Romanos

Romanos 2 – Os que ouvem a lei não são justos diante de Deus

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Há um dia predeterminado para a ira de Deus “Pois é vindo o grande dia da ira deles, e quem poderá subsistir?” ( Ap 6:17 ). Neste dia os homens conhecerão (saber acerca de, entender, compreender) o juízo de Deus. O juízo de Deus foi estabelecido lá em Adão, mas os homens ignoram esta verdade. Quando do dia da ira será manifesto a eles que estão debaixo de condenação. Por serem filhos de Adão, ou filhos da desobediência, por conseguintes, também são filhos da ira ( Cl 3:6 ); “E éramos por natureza filhos da ira, como também os demais” ( Ef 2:3 ).


Romanos 2 – Os que ouvem a lei não são justos diante de Deus

“Porque os que ouvem a lei não são justos diante de Deus, mas os que praticam a lei hão de ser justificados.” (Romanos 2:13).

Lógica como ferramenta de interpretação

Antes de avançarmos na análise do capítulo 2 da Epístola aos Romanos, é essencial compreendermos alguns conceitos fundamentais de interpretação bíblica, com um enfoque na linguagem lógica.

O apóstolo João nos revela sobre a natureza divina ao afirmar: “Deus é luz” e que “nele não há trevas alguma” (1 João 1:5). Vamos explorar essas declarações à luz da lógica formal.

Primeiramente, a proposição “Deus é luz” é uma afirmação simples e declarativa com valor lógico verdadeiro. Na lógica, uma proposição pode ser classificada como verdadeira ou falsa, e o uso de operadores lógicos nos auxilia na interpretação, especialmente quando analisamos proposições argumentativas.

Os princípios básicos da lógica que se aplicam aqui são:

1. Princípio da Identidade: Se uma proposição é verdadeira, então ela é verdadeira.
2. Princípio da Não-Contradição: Nenhuma proposição pode ser simultaneamente verdadeira e falsa.
3. Princípio do Terceiro Excluído: Uma proposição é, ou verdadeira, ou falsa; não há uma terceira possibilidade.

Assim, a proposição “Deus é luz” é verdadeira e, portanto, não pode ser falsa. Essa proposição não pode assumir dois valores lógicos simultaneamente.

Quando aplicamos o conectivo “não” a uma proposição, formamos sua negação. Por exemplo, “Deus não é luz” é uma proposição simples e declarativa com valor lógico falso, dado que contradiz a afirmação original.

A segunda proposição, “não há em Deus trevas alguma”, embora contenha o conectivo “não”, mantém o valor lógico verdadeiro, pois reforça a ideia de que “Deus é luz”.

Embora as cartas bíblicas sejam redigidas com base em princípios lógicos, elas raramente seguem definições e conceitos formais como nos textos didáticos. Definir envolve determinar a extensão ou os limites de um conceito e explicar seu significado, enquanto conceituar é a formulação de uma ideia em palavras.

Consideremos também o versículo: “Do céu se manifesta a ira de Deus sobre toda impiedade e injustiça dos homens que detêm a verdade pela injustiça” (Romanos 1:18). Esta proposição, simples e declarativa, possui um valor lógico verdadeiro. Com base nisso, podemos construir novas proposições substituindo certos elementos.

Da mesma forma que a ira de Deus se manifesta do céu, também se manifesta a bondade de Deus. Reconhecida a bondade divina, resta a questão: sobre quem essa bondade se manifesta?

No estudo do segundo capítulo da carta aos Romanos, aplicaremos os princípios lógicos descritos para uma análise mais aprofundada do texto.

 

Os judeus são inescusáveis

1 PORTANTO, és inescusável quando julgas, ó homem, quem quer que sejas, porque te condenas a ti mesmo naquilo em que julgas a outro; pois tu, que julgas, fazes o mesmo.

O capítulo dois de Romanos começa com a conjunção “portanto”, indicando uma conclusão em relação ao que foi dito anteriormente. No capítulo 1, foi afirmado que:

  1. Os homens que detêm a verdade em injustiça são alvos da ira de Deus (Romanos 1:18);
  2. A ira de Deus se abateu sobre os homens ímpios e injustos (Romanos 1:19);
  3. É possível ver nas coisas criadas o eterno poder de Deus, mas como eles detêm a verdade em injustiça, é como se negassem a soberania da divindade, portanto, são inescusáveis (Romanos 1:20; Salmo 53:1);
  4. Apesar de terem conhecido a Deus, não o honraram como Deus e nem lhe renderam graça. Em virtude de seus raciocínios fúteis e corações insensatos e obscuros, criaram deuses para si (Romanos 1:21);
  5. Eles se arrogam sábios, mas são loucos, pois mudaram a glória do Deus incorruptível em imagem de coisas corruptíveis (Romanos 1:22-23);
  6. Eles foram abandonados à mercê das suas concupiscências (Romanos 1:24), que em essência é imundície, e se desonram entre si (Romanos 1:24);
  7. Em vez de honrarem o Criador, honraram e serviram mais a criatura, pois obedeciam mandamentos de homens (Romanos 1:25);
  8. Abandonados às próprias paixões, foi-lhes dada uma lei em virtude das transgressões que depõem contra tais homens como injustos (Romanos 1:26-27);
  9. O que procede do coração deles é pleno de imundície e contamina os outros (Romanos 1:28);
  10. A lista de ações reprováveis emana das proibições da lei, que é contrária aos judeus que não a cumprem (Romanos 1:29-31);
  11. Apesar de saberem que quem transgride a lei é digno de morte, eles transgridem e apoiam aqueles que também transgridem (Romanos 1:32).

No capítulo 2 da Epístola aos Romanos, Paulo dirige sua mensagem especificamente aos judeus, que são o mesmo grupo referido no capítulo 1, descritos como aqueles que “detêm a verdade em injustiça” (Romanos 1:18). A conexão entre os capítulos é evidente pela utilização das conjunções “ora” e “portanto”, que aparecem, respectivamente, no final do capítulo 1 e no início do capítulo 2, sinalizando uma relação de conclusão e continuidade entre os textos.

O versículo 32 do capítulo 1 esclarece que, apesar de os judeus conhecerem a sentença divina — a lei que declara que aqueles que desobedecem a Deus são dignos de morte —, eles não só praticam essas transgressões, mas também aprovam os que as cometem. Portanto, mesmo que alguém se considere em uma posição de privilégio ou superioridade para julgar os outros, essa pessoa continua sendo inescusável diante de Deus, conforme afirmado em Romanos 1:20.

Ao concluir que qualquer homem que julga a outro é inescusável, pois condena a si mesmo ao fazer aquilo que reprova no outro, o apóstolo Paulo implicitamente aponta para os judeus. Os judeus se consideravam superiores aos gentios por ouvirem a lei, mas estavam na mesma condição dos gentios, já que também não obedeciam à lei. Os judeus, por causa do vínculo de sangue, aprovavam os seus concidadãos, ou seja, não somente desobedeciam à lei, mas também consentiam com os demais que desobedeciam. Entretanto, se sentiam justos e em posição de julgar aqueles que não tinham a lei.

 

2 E bem sabemos que o juízo de Deus é segundo a verdade sobre os que tais coisas fazem.

Paulo reitera que os cristãos estão cientes de que o juízo de Deus é segundo a verdade. Ele enfatiza: “Bem sabemos…”. A verdade à qual o apóstolo se refere é a verdade do evangelho, ou seja, à sã doutrina.

Para os devassos, para os sodomitas, para os roubadores de homens, para os mentirosos, para os perjuros, e para o que for contrário à sã doutrina, (1 Timóteo 1:10).

Através dessa afirmação, Paulo demonstra que, pelo conhecimento da verdade, os cristãos não julgam aqueles que estão fora da comunidade cristã. No entanto, é de conhecimento comum que o juízo de Deus é certo sobre quem é apontado pela lei como transgressor.

“E a incircuncisão que por natureza o é, se cumpre a lei, não te julgará porventura a ti, que pela letra e circuncisão és transgressor da lei?” (Romanos 2:27).

O conhecimento que o cristão possui é baseado na verdade do evangelho, enquanto o “conhecimento” dos homens que detêm a verdade em injustiça é do juízo de Deus decorrente da justiça proveniente da lei.

 

Julgadores segundo a aparência

3 E tu, ó homem, que julgas os que fazem tais coisas, cuidas que, fazendo-as tu, escaparás ao juízo de Deus?

Paulo volta a questionar o “homem” que detém a verdade em injustiça e aponta que seu comportamento é questionável. Ele questiona se basta julgar aqueles que não têm lei para se ver livre do juízo de Deus. Será que esse é o modo de se livrar da ira futura, sentir-se superior aos gentios por ser descendente da carne de Abraão?

“E, vendo ele muitos dos fariseus e dos saduceus, que vinham ao seu batismo, dizia-lhes: Raça de víboras, quem vos ensinou a fugir da ira futura?” (Mateus 3:7).

O juízo segundo a verdade já foi estabelecido no Éden, e a atitude desse homem, que julga os gentios, visa se esquivar da condenação do juízo de Deus (Romanos 5:16-18).

O escritor aos Hebreus é claro:

“Como escaparemos nós, se não atentarmos para uma tão grande salvação, a qual, começando a ser anunciada pelo Senhor, foi-nos depois confirmada pelos que a ouviram” (Hebreus 2:3).

Note que é impossível ao homem inescusável escapar ao juízo de Deus, pois a condição de reprovável diante de Deus decorre da ofensa de Adão, algo irreparável através da obediência a mandamentos humanos. Fazer como o fariseu que foi ao templo orar, alegando não ser como os demais homens, é um posicionamento fútil. Enquanto o fariseu utilizava a lei para julgar os demais homens (gentios e publicanos), a própria lei o acusava de transgressor, utilizando a mesma lista de ações que ele empregava para condenar os outros.

O fariseu, estando em pé, orava consigo desta maneira: Ó Deus, graças te dou porque não sou como os demais homens, roubadores, injustos e adúlteros; nem ainda como este publicano.  Jejuo duas vezes na semana, e dou os dízimos de tudo quanto possuo.” (Lucas 18:11-12).

Do juízo de Deus em retribuição a ofensa de Adão resulta a condição do homem sujeita ao pecado, pois a condenação afetou a natureza do homem. Da sentença e condenação divina surgiu a semente corruptível de Adão, cuja natureza é morte. As figuras da semente e da árvore ilustram essa triste realidade dos descendentes de Adão, pois a semente corruptível de Adão faz com que os frutos dos homens sejam maus (João 3:19-20). A árvore que tem origem na semente de Adão só produz o mal, visto que uma árvore não pode produzir dois tipos de frutos (Mateus 7:17).

Qual é o fruto do homem gerado de Adão? A mentira, desde que nasce, e as Escrituras não excluem os judeus dessa condição.

Acaso falais vós, deveras, ó congregação, a justiça? Julgais retamente, ó filhos dos homens? Antes no coração forjais iniquidades; sobre a terra pesais a violência das vossas mãos. Alienam-se os ímpios desde a madre; andam errados desde que nasceram, falando mentiras.” (Salmo 58:1-3).

Jesus alertou que o julgamento não pode ser feito segundo a aparência, mas com base na reta justiça (João 7:24). O julgamento dos judeus, no entanto, era baseado em aspectos externos como a origem, a genealogia, a circuncisão, os sábados e outras observâncias cerimoniais.

Todavia bem sabemos de onde este é; mas, quando vier o Cristo, ninguém saberá de onde ele é. Clamava, pois, Jesus no templo, ensinando, e dizendo: Vós conheceis-me, e sabeis de onde sou; e eu não vim de mim mesmo, mas aquele que me enviou é verdadeiro, o qual vós não conheceis.” (João 7:27-28).

 

4 Ou desprezas tu as riquezas da sua benignidade, e paciência e longanimidade, ignorando que a benignidade de Deus te leva ao arrependimento?

O apóstolo Paulo lembra que a base da misericórdia de Deus, conforme as Escrituras, é temer (obedecer) a Deus. As riquezas da benignidade, paciência e longanimidade constavam do juramento que Ele estabeleceu com Abraão. No entanto, os judeus não confiaram no juramento que Deus fez aos patriarcas, e uma aliança foi feita para conduzi-los ao Descendente, em quem a promessa de bem-aventurança foi feita.

“Porque desprezou o juramento, quebrando a aliança; eis que ele tinha dado a sua mão; contudo fez todas estas coisas; não escapará. Portanto, assim diz o Senhor DEUS: Vivo eu, que o meu juramento, que desprezou, e a minha aliança, que quebrou, isto farei recair sobre a sua cabeça.” (Ezequiel 17:18-19);

“Todas as veredas do Senhor são misericórdia e verdade para aqueles que guardam a sua aliança e os seus testemunhos.” (Salmo 25:10);

E faço misericórdia a milhares dos que me amam e guardam os meus mandamentos.” (Deuteronômio 5:10).

O homem que julga os demais homens por praticarem coisas reprováveis pensa que pode escapar ao juízo de Deus dessa maneira. No entanto, essa atitude evidencia algo ainda mais grave: o desprezo pela benignidade de Deus, expressa na aliança, que, em função da Sua longanimidade e benignidade, não tratou a nação de Israel segundo os seus pecados e iniquidades, pois Ele não imporá a Sua ira para sempre.

Misericordioso e piedoso é o Senhor; longânime e grande em benignidade. Não reprovará perpetuamente, nem para sempre reterá a sua ira. Não nos tratou segundo os nossos pecados, nem nos recompensou segundo as nossas iniquidades. Pois assim como o céu está elevado acima da terra, assim é grande a sua misericórdia para com os que o temem.” (Salmo 103:8-11).

Vale destacar que a misericórdia de Deus sobre a nação de Israel tem por base o juramento de Deus a Abraão. No entanto, os membros da comunidade de Israel precisavam compreender que, para alcançarem a misericórdia de Deus, era necessário obedecê-Lo. Somente ouvir a lei ou julgar os outros não dá direito à misericórdia de Deus. Obedecer aos mandamentos de homens que, por tradição, receberam dos pais, também não confere esse direito.

 

A figura das duas portas e dos dois caminhos

Antes de perseguirmos no estudo faz-se necessário entendermos a seguinte colocação de Jesus:

“Entrai pela porta estreita. Pois larga e a porta, e espaçoso o caminho que conduz à perdição, e muitos são os que entram por ela. Mas estreita é a porta, e apertado o caminho que conduz para a vida, e são poucos os que a encontram” ( Mt 7:13 -14).

Jesus demonstra que há duas portas e dois caminhos. Há uma porta estreita e há uma porta larga. Há um caminho apertado e um caminho espaçoso.

O texto demonstra duas diferenças gritantes entre os dois caminhos e as duas portas, eles conduzem: a vida, ou a perdição.

O leitor deve perceber que há uma ordem clara: “Entrai pela porta estreita”, ou seja, Cristo alerta os seus ouvintes para que entrem pela porta estreita. É um convite que demanda uma decisão por parte de quem ouve. Para ter acesso a vida é preciso entrar pela porta sugerida por Cristo.

Por que é necessário entrar pela porta estreita? Jesus explica: porque ‘larga e a porta’, e ‘espaçoso é o caminho que conduz à perdição’. Através da explicação de Jesus, percebe-se que não é necessário ao homem tomar uma decisão para entrar na porta e percorrer o caminho que conduz a perdição. Por quê? O que isto quer dizer?

A explicação de Jesus demonstra implicitamente que todos os homens quando nascem, eles entram por uma porta larga; ou seja, a porta é larga que comporta todos quantos vêem ao mundo. O nascimento é a entrada por esta porta, e por isso não é necessário uma decisão de entrar por ela.

Todos os homens entraram por uma porta e percorrem um caminho que conduz a perdição. Para ter acesso ao caminho da vida, se faz necessário tomar a decisão de entrar pela porta estreita, e seguir o caminho apertado.

A figura das duas portas e dos dois caminhos são semelhantes à figura da árvore boa e da árvore má ( Mt 12:33 ); o bom tesouro e o mal tesouro ( Mt 12:35 ); as fontes de água doce e água amarga ( Tg 3:11 -12). Estas figuras são semelhantes quanto a ideia principal e cada uma apresenta um dos aspectos da salvação em Cristo.

A ideia principal destas figuras aponta para o evento da queda de Adão. Em Adão todos os homens foram julgados e condenados. A pena que pesa sobre a humanidade é a morte. Para Deus os homens nascidos de Adão estão mortos em delitos e pecados. A queda de Adão comprometeu a natureza do homem: Deus é vida, e a queda separou o homem de Deus. O homem perdeu a essência da natureza divina, deixando-o na condição de morto para Deus.

Todos os homens nascem sem ser participantes da natureza divina. A natureza do homem é segundo a natureza de Adão, visto que, nasceram da vontade da carne, da vontade do homem e do sangue ( Jo 1:13 ). Para o homem livrar-se da condenação que ocorreu em Adão, é preciso ao homem nascer de novo. Ele precisa nascer da vontade de Deus para tornar-se um dos filhos de Deus ( Jo 1:12 ).

Com base nestas informações, verifica-se que todos nascem sob condenação, e pesa sobre eles o juízo de Deus e por isso todos que vem ao mundo ‘são os que entram por ela’, a porta larga e o caminho espaçoso ( Mt 7:13 ). Todos entram pela porta ao nascer e no caminho que conduz à perdição, e esta figura evidência a necessidade do homem decidir-se pela oferta de salvação que há em Cristo.

Para entrar pela porta, que é Cristo, é necessário um novo nascimento. Observe que o nascimento é a ‘porta’ de entrada para a perdição eterna e para a vida eterna.

Todos descendem da semente de Adão (semente corruptível), e, portanto, são árvores más. Como pesa sobre eles a condenação de Adão, resta às árvores que tiveram origem na semente corruptível serem cortadas e lançadas no fogo. Como é próprio das árvores produzirem frutos segundo a sua espécie, as árvores que descendem da semente de Adão, só produzem frutos maus. Diferente da figura da porta e do caminho, a figura da árvore demonstra que é impossível aos homens nascidos de Adão produzirem o bem ( Mt 12:34 ).

Os corações dos homens nascidos sob a condenação de Adão são maus, e por mais que se esforcem, só pode tirar do coração o mau, do seu mau tesouro. Esta figura demonstra que o problema do homem pecador encontra-se em seu coração, na sua natureza. Para livrar-se desta condição é preciso circuncidá-lo por meio da circuncisão de Cristo.

Os homens nascidos de Adão têm uma vida restrita a este mundo. Vivem para si e para o pecado. Após aceitar a Cristo, o novo homem terá uma fonte de água viva que jorra para a vida eterna, passando a viver para Deus ( 2Co 5:15 ; Rm 14:7 ).

A figura da árvore demonstra que os homens permanecem na condição herdada em Adão: serão ‘cortados’ e lançados no inferno por pesar sobre eles o juízo de Deus ( Rm 2:3 ; Mt 3:10 ). Como uma árvore produz um único tipo de fruto, os frutos das árvores que surgiram da semente corruptível de Adão são maus, ou seja, segundo a espécie da árvore. Por mais que o homem nascido de Adão procure fazer o bem, isto é impossível, visto que as suas obras não foram feitas em Deus, e não foram preparadas por Deus.

Por produzirem o mal, o homem entesoura ira para si. A condenação em Adão decorre da retidão e justiça de Deus, sem qualquer referência a ira. Já que o homem se deixou levar pela natureza corrompida, à prática de toda impiedade e injustiça, Deus trará a juízo todas as ações dos homens, e com relação a isto, não há acepção de pessoas.

As ações dos nascidos de novo serão julgadas e recompensadas no tribunal de Cristo, e as ações do velho homem serão julgadas e recompensadas no grande trono branco.

Depois desta pequena introdução estamos aptos a interpretar os versículos seguintes.

 

5 Mas, segundo a tua dureza e teu coração impenitente, entesouras ira para ti no dia da ira e da manifestação do juízo de Deus;

A ‘dureza’ refere-se a ação de resistir à verdade em injustiça, e o ‘coração impenitente’, refere-se à natureza pecaminosa herdada em Adão.

Todos os homens quando vêm ao mundo, nascem com um coração impenitente. No Antigo Testamento, mesmo após a entrega da lei, Moisés recomenda ao povo de Israel a circuncisão do coração “Circuncidai, pois, o prepúcio do vosso coração, e não mais endureçais a vossa cerviz” ( Dt 10:16 ). Observe que a circuncisão do prepúcio do coração refere-se ao coração impenitente, e o endurecimento da cerviz à dureza do homem.

No Novo Testamento é recomendado a circuncisão de Cristo, no despojar do corpo da carne. A circuncisão do A. T equivale a circuncisão do N. T., visto que, qualquer incisão no coração levará a morte. A morte em Cristo é o despojar do corpo da carne “No qual também estais circuncidados com a circuncisão não feita por mão no despojo do corpo dos pecados da carne, a circuncisão de Cristo” ( Cl 2:11 ).

A circuncisão de Cristo (N. T.), não é feita por mãos humanas, da mesma forma que a circuncisão do coração (A. T.), recomendada por Moisés;

A circuncisão de Cristo (N. T.), e a circuncisão do prepúcio do coração (A. T.), e pode ser realizado no homem e na mulher.

O homem que detém a verdade em injustiça, por manter-se insensível ao convite de salvação, simplesmente continua na empreitada de entesourar ira para si. Como compreender esta declaração de Paulo? Devemos ter em mente que:

a) Todos os homens estão condenados em Adão ( Rm 5:18 );
b) A condenação da humanidade em Adão decorre da justiça e retidão de Deus, sem qualquer referência a ira. Deus não se irou contra o homem quando da queda, antes fez justiça conforme a determinação dada a Adão ( Rm 3:23 );
c) A condenação afetou a natureza do homem, e todas as suas ações passaram a ser reprováveis diante de Deus ( Mt 12:34 );
d) Por não estarem em Deus, as ‘obras’ dos homens não são feitas em Deus, e por isso são reprováveis ( Jo 3:19 -21);
e) Todas as ações de todos os homens serão julgadas em juízo específico, e isso independe da condição de salvos ou perdidos ( Rm 2:11 );
f) Haverá o juízo do Trono Branco para os perdidos e o juízo do Tribunal de Cristo ( 2Co 5:10 e Ap 20:13 );
g) O homem que detém a verdade em injustiça continua na prática do mal, visto que as suas obras não são feitas em Deus e não foram preparadas por Deus ( Jo 3:21 e Ef 2:10 );
h) As obras más serão retribuídas por Deus com indignação e ira, e as obras feitas em Deus serão retribuídas com glória, honra e paz.

Há um dia predeterminado para a ira de Deus “Pois é vindo o grande dia da ira deles, e quem poderá subsistir?” ( Ap 6:17 ). Neste dia os homens conhecerão o juízo de Deus. O juízo de Deus foi estabelecido lá em Adão, mas os homens ignoram esta verdade. Quando do dia da ira será manifesto a eles que estão debaixo de condenação. Por serem filhos de Adão, ou filhos da desobediência, por conseguintes, também são filhos da ira ( Cl 3:6 ); “E éramos por natureza filhos da ira, como também os demais” ( Ef 2:3 ).

 

6 O qual recompensará cada um segundo as suas obras; a saber: 7 A vida eterna aos que, com perseverança em fazer bem, procuram glória, honra e incorrupção; 8 Mas a indignação e a ira aos que são contenciosos, desobedientes à verdade e obedientes à iniquidade;

O qual recompensará cada um segundo as suas obras; a saber:

a) Dará vida eterna aos que, com perseverança em fazer bem, procuram glória, honra e incorrupção;
b) Mas a indignação e a ira aos que são contenciosos, desobedientes à verdade e obedientes à iniquidade;

A vida eterna é prometida àqueles que procuram glória, honra e incorrupção, e não a quem faz boas ações, pois fazer boas ações não é fazer o bem. O homem só pode fazer o bem quando está em Cristo. Somente em Cristo o homem encontra glória, honra e incorrupção, e após encontrar estas bênçãos em Cristo, é preciso ao crente perseverar fazendo o bem. Boas ações não concederão vida eterna aos homens.

Em primeiro lugar é preciso ao homem buscar o reino de Deus e a sua justiça, que é Cristo; e como Deus há de recompensar a cada um segundo as suas obras, é de bom alvitre que se faça o bem. O bem que o cristão faz visa a recompensa futura, e não a salvação. A salvação só é possível através do evangelho de Cristo, que é poder de Deus.

Deus também recompensará as obras dos homens que detêm a verdade em injustiça. Observe que a ira e a indignação de Deus permanece sobre aqueles que são desobedientes à verdade. A indignação e a ira não decorre das más ações dos homens, antes decorre da desobediência à verdade e obediência à iniquidade. Enquanto o homem for obediente à iniquidade, jamais será filho de Deus. Permanecerá na condição de filho da ira e sujeito à ira de Deus.

O homem sem Cristo é desobediente à verdade, e acumula ira para si por ser faccioso, contencioso. As boas ações realizadas pelos homens obedientes à iniquidade não será tido por Deus como sendo boas obras. Essas ações Isaías nomeia ‘trapos de imundície’.

 

9 Tribulação e angústia sobre toda a alma do homem que faz o mal; primeiramente do judeu e também do grego; 10 Glória, porém, e honra e paz a qualquer que pratica o bem; primeiramente ao judeu e também ao grego;

Paulo demonstra que não há qualquer diferença entre judeus e gentios. Tanto os judeus quanto os gentios praticam o mal diante de Deus caso sejam desobedientes à verdade do evangelho. Lembre que uma árvore má não produz frutos bons. A natureza corrompida do homem, que é obediente à iniquidade, impede que o homem faça o bem.

Da mesma forma que o pecado escraviza judeus e gregos, também não há diferença entre judeu e grego quando se tornam escravos da justiça. Todos que aceitam a Cristo praticam o bem. Por terem adquirido um novo coração em Cristo tem um bom tesouro, e as suas ações são boas, pois são feitas estando em Deus.

Quem aceita a Cristo pode fazer o bem e o mal, mas suas ações não o levarão para o inferno, pois Deus já o recebeu por seu. Da mesma forma, os descrentes fazem o bem e o mal, mas para Deus as suas ações são más, pois eles não pertencem a Deus.

 

11 Porque, para com Deus, não há acepção de pessoas.

Se um judeu e um grego praticam o bem (devemos entender a prática do bem vinculado à crença em Cristo), não há distinção entre eles perante Deus. Ele recompensará a cada um segundo as suas obras, pois em Deus não há acepção de pessoas.

Se um judeu e um grego praticam o mal (a prática do mal decorre da obediência à iniquidade), para Deus não há acepção: receberão a recompensa devida: indignação e ira.

 

 

Introdução

Na página quatro estudamos alguns elementos de lógica, e na página cinco algumas questões doutrinárias. Agora veremos como aplicar elementos da lógica durante uma leitura bíblica para não nos afastarmos das questões doutrinárias.

Lemos em uma publicação evangélica, no tópico ‘Falsos profetas’, ao citarem Mateus dez, versículo dezesseis, o seguinte:

“É possível ao homem de falso coração fazer certas coisas boas. Pode-se até receber edificação pela sua mensagem, porque Deus honra a sua Palavra. Mas a pregação não o salvará da sentença do Juiz: ‘Apartai-vos de mim, vós que praticais a iniquidade!'” Pearlman, Myer, Mateus, o Evangelho do Grande Rei, 1. edição, Rj, Ed. CPAD, pág. 44.

Considerando que fazer ‘coisas boas’ é possível a todos os homens, mas fazer ‘o bem’, só é possível aos nascidos de novo, visto que ‘não há quem faça o bem’ sem estar ligado em Cristo Rm 3: 12. Considerando que aos homens é pertinente limparem o exterior do copo e do prato, mas que é impossível limparem o seu interior “Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas! pois que limpais o exterior do copo e do prato, mas o interior está cheio de rapina e de iniquidade” ( Mt 23:25 ), segue-se que, ao tentar explicar que “Há maldade nos melhores, e bondade nos piores” Pág 39, Myer não faz distinção entre ‘fazer coisas boas’ e ‘fazer o bem’, e acaba por afirmar que o homem de coração ‘falso’ faz ‘certas coisas boas’.

Aos falsos profetas é pertinente fazem boas ações, pois somente com ações exteriores é que eles se dão a conhecer como ovelhas, porém, o interior deles é comparado a lobos. As religiões que negam a Cristo como Senhor geralmente se esmera em praticar boas ações aos seus semelhantes, mas a mensagem que apregoam não aproxima o homem de Deus.

Fazer o bem não é uma questão de vontade, e sim de natureza. Não basta querer fazer o bem, antes é necessário obter uma nova natureza, segundo a semente incorruptível que é a palavra de Deus, para que se torne possível ao homem produzir o bem ( 1Pe 1:23 ). Somente aqueles que são nascidos de Deus fazem bem ( Jo 3:21 ). As boas obras foram preparadas por Deus para que os vivificados em Cristo possam andar nelas ( Ef 2:9 ).

Fazer boas ações está ligado a vontade do homem. Se ele quiser fará boas ações aos seus semelhantes, e isto não diz da disposição do seu coração. Agora, fazer o bem só é possível quando se está em Deus, pois é algo vinculado a natureza do novo homem e não à vontade, como é o caso de boas ações ( Jo 3:21 ).

É plenamente possível a um falso profeta fazer certas coisas boas, mas é impossível a eles fazerem o bem. Primeiramente porque a Bíblia diz que ‘não há quem faça o bem’ ( Rm 3:12 ). Um falso profeta não pode fazer de modo algum o bem, pois eles não estão em Deus. Fazer ações humanitárias ou boas ações fará com que os homens acreditem que eles são ‘ovelhas’ ( 2Tm 4:1 -4).

Observe o que Jesus disse: “Não pode a árvore boa produzir maus frutos, nem a árvore má produzir frutos bons” ( Mt 7:18 ). Se é impossível a árvore má produzir bons frutos, como é possível ao homem de coração falso (coração falso remete a falso profeta), produzir ‘certas coisas boas’ quando Myer faz a citação acima? A análise de Pearlman não está em consonância com o que Jesus ensinou ( Mt 7:18 e Mt 12:33 -35). Se ele quis dizer ‘certas coisas boas’ não utilizou a citação de Mt 7: 18 em seu contexto correto. Da mesma forma, se ele utilizou ‘certas coisas boas’ em lugar de ‘fazer o bem’, contrariou o que Jesus disse: “…nem a árvore má produzir bons frutos” ( Mt 7:18 ).

A segunda declaração que complementa a primeira é muito mais grave: É possível receber edificação por meio da mensagem de um falso profeta?

A premissa que foi utilizada para dar sustentação à argumentação é verdadeira, pois ‘Deus honra a sua palavra’, e condiz com a ideia bíblica: “E disse-me o SENHOR: Viste bem; porque eu velo sobre a minha palavra para cumpri-la” ( Jr 1:12 ), mas, dizer que é possível receber edificação através das palavras de um falso profeta corresponde a uma inverdade.

Há um erro na argumentação do Sr. Myer, visto que:

a) Se Deus vela sobre a palavra de um ‘falso profeta’, este falso profeta já não é falso, e passou à condição de profeta;
b) O cuidado que a Bíblia demonstra que devemos ter com os falsos profetas é com aquilo que dizem (doutrina) “E TAMBÉM houve entre o povo falsos profetas, como entre vós haverá também falsos doutores, que introduzirão encobertamente heresias de perdição, e negarão o Senhor que os resgatou, trazendo sobre si mesmos repentina perdição” ( 2Pe 2:1 );
c) Aspectos humanos como caráter, comportamento e moral não são fatores que determinam se alguém é ou não um falso profeta.

Não há como receber edificação por meio de uma mensagem de um falso profeta. Primeiro, porque a mensagem de um falso profeta não provém de Deus; segundo, a tal mensagem não é a semente incorruptível; o fruto que um falso profeta produz é segundo a sua natureza: é mal ( Mt 12:34 -35).

Elementos humanos como comportamento, moral, caráter, sacrifícios, orações, são utilizados pelos falsos profetas como vestimentas para se disfarçarem em ovelhas. Tais elementos são manipuláveis pelos homens, pois diz de aspectos externos, como o exterior do copo e dos sepulcros. O que não podem manipular é o interior, onde somente Deus tem acesso e pode mudar.

Paulo ao escrever a Timóteo alerta dizendo: “Mas o Espírito expressamente diz que nos últimos tempos alguns apostatarão da fé, dando ouvidos a espíritos enganadores, e a doutrinas de demônios, pela hipocrisia de homens que falam mentiras e tem cauterizada a própria consciência, que proíbem o casamento, e ordenam a abstinência de alimentos que Deus criou para os fiéis, e para os que conhecem a verdade, a fim de usarem deles com ações de graças…” ( 1Tm 4:1 -3).

Deus não honra a palavra de um falso profeta, pois a palavra de um falso profeta não é a palavra de Deus. A palavra é clara: Quem é que pratica a iniquidade? Os falsos profetas, que se apresentam disfarçados de ovelhas, porém são lobos devoradores.

Somente é possível identificar os falsos profetas pelos seus frutos. Quais são os frutos de um falso profeta? O que um falso profeta produz? Mensagens que não têm origem em Deus! Este é o fruto dos falsos profetas: mensagens que não são conforme a verdade do evangelho!

Da mesma forma, o fruto de alguém que é profeta de Deus, é o fruto dos lábios, que professam que Cristo é o Filho de Deus ( Hb 13:15 ) compare ( 1Jo 4:1 -3).

A mensagem de Cristo visa transformar a natureza do homem, e a conduta é transformada gradativamente por intermédio do Espírito de Deus. A mensagem do evangelho não tem a finalidade de transformar concepção de mundo, caráter, conduta, etc. Se assim fosse, Paulo não pediria aos cristãos que vivessem de modo digno do evangelho de Cristo ( Ef 4:1 ).

Myer Pearlman também registrou um argumento de Agostinho:

“O que faz com que o caminho seja estreito? perguntou Agostinho. Ele mesmo responde: ‘O caminho não é estreito por si mesmo, mas nós o fazemos assim, mediante o insuflar do nosso orgulho…” Pág. 42 (idem e grifo nosso).

A premissa “estreita é a porta, e apertado o caminho’ foi anunciada por Jesus. Esta premissa é verdadeira! Conforme Pearlman, Agostinho declara que ‘o caminho não é estreito’, o que torna a declaração de Agostinho uma premissa falsa. A premissa de Agostinho contraria completamente a ideia anunciada por Cristo.

Cristo disse ser o caminho e que o caminho é estreito. Quando se afirma que o caminho não é estreito por si mesmo, estamos negando que a declaração de Jesus seja verdade e que a sua natureza não é conforme o que foi dito por si mesmo.

A Bíblia demonstra que o caminho é apertado, mas Agostinho argumenta que o caminho é ‘feito’ estreito. A Bíblia demonstra que Jesus é o caminho, mas Agostinho declara que ‘nós o fazemos assim’. Observe que as alegações de Agostinho contrariam completamente as premissas bíblicas, pois o caminho é estreito, e não é o homem que o faz desta maneira. Cristo é o caminho, e não é pertinente aos homens determinar a largura do caminho.

Myer declara que Jesus disse que devemos optar por um dos caminhos “Cristo, no entanto, ensinou haver dois caminhos, que levam a direções opostas, e por um dos quais devemos optar” Pág. 40 (idem), mas o que diz a Bíblia? “Entrai pela porta estreita. Pois larga é a porta, e espaçoso o caminho que conduz à perdição, e muitos são os que entram por ela. Mas estreita é a porta, e apertado o caminho que conduz para a vida, e são poucos os que a encontram” ( Mt 7:13 -14).

Há alguma discrepância entre o que diz Myer e a Bíblia? Há sim!

Jesus ordenou aos seus ouvintes que entrassem pela porta estreita, ou seja, é uma premissa que não apresenta opções “Entrai pela porta estreita…”. Jesus não apresentou opções aos seus ouvintes como se eles estivessem em um ‘limbo’. Cristo ensinou haver dois caminhos, mas não apresentou duas opções.

Cristo se apresenta como única opção à condição em que os seus ouvintes estavam. Cristo é a única opção aos perdidos! Não há, portanto, a ideia de duas opções aos homens perdidos.

Estes erros que apontamos decorre da seguinte análise equivocada de Myer Pearlman: “…mas um exame mais profundo do caráter humano mostrará que a classificação de Cristo é verdadeira” Pág. 38 (idem). A mensagem de Cristo é a verdade, e independe de comprovação pautada em questões humanas. Não é uma análise do comportamento humano que fará compreendermos as declarações de Cristo.

Não é a filosofia, ou a sociologia que nos fará dimensionar as verdades do evangelho. Só é possível entendermos as declarações de Cristo “comparando as coisas espirituais com as espirituais” ( 1Co 2:13 -14).

 

12 Porque todos os que sem lei pecaram, sem lei também perecerão; e todos os que sob a lei pecaram, pela lei serão julgados.

Paulo demonstra que não há acepção de pessoas em Deus, visto que não há diferenças entre judeus e gregos diante da retribuição divina: cada um será recompensado segundo as suas obras ( Rm 2:6 ).

Os gentios foram concebidos em pecado, e por isso, todos pecaram. Eles pecaram, não por falta de uma lei, mas por causa da condenação em Adão. Observe que o pecado aqui não decorre da transgressão da lei, visto que não havia lei para os gentios. Porém, mesmo não havendo lei para os gentios, eles pecaram. Mesmo sem lei, eles estão condenados.

Não é alívio para o judeu ser levado a julgamento. Todos os que pecaram, mesmo tendo uma lei, serão julgados pela lei que receberam. Da mesma forma que os gentios, os judeus, por terem pecado, estão sob condenação, visto que a alma que pecar, esta morrerá. Qualquer devedor que for a juízo perecerá, não importando quem seja: judeu ou grego.

 

13 Porque os que ouvem a lei não são justos diante de Deus, mas os que praticam a lei hão de ser justificados.

Os pretensos seguidores da lei eram somente ouvintes. Os ouvintes da lei (os judeus) não eram justos diante de Deus, visto que não a praticavam. A lei é bem clara: “Portanto os meus estatutos e os meus juízos guardareis, pois o homem que os cumprir por eles viverá” ( Lv 18:5 ; Rm 10:5 ).

Há como ser justificado pela lei? “Porque qualquer que guardar toda a lei, e tropeçar em um só ponto, tornou-se culpado de todos” ( Tg 2:10 ).

 

14 Porque, quando os gentios, que não têm lei, fazem naturalmente as coisas que são da lei, não tendo eles lei, para si mesmos são lei; 15 Os quais mostram a obra da lei escrita em seus corações, testificando juntamente a sua consciência, e os seus pensamentos, quer acusando-os, quer defendendo-os;

Os judeus consideravam serem melhores que os gentios por terem uma lei. Paulo apresenta argumentos que desmistificam esta ideia. Os gentios não tinha um código específico, porém, faziam ‘coisas’ da lei Mosaica, mesmo não tendo a lei. Paulo demonstra que Deus trará a juízo as ações dos gentios, visto que eles tem uma lei interna, em seus corações. Aliado a lei interna, há a consciência e os seus pensamentos, quer acusando quer defendendo as suas ações.

Perceba que nem todos os homens são depravados e que muitos fazem naturalmente o que preceitua a lei. Observe que os homens constituem leis para as suas ações.

 

16 No dia em que Deus há de julgar os segredos dos homens, por Jesus Cristo, segundo o meu evangelho.

Deus recompensará a cada um segundo as suas ações no dia que Ele se assentar para julgar os segredos de todos os homens.

Não podemos confundir as vicissitudes da vida com o juízo de Deus. Muitas pessoas consideram que Deus pune os homens no dia-a-dia, porém, esquecem que o que o homem colhe o que plantou, e esta lei natural não diz do juízo de Deus.

 

17 Eis que tu que tens por sobrenome judeu, e repousas na lei, e te glorias em Deus; 18 E sabes a sua vontade e aprovas as coisas excelentes, sendo instruído por lei; 19 E confias que és guia dos cegos, luz dos que estão em trevas, 20 Instrutor dos néscios, mestre de crianças, que tens a forma da ciência e da verdade na lei;

Após demonstrar que:

a) Deus não faz acepção de pessoas ( Rm 2:11 );
b) que Deus retribuirá a cada um (todos os homens) segundo as suas obras, tanto judeus quanto gregos ( Rm 2:6 -10);
c) que a lei não estabelece diferencias entre gentios e judeus diante de Deus ( Rm 2:12 ), visto que tanto judeus quanto gentios foram julgados em Adão e nasceram sob a égide do pecado, e;
d) que não há distinção entre judeus e gentios, visto que todos os homens serão julgados quanto as obras ( Rm 2:6 ).

Paulo passa a questionar os homens que se escudavam no sobrenome ‘judeu’. Observe que, apesar do sobrenome ‘judeu’, o primeiro nome ainda continua sendo ‘homem’. Quando Paulo faz referência aos Judeus, procura não fazer distinção, e continua a tratá-los como os outros homens, o que demonstra que não há distinção entre os homens, a não ser pelo sobrenome que adotaram.

Os quesitos abaixo não tornam os judeus melhores que os outros homens:

  • adotar o sobrenome judeu;
  • descansar na lei de Moisés nas questões relativas à salvação;
  • ter um sentimento de orgulho por terem sido escolhidos como povo de Deus;
  • saber a vontade de Deus, e não conhece- lá;
  • pensar que aprova o que é melhor;
  • ser uma pessoa instruída da lei;
  • confiar que está em melhor condição que os outros homens por reputar ser guia, instrutor, mestre, etc;
  • adotar a lei como ciência e verdade.

 

21 Tu, pois, que ensinas a outro, não te ensinas a ti mesmo? Tu, que pregas que não se deve furtar, furtas? 22 Tu, que dizes que não se deve adulterar, adulteras? Tu, que abominas os ídolos, cometes sacrilégio? 23 Tu, que te glorias na lei, desonras a Deus pela transgressão da lei?

Paulo coloca em xeque o comportamento dos judeus. Muitos dos judeus ensinavam, mas pareciam não ter aprendido a matéria que ensinavam.

Eles pregavam que não se devia furtar, e acabavam furtando. Diziam que não podia adulterar, e adulteravam. Abominar os ídolos era a bandeira dos judeus, no entanto, cometiam sacrilégios. Os homens que se orgulhavam de ter recebido a lei, desonravam a Deus quando transgrediam a lei.

 

24 Porque, como está escrito, o nome de Deus é blasfemado entre os gentios por causa de vós.

Paulo apresenta a base para as suas argumentações: as Escrituras! “Agora, que farei eu aqui, diz o Senhor, visto ter sido o meu povo levado sem preço? Os seus tiranos sobre ele dão uivos, diz o Senhor; e o meu nome é blasfemado incessantemente todo dia” ( Is 52:5 ). Observe que Paulo não cita o versículo ‘ipses literes’, porém, ele fez uma citação aplicada: por causa dos judeus, o nome de Deus estava sendo blasfemado entre os outros povos.

Em toda citação que fizermos da Bíblia, devemos nos portar da mesma maneira que Paulo: preservar a ideia principal. Como Deus disse que o seu nome era blasfemado entre os gentios por causa dos judeus, qualquer citação que contrarie esta ideia deve ser tida por anátema.

Qual seria o argumento dos judeus para rebater a própria Escritura? Isaías demonstra que o próprio Deus disse que o nome d’Ele era blasfemado entre os gentios por causa dos judeus.

 

25 Porque a circuncisão é, na verdade, proveitosa, se tu guardares a lei; mas, se tu és transgressor da lei, a tua circuncisão se torna em incircuncisão.

A circuncisão foi um ritual instituído por Deus após ter anunciado a Abraão uma aliança. Deus apareceu a Abraão e lhe propôs uma aliança, onde Deus abençoaria sobre modo a Abraão e a sua descendência. Por Deus ter prometido abençoar Abraão e a sua descendência, os judeus acreditavam que eram salvos por serem descendentes de Abraão e por cumprirem o ritual da circuncisão ( Gn 17:10 -11).

Paulo contesta a crença dos judeus, demonstrando que a circuncisão só é proveitosa após o homem cumprir o determinado pela lei. A condição estabelecida para a validade da circuncisão é o cumprimento cabal da lei.

Após demonstrar a condição para a circuncisão ser válida diante de Deus, Paulo se reporta aos transgressores da lei. Aos transgressores da lei, a circuncisão não representa nada.

 

26 Se, pois, a incircuncisão guardar os preceitos da lei, porventura a incircuncisão não será reputada como circuncisão?

Paulo torna a lembrar que os gentios, quando cumprem com os preceitos da lei, são reputados como prosélitos (pessoas convertidas ao judaísmo) pelos próprios judeus, e por isso, circuncidadas. Se é válido reputar um prosélito que cumpre com os preceitos da lei um circunciso, que se dirá de um judeu que não cumpre a lei? Será tido por incircunciso, embora tenha feito a circuncisão na carne.

 

27 E a incircuncisão que por natureza o é, se cumpre a lei, não te julgará porventura a ti, que pela letra e circuncisão és transgressor da lei?

Paulo demonstra que ser judeu ou gentil é uma questão da natureza. A incircuncisão (gentios) é determinada pela natureza, da mesma forma que a circuncisão (judeu). Ser judeu, da forma que consideravam, não é uma condição proveniente de Deus, antes é uma condição determinada pela natureza.

Ser judeu ou gentil é uma condição determinada pelo nascimento e decorre de vínculos sanguíneos, o que demonstra não ter relação com a vontade e Deus.

Paulo destaca que, se os incircuncisos cumprem os quesitos da lei, eles estão em condição de julgar os circuncidados. Observe que os circuncidados de Israel tinham a lei de Moisés e a circuncisão, porém, mesmo com estes dois quesitos, eles eram transgressores da lei.

Os judeus eram transgressores da lei, visto que, ao tropeçarem em um único quesito da lei, tornavam-se culpados de toda a lei ( Tg 2:10 -11).

Já os incircuncisos não haviam recebido a circuncisão e nem mesmo uma lei, e o fato de cumprirem quesitos da lei, demonstra que a prática da lei compete a todos os homens, não importando quem quer que eles sejam. Este argumento demonstra que não há diferenças entre judeus e gentios perante Deus, pois todos são inescusáveis.

Enquanto os judeus reputavam que eram salvos por cumprirem com o rito da circuncisão e por terem recebido a lei, Paulo demonstra que a verdadeira condição de ‘judeu’ e a verdadeira ‘circuncisão’ não é possível determinarmos por questões externas como nascimento e regras exteriores.

 

28 Porque não é judeu o que o é exteriormente, nem é circuncisão a que o é exteriormente na carne. 29 Mas é judeu o que o é no interior, e circuncisão a que é do coração, no espírito, não na letra; cujo louvor não provém dos homens, mas de Deus.

Paulo apresenta os motivos da sua argumentação anterior. Devemos considerar que, neste versículo, Paulo está se referindo ao verdadeiro judeu, ou seja, ao homem que realmente é salvo por Deus.

Ele demonstra que tudo quanto os judeus consideravam ter recebido de Deus por serem descendentes de Abraão, somente se constituíam em aspectos externos, o que não condizia com a realidade interior.

Para o apóstolo, o verdadeiro judeu, ou seja, o homem que é salvo por Deus, é aquele que recebeu de Deus a circuncisão no coração. Enquanto os judeus se apegavam às questões externas da lei, Paulo procura demonstrar que a verdadeira circuncisão se dá no coração do homem.

Enquanto os judeus consideravam aspectos exteriores da lei e a circuncisão da carne como sendo os elementos essências a quem desejasse ser salvo, Paulo demonstra que o verdadeiro judeu precisa da circuncisão do coração. A mensagem do evangelho de Cristo apregoado por Paulo não difere em nada do que era apregoado pelos profetas: “Circuncidai-vos ao SENHOR, e tirai os prepúcios do vosso coração, ó homens de Judá e habitantes de Jerusalém, para que o meu furor não venha a sair como fogo, e arda de modo que não haja quem o apague, por causa da malícia das vossas obras” ( Jr 4:4 ).

Moisés apregoava a circuncisão do coração mesmo após ter entregue a lei ao povo de Israel: “Circuncidai, pois, o prepúcio do vosso coração, e não mais endureçais a vossa cerviz” ( Dt 10:16 ).

A circuncisão do coração remete ao despojar da velha natureza (velho homem), e somente através de Cristo é possível adquiri-la “Nele também fostes circuncidados com a circuncisão não feita por mãos no despojar do corpo da carne, a saber, a circuncisão de Cristo” ( Cl 2:11 ).

A circuncisão de Cristo se dá no coração e não é feita por mão humanas. A circuncisão dos homens é exterior, no corpo, segundo os quesitos da lei, mas não é proveniente de Deus e nem recebe d’Ele louvor. O homem que é judeu interiormente, é aquele que recebeu a circuncisão no coração, no espírito, desvinculado dos elementos da lei (letra), que são exteriores.

Por intermédio de Jeremias Deus censura as obras do povo, mas por qual motivo? Por que as obras dos judeus, um povo religioso e cheio de regras morais e éticas é reputado ‘maliciosas’ por Deus? Eles não praticavam boas ações?

Os judeus sempre praticaram boas ações aos seus irmãos no intuito de conquistar a salvação, e em decorrência desta particularidade elas são ‘maliciosas’, visto que a salvação só é possível através da circuncisão do coração, que é uma ação exclusiva de Deus.

Claudio Crispim

É articulista do Portal Estudo Bíblico (https://estudobiblico.org), com mais de 360 artigos publicados e distribuídos gratuitamente na web. Nasceu em Mato Grosso do Sul, Nova Andradina, Brasil, em 1973. Aos 2 anos de idade sua família mudou-se para São Paulo, onde vive até hoje. O pai, ‘in memória’, exerceu o oficio de motorista coletivo e, a mãe, é comerciante, sendo ambos evangélicos. Cursou o Bacharelado em Ciências Policiais de Segurança e Ordem Pública na Academia de Policia Militar do Barro Branco, se formando em 2003, e, atualmente, exerce é Capitão da Policia Militar do Estado de São Paulo. Casado com a Sra. Jussara, e pai de dois filhos: Larissa e Vinícius.

One thought on “Romanos 2 – Os que ouvem a lei não são justos diante de Deus

  • Muito bom! Dá uma base para alguns que ainda guardam a Lei, mesmo com Jesus Cristo já ter vindo. Não que Ele veio acabar com a Lei, mas aperfeiçoara nEle. Só por Cristo Jesus seremos salvos.

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