judeu e nem grego.

Não se submeter aos falsos irmãos, que se intrometem para espreitar a liberdade cristã, é ser zeloso, pois, se o crente fraquejar nesse embate, comprometerá a verdade do evangelho (Gálatas 2:4-5).

O zeloso em todo o tempo, está atento para angariar pessoas para o reino de Deus (1 Coríntios 9:20-21). Se for para ganhar um judeu, que se faça como judeu. Se for para ganhar um gentio, que se faça como gentio. Mas, tudo deve ser feito por causa do evangelho, não por vangloria ou, por contenda (1 Coríntios 9:23).

O zelo com a doutrina é a base para que, pregando aos outros, de algum modo não seja reprovado diante de Deus.

“Antes subjugo o meu corpo, e o reduzo à servidão, para que, pregando aos outros, eu mesmo não venha de alguma maneira a ficar reprovado” (1 Coríntios 9:27).

 

Arrepende-te

A ordem para arrepender-se não diz de penitências, prolongadas orações, jejuns, sacrifícios, etc., isso porque alguns pensam que a condição de ‘morno’ é pertinente a cristãos não dados a tais práticas.

Arrepender-se é mudança de concepção, do grego ‘metanoia’, ou seja, deve-se abandonar o conceito de que ‘é rico’, ‘de que nada tem falta’ e adquirir ouro provado no fogo, vestes brancas e colírio para ver (Apocalipse 3:17-18).

O arrependimento não tem em vista questões de ordem moral, comportamental ou legal, antes, está relacionado com a doutrina do evangelho, se o homem é obediente ou, não.

 

Apelo

“Eis que estou à porta, e bato; se alguém ouvir a minha voz, e abrir a porta, entrarei em sua casa, e com ele cearei, e ele comigo.” (Apocalipse 3:20).

Após repreender o anjo da igreja de Laodiceia, Jesus demonstra que a repreensão e o castigo não são uma imposição, antes, um apelo à volição do ministro de Laodiceia.

O ministro de Laodiceia foi avisado, portanto, restava a ele atender, como diz o provérbio:

“O avisado vê o mal e esconde-se; mas os simples passam e sofrem a pena.” (Provérbios 27:12).

Onde o espírito de Deus está, aí há liberdade (2 Coríntios 3:17), portanto, a repreensão é Cristo à porta chamando. Se o ministro de Laodiceia se arrependesse, ou seja, dando ouvidos (obedecendo) à voz de Cristo, certamente que o ministro de Laodiceia teria plena comunhão (cear) com Cristo.

Com Cristo não há graça irresistível, como se, ante o apelo do mestre à porta, o indivíduo não consiga resistir. A questão é condicional (se alguém ouvir e abrir a porta) e não impositiva (entrarei e cearei, mesmo que o indivíduo resista).

“Mas, como alguns deles se endurecessem e não obedecessem, falando mal do Caminho perante a multidão, retirou-se deles, e separou os discípulos, disputando todos os dias na escola de um certo Tirano.” (Atos 19:9);

“Não endureçais os vossos corações, como na provocação, no dia da tentação no deserto.” (Hebreus 3:8);

“Determina outra vez um certo dia, hoje, dizendo por Davi, muito tempo depois, como está dito: Hoje, se ouvirdes a sua voz, não endureçais os vossos corações.” (Hebreus 4:7).

A figura utilizada por Jesus, para retratar o seu apelo ao anjo de Laodiceia, era muito conhecida à época, pois, ninguém devia se escusar de atender a porta, vez que era imprescindível aos viajantes, que lhes dessem guarida.

Qualquer que ouvir a voz de Cristo e obedecê-lo, gozará de plena comunhão: Cristo não se envergonhará de chamá-lo de irmão (Hebreus 2:11).

“De sorte que somos embaixadores da parte de Cristo, como se Deus por nós rogasse. Rogamo-vos, pois, da parte de Cristo, que vos reconcilieis com Deus.” (2 Coríntios 5:20).

 

Conclusão

A carta ao anjo de Laodiceia é a sétima carta pastoral redigida pelo evangelista João, cujo autor é Cristo, endereçada ao ministro de uma comunidade cristã do primeiro século.

A observação que foi feita contrasta com o que foi dito ao anjo da igreja que estava em Esmirna, o que evidencia tudo o que foi discorrido, acerca do anjo de Laodiceia, que foi nomeado ‘morno’.

O ministro de Esmirna foi declarado rico para com Deus, no entanto, sofria a oposição dos judaizantes, diferentemente, do anjo de Laodiceia, que se julgava rico, mas, era pobre para com Deus.

“Conheço as tuas obras, e tribulação, e pobreza (mas tu és rico), e a blasfêmia dos que se dizem judeus, e não o são, mas são a sinagoga de Satanás.” (Apocalipse 2:9).

Como a circuncisão para Deus é a do coração e não a circuncisão do prepúcio da carne, o anjo de Esmirna recebeu o louvor de Cristo (Romanos 2:28-29), portanto, foi um bem-aventurado (Mateus 5:3). Da mesma forma, Cristo conhecia a blasfêmia dos que se auto intitulavam judeus, o que demonstra que o ministro de Esmirna não se locupletava dos preceitos de homens, para não sofrer perseguições dos seus concidadãos.

O ministro de Laodiceia, por sua vez, foi declarado ‘morno’, por se achar rico, abastado, vez que não se opunha à doutrina dos judaizantes, que se infiltrou em meio aos cristãos daquela comunidade, para não sofrer os revezes de ser perseguido.

O anjo de Laodiceia adotou um posicionamento de neutralidade diante da oposição ‘espirito’ e ‘carne’, ou seja, entre evangelho e mandamentos de homens, de modo a ter apoio tanto daqueles que queriam seguir o evangelho de Cristo, quanto dos que queriam seguir mandamentos de homens.

Desse substrato de letargia emerge a confissão do mensageiro de Laodiceia: ‘rico sou e estou enriquecido’ e de nada tenho falta, esquecendo-se da exortação: que comunhão tem a luz com as trevas (2 Co 6:14-16), ou, de que ninguém pode servir a dois senhores (Mateus 6:24).

O apóstolo Paulo não alinhavou aliança com o judaísmo, porque temos a seguinte declaração:

“Como contristados, mas sempre alegres; como pobres, mas enriquecendo a muitos; como nada tendo, e possuindo tudo.” (2 Coríntios 6:10).

A oposição dos judaizantes era constante:

“Porque, mesmo quando chegamos à Macedônia, a nossa carne não teve repouso algum; antes em tudo fomos atribulados: por fora combates, temores por dentro.” (2 Coríntios 7:5).

O anjo de Laodiceia se fez amigo do mundo, portanto, tornou-se inimigo de Deus (Tiago 4:4) e a única saída era abandonar a duplicidade de pensamento (Tiago 4:8), reconhecendo a atual condição miserável, lamentar e chorar (Tiago 4:9), para então ser consolado por Deus (Mateus 5:4).

Se continuasse seguindo tal pensamento, o anjo de Laodiceia teria o seu candeeiro removido, como foi alertado o anjo de Éfeso (Apocalipse 2:5) e declarado morto, como o anjo de Sardes (Apocalipse 3:1).

 

Correção Ortográfica: Pr. Carlos Gasparotto

[1] “746 αρχη arché de 756; TDNT – 1:479,81; n f 1) começo, origem 2) a pessoa ou coisa que começa, a primeira pessoa ou coisa numa série, o líder 3) aquilo pelo qual algo começa a ser, a origem, a causa ativa 4) a extremidade de uma coisa 4a) das extremidades de um navio 5) o primeiro lugar, principado, reinado, magistrado 5a) de anjos e demônios” Dicionário bíblico Strong.

Claudio Crispim

É articulista do Portal Estudo Bíblico (https://estudobiblico.org), com mais de 360 artigos publicados e distribuídos gratuitamente na web. Nasceu em Mato Grosso do Sul, Nova Andradina, Brasil, em 1973. Aos 2 anos de idade sua família mudou-se para São Paulo, onde vive até hoje. O pai, ‘in memória’, exerceu o oficio de motorista coletivo e, a mãe, é comerciante, sendo ambos evangélicos. Cursou o Bacharelado em Ciências Policiais de Segurança e Ordem Pública na Academia de Policia Militar do Barro Branco, se formando em 2003, e, atualmente, exerce é Capitão da Policia Militar do Estado de São Paulo. Casado com a Sra. Jussara, e pai de dois filhos: Larissa e Vinícius.

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